domingo, 27 de julho de 2025

O TEATRO DO IMPERIALISMO NACIONALISTA


É surpreendente as artimanhas que os capitalistas armam para atingirem os seus objetivos. Estamos entrando em uma fase do capitalismo, na qual, o capital, aparentemente “volta para casa”, para proteger-se e, por isso, poderemos vir a chamar esta fase do “Teatro do imperialismo nacionalista”. Parece ser contraditório, pois, a expansão é uma das principais características da exploração cosmopolita das burguesias sediadas nos países do Norte Global.

Em um livro de Florestan Fernandes, Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina[1], encontramos que: “A hipótese que se delineia não é a de uma gradual autocorreção do regime de classes (tal como ele está estruturado). Mas, a de uma persistência e de um agravamento contínuos da presente ordenação em classes sociais, cujas “debilidades” e “deficiências estrutural-funcionais” foram institucionalizadas e são na realidade funcionais. Se elas desaparecessem (ou fossem corrigidas), com elas desapareceria essa modalidade duplamente rapinante de capitalismo”.

O desmantelamento da economia dos Estados Unidos, devido ao passo em falso dado pelas forças econômicas do passado de, não somente irem explorar as matérias primas e força-de-trabalho em outros países, mas de levarem para fora as próprias empresas e toda a tecnologia industrial. Confiando que os países em desenvolvimento seriam eternamente dependentes, perceberam que, em meio à selvageria da dominação podem surgir reações, do jeito que acontece com um animal feroz; depois que passa o período de convalescença ele ataca os seus próprios tratadores. E nisso, tem razão Florestan ao dizer que as nossas deficiências “estrutural-funcional” se estruturam como realidades funcionais; o seja,  desordem veio a ser a ordem dependente.

O “tarifaço” tornou-se a marca fundamental do atual governo dos Estados Unidos. Aparentemente é uma loucura, e não deixa de ser, porque, se para cada ação há uma reação, provocando o mundo todo, logo alguém acertará a medida do troco que deverá ser dado para contê-lo. Mas, enquanto isso não vem de imediato, muitas revelações vão aparecendo, como um trem passando os trilhos que cortam um pântano, todos aproveitam para embarcarem nele.

Na verdade, existem diversas forças envolvidas em busca de aproveitarem as investidas para tirar vantagens. Na origem, o “tarifaço” contra o Brasil, mirou na condenação de Bolsonaro, que é visto pelos Estados Unidos, como já foi dito, o “interventor colonial”. Ou seja, para que a recuperação econômica aconteça lá na sede da Casa Branca, é preciso que haja colaboradores, “despatriotiotizado” aqui, para fortalecerem de patriotismo lá. Assim, “a família real” se divide; se no passado o pai voltou para Portugal, agora é o filho que vai na frente para os Estados Unidos.

Diante disso, a cada semana vemos aumentarem as reinvindicações que visam atender os produtores de 15% das exportações brasileiras. Começaram a exigir, além da anistia ao interventor, o aumento das taxas de exportação dos produtos brasileiros; depois entrou o PIX, por estar afetando os lucros das empresas que controlam os cartões de crédito, somado aos interesses das big techs, principalmente pela perda de espaço com a China, mas, acima de tudo, depois da rasteira que Trump levou do Zelenski, é o interesse pelos minérios especiais brasileiros (nióbio, lítio, cobre e terras raras). No entanto, a ponta da lança a ser enterrado no coração da soberania brasileira, está escrito Brics. Os Estados Unidos temem perder o controle sobre a América Latina, principalmente para a China e, o Brasil é o polo articulador que, como velho “gigante adormecido”, ameaça acordar e estruturar outras relações com os países do Sul Global.  

É importante perceber que a doença do nacionalismo é contagiosa. De um momento para outro começamos a expressar o “orgulho de ser brasileiros”. Por isso o governo brasileiro, obriga-se a passar da avançar reconstrução para a fase da defesa, mas falta ainda a coragem de partir para o ataque pois, pressionado pelas forças armadas para apressar o acordo, pois do contrário elas deverão mostrar se têm ou não capacidade de defenderem o país do inimigo externo, não sabemos bem o que virá.   

 Voltemos um instante para ao pensamento de Florestan Fernandes, pois, aparentemente, com o nacionalismo, desaparece o regime das classes sociais, pois, como o partido  político do presidente da República tem a marca dos trabalhadores, ao empenhar-se para garantir as exportações dos produtos do agronegócio, antes afirmados pelos subsídios, agora tomados politicamente como uma moeda de resistência e, então, “este orgulho” incorre em dois perigos: um, de afirmar definitivamente a matriz produtiva destruidora da natureza, que manterá o Brasil na condição de país dependente, produzindo e exportando produtos primários; o segundo, de novamente não investir na indústria brasileira e continuar refém da tecnologia estrangeira. Um exemplo importante, dos 2,5 milhões de veículos produzidos por ano no Brasil, nenhum deles pertence a uma fábrica nacional, simplesmente porque ela não existe.

O momento é muito crítico. O poder no mundo está apresentando um novo desenho na colocação das forças. Apesar de tudo, temos uma vantagem que, os Estados Unidos assumiram a posição de serem declaradamente inimigos da humanidade; isso poderia, se não cairmos no infantilismo do nacionalismo, de unificarmos os países do mundo e lutarmos contra o poder sanguinário daquele país. No entanto, todos sabemos que o espírito vingativo do imperialismo não é pequeno e, na vontade desesperada de ter uma coisa, podemos esperar de tudo; tanto que um avião desgovernado caia sobre o prédio do Supremo Tribunal Federal, como ocorreu com os mísseis jogados sobre a usina de enriquecimento de urânio no Irã, quanto de um dia para outro, vermos surgir uma base militar, Norte americana, instalando-se sobre as principais jazidas de minérios e ninguém se moverá para dizer não.

Os preparativos para a entrega total do Brasil, em detrimento do governo, vêm sendo feitos pelo Congresso Nacional que, primeiro, apesar de estar ainda em discussão no Supremo Tribunal,  aprovou o “Marco temporal” para garantir o avanço e exploração das terras dos povos indígenas, repletas de minérios, cobiçados pelo  grande capital e, mais recentemente o reforço veio com a aprovação de normas que flexibilizam os cuidados com a preservação ambiental; com isso, libera para que a exploração mineral seja cada vez mais livre nas principais reservas do país.

E, de nossa parte? Começam a surgir reações de protestos e de rejeição aos Estados Unidos, no entanto, a falta de organização partidária, a responsabilidade de mobilização recai sobre o presidente da República que, se por um lado demonstra vontade em resistir, por outro lado, pressionado pelo agronegócio e as forças armadas, se propõe a negociar ao invés de buscar outra saída, afirmando a soberania nacional tão violentada. Nessas condições, um indivíduo sem força sempre irá optar pelo “mal menor”.

O poder no mundo está mudando, resta a nós mudarmos a nossa posição. Se o nacionalismo do império é uma peça de teatro que se encerrará com uma dança sobre as nossas riquezas minerais, o nosso enfrentamento deve ser real, em busca da libertação nacional, do domínio externo e da dominação de classe burguesa interna. Por isso, não devemos aceitar trocar a nossa soberania pela possibilidade de vendermos algumas milhares de toneladas de carne gorda. A nossa saída está na união da luta para a emancipação política da humanidade do imperialismo Norte americano, e não na defesa mesquinha de alguns exportadores de produtos agrícolas.

                                                                                   Ademar Bogo

 

 



[1] FERNANDES, Florestan. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina. 4. ed. São Paulo: Editora Global, 2009. p. 47.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário