A mercantilização na compra e venda pessoas é uma prática
milenar da humanidade. Já os primórdios as mulheres eram raptadas e os homens
derrotados na guerra ou em um duelo, obrigavam-nos a trabalharem de graça para
os seus senhores. Já na contemporaneidade ,Karl Marx ao discorrer sobre a “acumulação
primitiva” dirá que: “O ponto de partida do desenvolvimento que deu origem
tanto ao trabalhador assalariado como ao capitalista foi a subjugação do
trabalhador”.[1]
Embora em estágio mais avançado e apesar de vivermos sob
o domínio imperialista, a fase superior do capitalismo em decadência, em
relação aos países pobres, desde o pós-guerra de 1945, os críticos do
capitalismo começaram a formular interpretações e nomeando-as como “Teoria do
subdesenvolvimento”; expressa pela CEPAL – Comissão Econômica para a América
Latina e Caribe) e, posteriormente, devido à multidimensionalidade da
exploração econômico-financeira, esse dinamismo apropriador de excedentes dos
países submissos aos Estados Unidos da América, de “Teoria da dependência”.
Embora todas as constituições dos países exaltem o princípio
da soberania nacional e há elementos fixos para orgulharem-se disso, pois, território,
povo e Estado todos têm. O que ainda não adquiriram e, por isso muitas características
do colonialismo ainda vigoram, foi a autonomia econômica e o domínio sobre as
suas próprias riquezas que a cada momento são obrigados à cederem os direitos
de exploração ao capital destrutivo.
Para Marx, para que o dinheiro e a mercadoria se
transformem em capital, “(...) é preciso que duas espécies bem diferentes de
possuidores de mercadorias se defrontem e estabeleçam contato; de um lado,
possuidores de dinheiro, meios de produção e... de outro, trabalhadores livres,
vendedores da própria força de trabalho e, por conseguinte, vendedores de
trabalho.”[2] No entanto, esses
parâmetros não são válidos para todas as situações.
Costumeiramente vemos que a relação entre trabalho e
capital se dá, primeiro, pelo oferecimento de emprego em alguma atividade
produtiva e por causa disso forma-se uma fila na entrada da empesa empregadora.
Feita a seleção e celebrado o contrato de trabalho, o trabalhador terá de levar
todos os dias, com suas próprias pernas, o seu corpo para entregar a mercadoria
força de trabalho, para que ela transforme o dinheiro investido naquele
processo de produção e se transforme em capital.
Nesta fase do capitalismo, com o domínio do imperialismo
decadente, começamos a ver inovações nas relações da “Teoria da dependência”,
como também nas práticas impositoras de responsabilizações aos governos subservientes,
voltadas para a elevação da desumanização da força de trabalho carcerária. Logo,
se na normalidade o trabalhador leva a mercadoria força de trabalho e a entrega
em troca de pagamento, nas novas circunstâncias, o próprio trabalhador presidiário
é convertido no local de moradia em uma mercadoria, para que depois o seu tutor
retire dele, a força de trabalho e a transforme em uma nova mercadoria
produtora de outras mercadorias.
Conhecemos com o nome de “Parcerias Púbico-privado”
(PPP) a política de terceirização dos presídios, quando o Estado oferece certos
setores da comunidade carcerária para a iniciativa privada tomar conta. Nos
Estado Unidos e no Reino Unido essas práticas já ocorrem desde a década de
1980. No Brasil, em 2004 foi editada a Lei 11.079/04 para instituir as normas
para as licitações e contratações desses serviços. Sem delongas, no Brasil
adotou-se o modelo francês e, as empresas recebem uma verba do estado para administrarem
um setor presidiário determinado.
Várias iniciativas foram estruturadas no Brasil. A mais
significativa está localizada em Minas Gerais que, no ano de 2004, o governo do
Estado assinou um convênio com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),
com o objetivo de construir cinco presídios para posteriormente entregar para a
iniciativa privada. A partir de 2008, no Município de Ribeirão das Neves, apareceu
o resultado desses financiamentos e, aquele presídio é tido como a melhor
experiência de gestão carcerária de parceria público privada. No Brasil,
existem 32 sistemas parecidos que atrai a atenção da iniciativa privada.
Por que esse assunto veio à tona aqui? A reflexão
filosófica, não ignora os fatos, antes ocupa-se em ajudar a perceber as causas e
as possíveis consequências neles originadas. Desde o início do ano, estamos
perplexos com a deportação de imigrantes pelo governo dos Estados Unidos da
América. A causa disso é o excesso de trabalhadores que não encontram mais
compradores para a força de trabalho. Logo, é a maneira mais fácil para o império
se livrar deles, deportando-os.
Há poucos dias, a notícia de que 238 cidadãos
venezuelanos foram deportados, mas não levados para casa; presos e conduzidos às
pressas, aterrissaram em El Salvador. Sem nenhuma condenação, muitos deles pelo
simples fato de terem uma tatuagem no corpo foram condenados à prisão. Sob a
invocação da Lei dos Inimigos Estrangeiros de 1789, que nem os próprios juízes a
consideraram como válida e, sem nenhum vestígio de guerra contra a Venezuela, o
fato estampou-se com imagens repugnantes em todos os meios de comunicação.
O centro de Confinamento do Terrorismo – CECOT, construído
há pouco tempo em El Salvador, é tido como modelo de prisão no mundo. Um país com
U$ 34 bilhões de dólares de Produto Interno Bruto – PIB – e renda per capita de
U$ 5, 391 dólares, no Brasil passa dez de mil e, na Argentina e no México chega
de treze mil dólares. Com uma economia fragilizada de exportação primária de
manufaturados, café e derivados de cana-de-açúcar, passa agora a ser uma base
para a explorar a força de trabalho de presos estrangeiros deportados, mediante
os trabalhos forçados, ampliando assim a mais-valia pelo país receber uma
recompensa para cada preso. O valor inicial divulgado por essa remessa de venezuelanos
chegou a U$ 6 milhões de dólares.
É evidente que nessa transação há uma provocação à
Venezuela que promete resgatar os presos e, como isso aumentará o valor de cada
um, ao ter de indenizar o governo de El Salvador pela” Carta de alforria” que
terá de emitir. Mas isto não exclui o precedente criado que poderá se tornar
prática para o neoliberalismo também no âmbito prisional. Quando Marx ao
explicar o linho como valor equivalente da troca com o casaco, expressou que: “Como
mercadoria, ele é cidadão desse mundo”; isto porque, todos os produtos se referenciavam
nele. O presidiário passa a ser o mais novo produto equivalente de troca por
dinheiro que, nessa primeira operação ficou, sem pechinha, por U$ 20 mil
dólares.
Com a terceirização carcerária local, o preso cumprirá a
sua pena em qualquer presídio de um país. Com essa elevação do presidiário ser
uma mercadoria com valor de troca e, convertido pelo neoliberalismo em “cidadão
do mundo”, ele virá a cumprir a pena em qualquer lugar do planeta e, quiçá,
no futuro, fora dele. Imaginemos que, se no passado o lema para banir os
revolucionários era: “Brasil ame-o ou deixe-o”; esse slogan já não vale mais,
agora vale o valor que o presidiário incômodo pode ter.
Em qualquer forma, continua valendo a máxima comunista: “Para
fazer a revolução, a primeira tarefa é não se deixar prender”.
Ademar
Bogo
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