quinta-feira, 6 de outubro de 2016

DATAS QUE MARCAM


 
            Há datas preparadas pelos acontecimentos que não surpreendem pelos resultados; a priori já são esperados, apenas alimentamos a ansiedade de vê-los fisicamente. No entanto, há resultados que se tornam ataques e marcam feito arranhaduras o couro das costas da história, que chegam a desfigurá-la.
            Se procurarmos em qualquer ano e neles qualquer mês, encontraremos datas incômodas que, se vivas fossem, continuariam a sangrar pelas feridas provocadas. De outubro de 1967, temos a notícia da execução do comandante Ernesto Che Guevara, nas selvas bolivianas. Mas se quisermos retroceder um ano, em fevereiro, o Exército colombiano punha fim à vida de Camilo Torres; ou, avançar para a outra década, em 11 de setembro de 1973, o golpe militar, assassinara Salvador Allende, no Chile.
            Este outubro, o de agora, de 2016, vem surgindo com ares de contradições ainda mais frontais. Fato semelhante vimos  acontecer em fevereiro de 1990, quando os eleitores renegaram os sandinistas como governadores. Empunharam, com a ajuda das ideias imperialistas, a espada da vingança, procurando penalizar aqueles que, pela revolução, haviam feito vencer a esperança, mas se desviaram.
            O dois de outubro brasileiro é semelhante ao dois de outubro colombiano. Em comum temos um julgamento. As forças armadas de lá, cerzidas por colunas guerrilheiras, por quase seis décadas, foram reprovadas na intenção de entregar as armas e descansar da guerra. As forças partidárias de esquerda daqui, após três décadas de dedicação, foram reprovadas nas urnas, de certo, por forçarem demais a política de conciliação.
            Mas será que os eleitores colombianos são a favor da luta armada e não querem a Paz e os explorados brasileiros não querem um governo progressista?Nesses casos, as FARCs contariam com a maioria a seu favor e deveriam seguir para o desfecho rápido da guerra e os partidos de esquerda brasileiros, deveriam fechar para balanço, pois os “coxinhas” venceram com o discurso da moralidade perdida.
            Não são estes os sinais anunciados. Os resultados das duas votações evidenciam que as tendências evoluíram para outra dimensão. Trouxeram para fora, na forma de protesto, a essência da consciência vingativa. Mas por que as multidões se vingariam daqueles que os ajudariam?
            Nas multidões, apesar da consciência coletiva, vicejam também as representações individuais normais. Quando alguém é violentado ou ferido em sua dignidade, exige que a justiça seja feita. O Estado deve prender, julgar e condenar. Pararia aí o espírito de justiça. Mas a parte ofendida, se pudesse, faria a execução do culpado com as próprias mãos. Como não pode fazê-lo, quer o sofrimento, a solidão e as péssimas condições na reclusão. Não quer a reeducação para a futura reintegração social, mas, que o condenado, seja castigado e que “apodreça na cadeia”.
            Nas causas políticas e sociais as reações são quase iguais. Ao ver as FARCs ansiosas pela Paz, viu-se ali um “arrependimento”. Desejosos os guerrilheiros pela reintegração social, a população percebeu e disse não. Não quer que eles tenham nenhuma aprovação. Muito menos que venham a ser parlamentares e disputem livremente as eleições. Querem-nos banidos, presos e condenados pelos duzentos mil mortos produzidos, sendo ou não culpados.
            Aqui, é igual a situação. O desprezo dado, é a punição pelos erros cometidos. Não é que sem o PT os políticos deixarão de roubar e desviar os recursos públicos. Na rejeição ecoa a punição: “todos, menos esses”! Então chegou a vez de querer e não poder; de pedir e não receber; de implorar e já não convencer.
            Essas derrotas para essas forças são mais que punitivas, são definitivas. Isto porque, não basta derrotar é preciso humilhar, tirar qualquer coisa que possa beneficiar a força que tornou inimiga. É preciso fazê-la sofrer, para aprender. Os colombianos que votaram, querem a Paz, mas não dão o perdão.  
            Tudo isso nos ensina que devemos fazer para vencer, mas que é preciso educar e convencer. A história é uma obra coletiva, não pode vir a ser uma revolta vingativa.  Quando a reação vira vingança é tempo de fazer mudanças.               
                                          Ademar Bogo, filósofo escritor e agricultor. Autor do livro Lições da luta pela terra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário