domingo, 20 de outubro de 2019

ADEQUADO E INADEQUADO


            
            Karl Marx quando se pôs a pensar a relação entre o concreto e o abstrato, buscou considerar no método da produção do conhecimento, a relação entre as ideias e as ações. Para ele, “o concreto é concreto porque é a síntese de muitas determinações”. O concreto aparece, portanto, no pensamento, como síntese ou como resultado. É o abstrato ou a abstração que se encarrega de manejar a busca do vir a ser daquilo que ainda não é explicitamente e, por isso, ainda se debate em nossa mente em meio às amarras das contradições. De outro modo, o filósofo Baruch Spinoza, ao tratar sobre o “adequado” e o “inadequado”, destacou que a nossa mente, algumas vezes age, outras vezes padece.
            Nesse sentido, ao reunirmos os dois pensamentos, vemos que o concreto em geral ainda não é concreto em particular, porque a mente humana não concluiu o processo das múltiplas determinações, mas, assim que a em nossa mente se formarem humana as ideias adequadas agiremos com maior eficiência, no entanto, se as ideias forem inadequadas, padeceremos. A lição que podemos tirar até aqui, é a de que precisamos adequar as ideias para que elas possam, pelas múltiplas determinações, arrumarem concretamente aquilo que está desarrumado no abstrato.
            As ideias inadequadas também podem ser consideradas como “ideias confusas”. Elas atrapalham o bom andamento do raciocínio e, não apenas sofrem porque não conseguem irem além do que já são como também fazem sofrer aqueles que pensam inadequadamente.
            Para darmos um passo à frente em nossa hermenêutica filosófica, tomemos como referência a ideia de “poder”. Como o concreto por meio de múltiplas determinações abstratas vem a ser concreto? Ou seja, a concretude do poder, após múltiplas abstrações vem a ser poder de fato com ideias adequadas?
            Como nada ocorre fora de um processo, causas e efeitos se intercedem reiniciando permanentemente as novas superações, temos que considerar, para chegarmos a uma síntese concreta do poder que queremos ter. Quanto a isso, há um novo elemento a ser incluído que é o da “posição” em que cada força se coloca.
            Em política sempre e em qualquer circunstância, deve-se levar em consideração a existência das forças que, aqui resumimos em três possibilidades: na primeira, cada força pode colocar-se na ponta extrema da linha de cada pólo, conformando assim, a relação antagônica; na segunda, ambas se colocam no meio da linha que leva a cada um dos pólos e conformam as posições que costumeiramente denominados de situação e oposição; e, na terceira, podemos ver uma força situada na ponta extrema da linha de um dos pólos, enquanto a outra força opta por vir a colocar-se próxima ao centro. Em que posição, em sua avaliação, estão colocadas as forças políticas hoje no Brasil? Para responder esta pergunta precisamos incluir outros dois conceitos: o de “obrigação” e o de “destino”.
            Quando tomamos a referência de poder, consideramos as relações econômicas e políticas e, facilmente percebemos que são relações da obra burguesa que, pela produção e mercantilização superou a economia feudal e, pela formação do Estado capitalista, suplantou a ordem política e jurídica da mesma estrutura arcaica. Diante disso, é da “obrigação” da burguesia até hoje, reunir todas as forças dominantes para pensarem e se dedicarem às relações que lhes garanta o poder, caso não o façam, não apenas o modo de produção que implementaram desaparecerá como desaparecerão  também dos os burgueses.
            Do outro lado “as forças de esquerda” geralmente colocam o poder como algo “estrategicamente distante”, algo como uma das possibilidades do destino histórico, contando que isso nem será certo nem incerto; não há previsão de tempo. Sendo assim, o concreto, por falta das múltiplas determinações das ideias, que, por sinal, quase sempre são inadequadas, nunca vem a ter a sua síntese, prolongando sempre mais o sofrimento.
            Se voltarmos as nossas atenções para o espectro partidário, vemos que na origem, o conceito de “partido” diz respeito à constituição de uma parte da sociedade que se coloca a favor do todo, enquanto que a “facção” também tem a forma de parte, no entanto, esta luta a favor de si mesma e contra as soluções para todos.
            No Brasil, sem dispensar as honráveis exceções, grosso modo, temos dois partidos que chegaram ao governo e passarão para a História como referências antagônicas: o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Social Liberal (PSL). O primeiro, pela sua capacidade educativa e pela capacidade de reunir em torno de si, por um período razoável, a grande maioria das forças populares, sindicais, religiosas e políticas; e, o segundo, pela incapacidade de não ser um “partido”, no sentido de não ter unidade, representatividade orgânica e idoneidade moral, constituindo-se como uma facção que luta contra o todo da sociedade e contra o próprio país. Mas, qual é no fundo a principal inadequação? É que o PT não existe mais como perspectiva revolucionária, mas o PSL está atuante e ativo como um vulcão  prestes à uma irrupção desastrosa, contra si e contra todos
            É no degrau de cima da escada que estão os maiores riscos e que as ideias inadequadas das análises pioram o sofrimento, porque não conseguem entendê-lo nem evitá-lo. Achar que as denuncias explodirão a facção e com ela explodida provocará o impedimento do presidente da República, parece ser uma inadequação da visão daqueles que se colocam, não no pólo extremo para enfrentar as classes dominantes pela busca do poder de forma mais afirmativa, mas daqueles que apenas torcem para que as forças extremadas percam importância e que elas também venham mais próximo do centro para juntas realizarem as disputas eleitorais.
            Há um elemento continuamente desconsiderado pelas ideias inadequada, o de que o presidente da República “atua” ou pertencia a dois partidos, o PSL pelo qual se elegeu e as Forças Armadas, que muitos achavam que o colocariam “nos eixos” e nada disso aconteceu.
            Se a dialética ainda for considerada nas análises reais e se para cada ação temos uma reação, a realidade nos mostra que estamos mais próximos de um novo golpe institucional como já vimos sinais no Peru e atualmente no Chile, do que o impedimento do presidente. Os recados há tempo vêem sendo enviados ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal é bom não ignorá-los.
            De outro lado, é preciso espantar as ideias e as opções inadequadas. Em termos políticos o poder foi acolhido pelas forças extremadas da direita enquanto que as forças de esquerda ao mesmo tempo que não percebem o pior acreditam ingenuamente que o poder governamental voltará para as suas mãos, com as decisões favoráveis do Supremo Tribunal Federal e a passividade do processo eleitoral. A lição já foi apreendida, que não há processo vitorioso e duradouro sem povo.

                                                                                                          Ademar Bogo   
              

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