domingo, 1 de agosto de 2021

A POLÍTICA DA FORÇA E A FORÇA DA POLÍTICA

                Remanescem dos poderes imperiais antigos, dos reinados e da tradição absolutista, a vontade e o poder do soberano, não importa se alimentados por um indivíduo, um partido ou um exército partidarizado. Marcus Tullius Cícero, imperador romano até o ano 43 antes de Cristo, afirmou que: “carrego em mim três pessoas; a mim mesmo, meus adversários e os juízes”.

            É de suma importância perceber que muitas verdades permanecem como foram elaboradas na História, mudam apenas os personagens. Se para Thomas Hobbes, quando o soberano agisse desrespeitando a lei não era ele a estar errado, mas a lei, por isso revogavam a mesma, na atualidade, quando o arremedo de soberano erra, ou a lei não está de acordo com os seus interesses, ele ameaça com golpe e intervenção militar contra as instituições que ele mesmo jurou defender.

            Evidentemente, seja na antiguidade ou no capitalismo, o poder e o Estado são instrumentos de manejo da classe dominante. Essa mesma classe ao estabelecer a legalidade do poder representativo, não importa o tamanho da população de um país, importa apenas a busca da formação da maioria para atentar contra o país e as forças de oposição. Para assegurar as manobras políticas os mensageiros do capital colocam na retaguarda de seus passos, as forças armadas. Estas últimas entram em ação quando a coerção das leis tornou-se insuficiente para garantir os interesses burgueses, por isso, como arautos do mal, não prometem o melhor, apenas anunciam: “O que virá será ainda pior”.

            De todo o visto, vivido e ameaçado não podem ficar apenas as lições históricas. A ingenuidade também é uma força inimiga que atenta contra a própria consciência. Ter ilusões que no capitalismo a justiça, a liberdade e a igualdade serão garantidas pelos poderes da República, equivale acreditar também na bondade do capital e na fidelidade das forças armadas ao povo. O simples fato de existir o Estado capitalista nos dá a certeza de vivermos em uma sociedade injusta e desigual.

            A “inconsciência” nos diz Georg Lukács em seu livro, “História e consciência de classe”, é um sinal de imaturidade do movimento. Por imaturos, devemos entender indivíduos ou um partido que agem sem levarem em consideração as consequências de seus próprios atos. Significa, no caso da luta de classes, agirmos comprometendo o nosso próprio futuro. Como? Ignorando que a permanência da desigualdade social tem para a classe dominante, a mesma importância da igualdade para os trabalhadores. A existência da primeira e à condição primordial para nunca deixar que a realização da segunda aconteça.

            Por outro lado, há equivalência entre a imaturidade do movimento de organização dos trabalhadores e a dominação burguesa. Os capitalistas são assim denominados por encarnarem o capital e o Estado. Estas duas formas de poder não existiriam sem as instituições e as pessoas leais para representá-los. Ou seja, não é apenas a intransigência do capitalista     colocada a favor dos rendimentos financeiros a fazer mal aos trabalhadores, mas as próprias leis de produção e reprodução do capital, sustentadas pelas práticas econômicas cotidianas. Da mesma forma, não é o político capitalista apenas, culpado por não agir democraticamente, mas a própria estrutura do Estado a impedir qualquer movimento em outra direção. 

            Os trabalhadores ao acreditarem na honra burguesa, em vistas de levarem a cabo determinadas “vitórias”, como defensores da ordem, também encarnam a defesa do capital e do Estado. No entanto, antes desta encarnação os representantes partidários incorporam  o espírito pacifista, a ingenuidade e a domesticação à ordem estabelecida. Isto porque, em nome da liberdade de formulação de políticas públicas, para favorecer temporariamente os mais pobres, obriga a garantir a liberdade do capital de ir a todos os lugares, inclusive nas entranhas do orçamento público, além de  permitir a exploração da força de trabalho e agir de acordo com as leis coercitivas garantidoras do funcionamento da sociedade desigual, caso contrário são  derrubados pela política da força.

            Vivemos um tempo controverso. Ele nos convida a tomarmos posições mais incisivas. Contra as ameaças da política da força devemos contrapor com a força da política, mas isto significa deixar transparente qual é o objetivo final a ser alcançado. Objetivos parciais conciliadores, alimentam a ingenuidade de, “no longo prazo”, irmos definindo onde queremos chegar. No entanto, a cada década, diante das crises, os capitalistas sob pressão do capital, desmancham as combinações e impõem, pelas leis ou pela intervenção militar, a ordem que lhes interessa.

            Quando não se tem objetivos definidos, quem dirige a política são as pautas da classe dominante ou dos pregadores do caos. Observe e veja, pelo que lutamos hoje? Por vacina, auxilio emergencial, contra o voto impresso e outras poucas coisas semelhantes. E tudo por quê? Por quê houve um golpe em 2016? Por quê perdemos a disputa eleitoral de 2018? Não. Porque antes disso, a ingenuidade política permitiu que os capitalistas agissem com total liberdade na acumulação do capital; as forças armadas se educassem para defender o capitalismo, ao ponto de contestarem o comunismo sem que haja qualquer vestígio de ameaça e, mais ainda, por não termos como preocupação a verdadeira conquista do poder.  

            A definição do objetivo final impede os retrocessos ingênuos. Os processos revolucionários admitem derrotas, mas nunca a mudança da direção da finalidade. O alcance do objetivo final se assemelha ao alcance do objetivo parcial, com uma diferença, se o objetivo parcial é alcançado dentro da ordem, é porque esse objetivo é suportável pelos capitalistas, por isso, até se somam ao movimento para efetivá-lo. Se o objetivo final é contestado pela classe dominante, é porque ele é insuportável por ela. Logo, em primeiro lugar, devemos ter claro qual é o objetivo final a ser alcançado, a partir disso sim, devemos definir os objetivos particulares que sigam naquela direção.

            Insistimos, que a organização política, a formação de militantes e a elaboração dos métodos de trabalho, dependem da definição do objetivo final. A força política contra a política da força, somente pode vigorar se houver uma verdadeira “direção política”. Quando isto ocorre, todas as forças progressistas e revolucionárias são chamadas a darem um passo à frente. Este é o primeiro compromisso para combater a ingenuidade alimentada pelo senso comum, na atualidade formado pelas seitas religiosas e pelas inverdades publicadas nas redes sociais.

            A organização partidária é a força mediadora entre a elaboração teórica e a realização das tarefas. Ela é responsável para medir o ritmo da marcha em direção ao objetivo final e, principalmente, por quais lugares devemos conduzir o movimento. Ao mesmo tempo em que assegura a linha política, combate o fatalismo e a ingenuidade e evita que se tenha de sempre começar de novo pelo degrau mais baixo da luta de classes, formado pelas mais simplórias reinvindicações.

            A força da política se impõe quando a política da força é não apenas derrotada, mas definitivamente impedida que se jamais se volte contra o povo e os interesses do país.

                                                                                                                      Ademar Bogo

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