sexta-feira, 14 de outubro de 2016

LEGALIDADE E ILEGALIDADE



           As palavras, legalidade e ilegalidade ao serem pronunciadas nos tempos atuais, soam um tanto desconectadas da realidade, como também soam desconectadas as palavras, direita e esquerda, principalmente após esta última ter chegado ao comando do governo federal. Mesmo assim, deveriam suscitar discussões, mas poucas paixões despertam.
            Lukács, o filósofo da “História da consciência de classe”, fez uma afirmação que pode ter validade atualizada; disse que, “não há nenhum partido, por mais oportunista que seja, até mesmo o partido da traição social, que não possa ser empurrado para a ilegalidade”. Esta forma de ver a história mostra que a presença de uma força política na legalidade, não importa a sua profissão de Fé, pode ser passageira; isto porque, o fio que a separa da ilegalidade é quase que invisível e, o que ontem foi amanhã já não será mais.
            Seguindo o mesmo raciocínio, é de Engels a frase que, “a ironia da história universal põe tudo de cabeça para baixo”. Estar de cabeça para baixo é ver as coisas pelo ângulo inverso, com certo privilégio, de ver de baixo para cima. Na Alemanha, os “revolucionários”, ou “subversivos”, prosperavam mais com os meios legais do que com os ilegais, por que os partidos da ordem se afundavam com a legalidade que eles mesmos haviam aprovado.
            Para quem não é acostumado a longas leituras sobre a história, se fizer revisões das experiências feitas, chega ao mesmo resultado. De acordo com o raciocínio acima, um período pode ser legal ou ilegal, depende apenas com que objetivo foi produzido. Daí é que, para falarmos em democracia, antes precisamos analisar as relações que produzem a legalidade e a ilegalidade, para daí chegarmos ao ponto onde a ingenuidade se desvanece.
            A classe dominante, e é bom que não se esqueça que ela continua existindo, mesmo quando parece desaparecida, maneja a legalidade e a ilegalidade de acordo com as suas conveniências. Quando não tem muita pressa, manobra e paga para que os atos ilegais se tornem atos legais; quando tem pressa, aplica golpes de Estado e aprova a ilegalidade com votações combinadas em jantares.
            Para os trabalhadores o que é pior, andar na legalidade ou provocar a ilegalidade para subverter a ordem estabelecida? É evidente que, se nos dois sentidos trafega a classe dominante, a ela cabe a sinalização de onde ambas começam e terminam. Não cabe aos trabalhadores dizerem quando as atitudes legais se tornam atos ilegais. É a classe dominante quem determina quando deve ou não romper com a legalidade impondo outra ordem.
            Para os trabalhadores, o mais alto grau de ilegalidade, na ótica burguesa, não é legal nem ilegal, é apenas luta por direitos sociais e pela revolução. Quem quebra a legalidade é a classe cuja ordem estabelecida pertence. Daí tinha razão Engels quando disse: “E se nós não formos loucos a ponto de lhes fazermos o favor de nos deixarmos arrastar para a luta de rua, não lhes restará outra saída senão serem eles próprios a romper essa legalidade tão fatal”. Por que? Naquelas circunstâncias, a simples disputa eleitoral que fazia os revolucionários ficarem sempre mais fortes, havia se tornado um incômodo insustentável para a classe dominante.
            Aqui, o simples fato do governo Dilma ter fortalecido as políticas públicas e ampliado as funções do Estado, que deveria voltar a ser neoliberal, por isso nada tinha de subversivo nem de ilegal; foi o suficiente para darem um golpe. Daí a lição, para aqueles que acreditam que às disputas com a classe dominante devem ser feitas nos marcos da legalidade, como por exemplo, investir todos os esforços na realização de uma Assembleia Constituinte ou na reforma política, sem pensar em derrotar definitivamente a classe dominante que, em qualquer situação, sempre impõe os seus interesses na legalidade ou pela ilegalidade, tanto faz, afinal são os dois lados da mesma moeda que circula no capitalismo: do lado que cair, tem o mesmo valor.
                      Ademar Bogo, filósofo, escritor e agricultor. Autor do livro: Organização política e política de quadros.

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