domingo, 12 de dezembro de 2021

OTIMISMO E PESSIMISMO

            O filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), em sua “Teodicéia”, preocupou-se em justificar, o por que se Deus é bom, existir o mal no mundo? Para ele havia três tipos de males: metafísico, físico e moral; todos eles causadores de desarmonia. O seu otimismo com a criação do mundo perfeito, por intermédio de um ser perfeito que, por ser o melhor, somente podia criar o melhor e, seja por sua natureza, seja pela sua bondade, Deus não poderia agir de outro modo. O pessimismo, no entanto, estava no mal. Este era visto como “acidente”, surgido e desenvolvido no percurso da vida humana. Se quisermos uma conclusão primeira dessa elaboração de Leibniz, é que, se Deus é um ser perfeito o homem é um ser “acidentado”.

            No entanto, depois de motivadas as tipificações do mal, obrigou-se o filósofo a explicá-los. O mal metafísico, descreveu ele, estando na própria origem humana, constituída de sua necessária finitude, afinal, algo a menos devia possuir da perfeição de seu criador, porém, esta imperfeição tornou-se a condição para o surgimento de todos os males. Podemos acrescentar nessa caracterização específica, o mal das ideias, pensamentos, consciência ou, como diziam os filósofos mais antigos, “do espírito”.

            Decorrente do mal metafísico, justificador da imperfeição espiritual do ser humano, há o “mal físico”, cujos sintomas estão em todas as dores que, se por um lado revelam as fraquezas humanas, por outro lado poderia ser visto como uma cobrança e também como punição pela má direção dada à organização social. E, por fim, o “mal moral” voltado prioritariamente para a imperfeição do comportamento, no que diz respeito aos aspectos afetivos e passionais, formuladores das ações propulsoras da perda da liberdade.

            As proposições de Leibniz, mais do que segui-las, nos fazem pensar sobre os freqüentes embates reais e imaginários, do otimismo com o pessimismo da vida cotidiana. Ou seja, em certos aspectos nos animamos e agarramos as oportunidades; já, em outros, sentimos um mal-estar e, pelas tendências apontadas, ficamos desapontados ou no mínimo desesperançosos.

            Há sem dúvida os males metafísicos fortalecidos nas ideias negacionistas sem qualquer materialidade comprovável e que, nos últimos tempos, reuniram em uma mesma elaboração, tudo o que ruim foi pensado no passado. Dentre as ruindades mentais, estão o nazismo, o fascismo e o integralismo, como expressões das concepções da civilização destrutiva.

            Por outro lado, não se pode fechar os olhos para o agravamento do males “físicos”. A proliferação das doenças, epidemias e pandemias, ditam, praticamente, o ritmo do desenvolvimento econômico, do comportamento político e das relações sociais. São dores que atingem todas as espécies e males irreparáveis. A fome atinge os animais selvagens e os homens que parecem sobrar sobre a terra e, a própria violência vigora com tanta regularidade que, as estatísticas podem, com certeza, fazer as suas previsões antecipadas.

            Combina-se com os dois males já tipificados, o “mal moral”. O comportamento humano moldado pelos avanços tecnológicos transformou cada indivíduo numa máquina de eliminação de produtos. O desejo em consumir, dita como cada um deve se posicionar para devorar a sua “próxima vítima”. As relações se dão cada vez mais com os objetos e cada vez menos entre os seres humanos. Aliás, a alienação acelera a coisificação e tudo se move com esse entendimento, de que a realidade cotidiana constitui-se de coisas fabricadas, carregadas, trocadas e destruídas por coisas vistas como sendo inteligentes.

            E diante do caos, surgem os “arautos”, anunciadores das perspectivas de sucesso. O progresso econômico é a base de todas as anunciações e, ele virá pela mágica que o Estado capitalista operará logo após a ocorrência do batismo nas águas do processo eleitoral. Mais de uma dezena de candidatos à presidência da República já estão postos, um ano antes do pleito. Apresentam-se como “coisas da política” para gerirem a “coisa pública”. Mas a “coisa pública” é a realidade social tomada pelos males metafísicos, físicos e morais, alimentados por esta potencial indústria de fabricar desigualdades: o sistema capitalista   

Sendo assim, os “inventores do mal”, não negam existir as imperfeições, classificam-nas em: mal maior e mal menor. Com esses dois parâmetros jogam com as inversões. Hoje por exemplo, o mal maior não é o capitalismo, mas um “polipata” instalado no governo. Tirando-o tudo voltará ao normal? Mas para quem? Por essa ilusão e confusão, temporária ou definitivamente desaparecem os princípios, a coerência, as contradições de classe, as forças armadas forjadoras de golpes, o imperialismo e tudo o mais.

            O mal, quando personalizado ganha uma simbologia que confunde a essência com a aparência e leva à alienação. Por mais evidente que pareça o mal não se origina no indivíduo e, por isso, não basta retirar o incômodo, como faziam as máfias no passado ou fazem hoje as milícias e narcotraficantes, para abrirem espaços para o crime. O mal se origina nas mediações injustas criadas na sociedade. Logo, o mal tem origem coletiva. Somente com a eliminando das estruturas injustas, coletivizadoras o mal, será possível superar as perversidades humanas.

            É bom sermos otimistas, mas lutar sempre com consciência de que a transformação social passa pela implosão das estruturas abrigadoras dos causadores de todos os males.

Ademar  Bogo