O filósofo Walter
Benjamin ao escrever sobre A obra de arte na era da sua reprodutibilidade
técnica, encontrou um jeito de destacar o tema da “Destruição da aura”, e
fez o seguinte destaque: “No interior de grandes períodos históricos, a forma
de percepção das coletividades humanas se transforma ao mesmo que seu modo de
existência. O modo pelo qual se organiza a percepção humana, o meio em que ela
se dá, não é apenas condicionado naturalmente, mas também historicamente.”[1] Ou seja, há períodos
históricos em que as percepções se equiparam ao modo de se comportar e existir
das populações. Para ilustrar melhor, na sequência, além de definir o que é a “aura”,
sendo ela uma figura espacial e temporal que absorvemos ao tentar alcançá-la
como se fosse algo distante, posta no topo do horizonte, mas que, quanto mais
ela se aproxima, mais perde o vigor, até que vem a perder o encanto.
É um pouco cedo para afirmarmos se a aura do mito
Bolsonaro, já está próximo do entendimento da decepção e se extraordinário já
quase se esvaiu ou ainda não. Mas, um mito que pede clemência, anistia e foge
da sustentação da própria responsabilidade de assumir que queria continuar
sendo o “imbrochável”; desafiador do Coronavírus pela imunidade sem vacina; provocador
dos juízes do Supremo Tribunal, achincalhando-os em praça pública com palavrões
que ninguém ousa expressar contra um juiz e, de exibir-se em motociatas como um
jovem contestador do totalitarismo cultural, em busca de escudar o vento com a
própria face etc., teria ainda alguma luz a oferecer?
A última tentativa de sobrevivência do mito foi colocar a
sua aura na cabeça do presidente dos Estados Unidos. Aquele, como símbolo do
anjo vingador, ofereceu, de imediato, contra a nossa economia, uma tarifa impraticável
de 50% sobre os produtos exportados para o reino da morte, se não fosse
retirada a tornozeleira da canela
esquerda do famigerado. Depois atacou o próprio ministro com a Lei Magnitsyky,
impondo-lhe a proibição de entrar naquele país especializado em deportar
imigrantes. Pouco se perde em não poder ir a um lugar governado por uma besta defensora
da a matança de palestinos em Gaza, como se lá fosse uma antiga arena, na qual
os leões devoravam os cristãos, para divertirem da comitiva do imperador.
Os “bolsonaros” já foram associados com bananas pequenas e,
agora podres. No entanto, há sempre que ter cuidado, porque, simbolicamente quando
alguém deseja derrubar outro alguém, a armadilha é feita com cascas dessa fruta
escorregadia. Na verdade, a intromissão Trumpista nos assuntos judiciais
brasileiros não passa de um blefe enjambrado pelas próprias bananas. Ou
seja, não seriam elas capazes de fazerem uma potência como ainda é o imperialismo,
gastar as suas energias para livrar da cadeia um reles serviçal,
atrapalhando o fluxo centenário de relações comerciais entre os dois países. Eles,
aproveitando-se do momento conseguiram colocar esse entulho no meio da
artilharia trumpista. Para quem não conseguiu entrar no passado na cerimônia de
posse daquele presidente, é sem dúvida uma grande conquista: colocar um punhado
de fezes no meio do chumbo e da pólvora dos canhões.
O certo é que, se o mês de setembro próximo, quando o
mito for levado a julgamento, ou mesmo que venha a ser solto, as implicações tarifárias
não serão revogadas. O problema
brasileiro atende por nome de Brics. A associação do Brasil com a Rússia, a Índia
e a China, despertaram a fúria dos capitalistas de diversas corporações dos Estados
Unidos. Essa reunião dos países, além de representar 28,9% da economia mundial,
contra os 25% dos Estados Unidos, abriga 48,9% da população do mundo, que irá
utilizar tecnologia independente das Big Techs Norte americanas, consumir produtos
diferenciados, partilhar investimentos econômicos, financiados por um Banco
próprio e, negociar com outra moeda que não é o dólar. Para além disso, ainda
há as reservas minerais e de petróleo que farão toda a diferença no âmbito das
disputas mundiais do futuro.
A tentativa de Trump de se colocar como mediador no
acordo de Paz entre a Rússia e a Ucrânia é para assegurar algum direito de exploração
dos minérios ucranianos, antes que tudo fique sob o domínio russo. Logo, não há
bondade nenhuma nessa negociação. Há medo. É uma tentativa do imperialismo
segurar-se no próprio cós da cintura das próprias calças para não cair.
Por todos os elementos postos em jogo, devemos acreditar
que as associações das auras bolsonaristas e trumpistas, aproximam-se como dois
indivíduos afogando-se indo em direção um ao outro para o último abraço. As
circunstâncias apontam para a direção de mudanças na colocação das forças no
tabuleiro mundial. No Brasil, embora com fraca animação, a condenação dos
golpistas das forças armadas, simboliza que os militares podem ser enquadrados
e enfrentados e, a busca de novos mercados indica que é possível sobreviver sem
a submissão ao império dos Estados Unidos.
O ponto vulnerável está do nosso lado. As forças
populares e de classe ainda não reacenderam a aura oposta, para colocarem no
alto do horizonte a estrela socialista e almejar alcançá-la, marchando naquela
direção. É preciso acreditar e convocar para que a rebeldia acompanhe a onda criada
pelas contradições entre as potências. É no impulso delas que conseguiremos
saltar mais longe em busca de uma melhor colocação lá adiante. Com certeza, venceremos!
Ademar
Bogo
[1] BENJAMIN, Walter. A obra de arte
na era de sua reprodutibilidade técnica. O texto aqui publicado é inédito no
Brasil. O ensaio traduzido em português por José Lino Grünnewald e publicado em
A ideia do cinema (Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1696) e na coleção.
Os pensadores, da Abril Cultural, é a segunda versão alemã, que Benjamin
começou a escrever em 1936 e só foi publicada em 1955. file:///C:/Users/adema/Downloads/BENJAM-1%20(1).PDF