domingo, 9 de junho de 2019

MEDIDAS E DESMEDIDAS POLÍTICAS


    
            Karl Marx quando estudou o capitalismo e decifrou às suas leis tendenciais ( produção, exploração, concentração e expansão para fora, na forma de imperialismo econômico), aproveitou o mesmo estudo para demonstrar como deveria ocorrer o processo da transição socialista.
            O socialismo, visto como um processo de transição para o comunismo ganhou com os estudos de Marx definições e conceituações científicas naquilo que diz respeito às suas leis de funcionamento que, tanto para a manutenção, quanto para a superação do capitalismo deveriam ser formuladas de acordo com as circunstâncias de cada local. Assim deveriam ser tomadas as medidas políticas apropriadas, que nem sempre se identificavam com a ciência, pois, dependiam dos problemas e da criatividade dos governos.
            Apontou ainda Marx, que o capitalismo, devido à anarquia na produção desmesurada, promovida pelos capitalistas que têm em mente apenas o lucro e por isso querem produzir cada vez mais,  produz crises periódicas que desestabilizam a ordem estabelecida e facilitam para que as forças exploradas se recoloquem de tal maneira que possam, com suas ações, provocar avanços na correlação de forças.
            Conscientes de suas responsabilidades, os trabalhadores e suas organizações de classe  sabem que a transição socialista não é uma inovação imediata e utópica de sociedade, mas a superação das contradições e dos obstáculos que impedem o acontecimento das mudanças para frente, sejam elas na organização, da economia, da política, da educação, da cultura e de outras tantas áreas que necessitam de avanços para, de fato, os processos caminharem para o melhoramento da sociedade e da vida humana.
            De outra forma, enquanto avança o processo da revolução que leva em frente a transição socialista, primeiramente, por meio do longo período de lutas para garantir a permanência ou a conquista de direitos sociais, a classe dominante ou setores dela, agem com a contrarrevolução, geralmente implementando medidas impopulares para garantir que a taxa de lucro dos capitalistas continue sendo garantida, por isso, implementam reformas que reorganizam o processo de acumulação de capital de acordo com as circunstâncias de cada época.
            Na transição para o socialismo, juntamente com as medidas políticas, o processo exige que sejam adequados outros elementos como, a organização, a formação da consciência e a elaboração programática das soluções que deverão ser construídas passo a passo.
Na manutenção da dominação capitalista estávamos acostumados a interpretar os “planos econômicos” editados pelos governantes que iniciavam os seus mandatos publicando medidas que visavam acertar os rumos da exploração econômica e da dominação política, mas eis que nos últimos cinco meses, o que estamos vendo é uma contínua edição de “desmedidas” sem um programa claro de governo.
            A tradição do “pão e circo” iniciada no Império Romano em crise tem muita semelhança com o processo do governo do Nero atual. Lá, o objetivo da distribuição de comida e diversão visava desorganizar e alienar a população para que ela se mantivesse fiel à ordem. O pão, na verdade, era a distribuição de cereais, mas, o circo, não era apenas formado pelas exibições artísticas; também havia os espetáculos sangrentos onde enfrentavam-se até a morte, gladiadores bem treinados; apresentações de animais ferozes devorando os cristãos presos e outras formas de corridas e torturas de animais.
            No caso brasileiro, há pouco pão para ser distribuir, por isso, até o que foi dado com a mão esquerda, ameaçam tomar de volta com a mão direita e, ao invés de medidas, o governo toma “desmedidas” desmanchando o que foi edificado, em décadas passadas. Senão vejamos: no ano de 2003 o Congresso Nacional votou o Estatuto do Desarmamento e o governo desenvolveu uma campanha para que a população entregasse as armas de fogo. Agora, por falta de espetáculos sangrentos suficientes para distraírem a população, o governo, coerente com a política de contenção de gastos, edita um decreto que flexibiliza o porte de armas em quantidade espantosa, para que a própria população se ocupe e crie os seus “eventos sangrentos” nas ruas e nos campos.
            Dentre outras decisões de “desmedidas”, os cortes no sistema de ensino com a ameaça de não enviar dinheiro para as universidades pagarem água, luz, limpeza e sustentarem às pesquisas, a mais recente investida está se dando contra o Código de Trânsito Brasileiro, contrariando também as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Primeiro investiu contra a instalação de novos radares, depois, intenciona amenizar a pontuação na carteira em caso de multas e a desobrigação de utilizar a cadeirinha no banco traseiro do veículo fragilizando a segurança das crianças; além do mais prorroga o prazo da renovação da habilitação de 5 para 10 anos. Ou seja, são “desmedidas” que se editam sem dinheiro e fortalecem o liberalismo e o egoísmo individualista, por isso parece que fazem o bem.
            Por outro lado, é importante prestar atenção, que este Nero que incendeia as discussões com as suas intervenções, nada tem de ingenuidade. A verdade é que, não tendo nada a oferecer de benefícios que envolvam investimentos materiais, ele oferece benefícios espirituais voltados para a subjetividade individual, principalmente para assegurar o apoio de parte da classe média, setores evangélicos e seitas pentecostais que ainda se encantam com a política circense dos matadouros onde são abatidos jovens pobres e negros..
            No entanto, essas “desmedidas” cheirando a fanfarronices, atraem as atenções e descarregam o peso das criticas sobre a política do espetáculo, enquanto ganha tempo para acertar a liberalização das privatizações do petróleo e aprova as reformas que as elites dominantes exigem. Depois disso, ao contrário do que parece, poderemos ser surpreendidos, não com o descarte do comando governamental, mas com o seu fortalecimento, porque, sem pão e sem circo, somente a brutalidade pode conter as revoltas e os descontentamentos populares. Nesse caso, apenas um presidente com sangue nos olhos, pode cumprir essa missão. Por isso, vigiar e “urrar” desde logo, para expor as dores que a suposta sensação de prazer egoísta profetiza, é a melhor maneira de se defender.
                                                                                              Ademar Bogo          

                   

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