domingo, 4 de setembro de 2022

CLASSE E CONSCIÊNCIA DE CLASSE

  

            O filósofo Georg Lukács ao aplicar no concreto, nos dirá que “o critério sinalizador da relação correta entre partido e classe só podem ser descobertos na consciência de classe do proletariado”.

            De imediato percebemos neste pensamento, uma íntima relação entre as três categorias: partido, classe e consciência. Superficialmente podemos considerar que pouco ou quase nada há de novidade nesta trilogia. No entanto, relendo o parágrafo encontraremos, sem desprezar as outras duas, o acento maior na categoria da consciência; isto porque, é ela quem “sinaliza”, aponta ou também indica, a relação correta a existir entre o partido e a classe.

A consciência é então, por essa visão, a categoria unificadora e sustentadora da organização de classe. Esse destaque é tão importante que o filósofo chega a dar razão a Bakunin, revolucionário anarquista russo, quando afirmou que, “numa classe com unidade interna, a formação do partido seria algo supérfluo”. Não resta dúvidas que a grandeza da consciência de classe é também sinônimo de organização, de unidade e de luta de classes.

O critério da consciência, porém, é pouco considerado na atualidade, principalmente quando se trata de buscar a unidade de ação. As forças pouco organizadas se unem com indivíduos avulsos, como quem é chamado para agir em uma catástrofe de desmoronamento onde imperam pedidos de socorro. É evidente que em uma situação de vida ou morte não cabe discussão; é preciso agir mais com as forças físicas do que com as ideias. E, sem pestanejar, dar a mão para qualquer braço estendido e distribuir magros sorrisos a quem se envolve, oferecendo nem que seja um copo d´água.

Considerando o desmoronamento do capitalismo nesta fase destrutiva e suas permanentes crises, as ações emergentes permanentes tornaram-se obrigatórias para qualquer indivíduo consciente que pense em política. Esta, por sua vez, tornou-se a arte de, por um lado, “reunir os diferentes” e, de outro, “arrebanhar os igualados”, formando dois contingentes sem classes que, presos por baixo dos escombros, pregam a “reconstrução”. Para além disso, outra ideia une as duas partes, culpabilizar os governantes por todos os males e derrocadas homicidas.

Agora já podemos perguntar: seria a urgência do salvamento que leva as forças da reunião dos diferentes a propor a reconstrução do capitalismo ou a falta de consciência revolucionária para a superação do mesmo?

Como estamos falando de Filosofia política, não custa trazermos presente também o que Marx percebeu e escreveu sobre os economistas, no texto “Miséria da filosofia”. Para os economistas, disse ele, só existem duas espécies de instituições, as artificiais e as naturais. Nisso eles se parecem com os teólogos que também estabelecem dois tipos de religião: a emanada de Deus e as outras como invenções dos homens. “Dizendo que as relações atuais – as relações burguesas – são naturais, os economistas dão a entender que é nessas relações que a riqueza se cria e as forças produtivas se desenvolvem segundo as leis da natureza”.

Diante disso, não é difícil concluir que, os economistas e os pastores atuais partem do mesmo principio ilusório, de que, as relações de exploração, dominação e interferência imperialista são naturais e só há uma verdade a ser seguida, aquela emanada pela falta de consciência crítica, que vê na restauração das relações capitalistas a salvação da miséria e da pobreza, quando na verdade reforçam as medidas para mantê-las. Por isso, o discurso dos condutores dos rebanhos, em nome da religião, culpa o comunismo e, o discurso das forças presas ao economicismo, prega o amor contra o ódio, adequando-se à mesma ordem salvadora.

            Com o agravamento da pobreza, acentuando-se cada vez mais para tornar-se estado de emergência permanente, a política passou a incorporar os valores religiosos e, obrigou-se, devido ao enorme potencial eleitoral dos pobres, a proceder a caridade institucionalizada; ou haveria alguma diferença entre pegar uma cesta básica no salão do templo religioso ou ir ao Banco sacar o valor do auxilio governamental e comprá-la?

            O rebaixamento da consciência política em todos os níveis, levou a substituir a organização de classe, seguindo o critério de avaliação, pela “opinião das massas”, sobre quem poderá salvá-las e, esse envolvimento das forças minimamente organizadas, nos processos eleitorais, condenou a luta de classes a ser refém das prioridades emergenciais, ajudando a prometer a solução economicista. Há, com isso, uma ausência de reação determinada, pois, se contra os governos aliados não se luta; contra os governos contrários, espera-se pela volta dos a favor, para não lutar. 

            É evidente que a devoção pela manutenção da ordem capitalista é o endeusamento do Estado. Para o político, de esquerda ou de direita, estar com o Estado, cria a mesma sensação do crente estar com Deus. Sendo assim, se sem consciência o pastor transforma a religião em ópio somente dos crentes, os políticos transformam as eleições em ópio de todos. Por isso, torna-se fácil juntar os dois preceitos, reveladores da mais profunda ignorância: sem religião e sem eleição não há salvação.

            Entender que, consciência, classe e partido, não surgem da natureza, precisam ser criados e alimentados pela luta de classes, é entender que temos muito trabalho pela frente, não para restaurar o capitalismo, mas para revolucionarmos a política. Não há outro caminho. Ou a libertação vem a ser uma obra coletiva dos trabalhadores e massas exploradas, ou seremos eternamente dominados pela alienação.

                                                                                   Ademar Bogo

Nenhum comentário:

Postar um comentário