sábado, 6 de fevereiro de 2016

DECIDIR-SE PELO NOVO




               No agravamento das crises é importante olhar para todos os lados, inclusive para a frente. Há uma passagem ilustrativa de Antônio Gramsci, produzida entre as paredes frias do cárcere italiano, que ilustra bem o que devemos pensar. Destaca ele que, se a classe dominante perde o consenso, ou seja, não é “mais dirigente”, mas somente “dominante”, detentora da força coercitiva, significa que as grandes massas se separaram das ideologias tradicionais, não acreditam mais no que antes acreditavam. Então a crise consiste justamente no fato de que o velho morre e o novo não pode nascer: neste interregno, verificam-se os fenômenos patológicos mais variados.
            A situação brasileira nos mostra que os dois fenômenos estão acobertados pela crise: o primeiro diz respeito à aparente perda de consenso entre a classe dominante, no que se refere à direção do país, mas não há nenhum desentendimento sobre o aspecto da dominação. O capital, os capitalistas e o governo, continuam unidos naquilo que diz respeito à exploração humana e da natureza.
            O outro fenômeno atinge a imaginação das massas; estas, se já não acreditam mais nas ideologias dos partidos e no caminho trilhado pela ilusão eleitoral das forças de esquerda, também não tomam nenhuma nova iniciativa para mudar a pauta da política, apenas opinam. Comprova-se isso pela pesquisa de um instituto renomado realizada em maio de 2014, a qual demonstra que 61% dos entrevistados eram contra o voto obrigatório e, 57%, se livre fosse, não votariam na próxima eleição.
            Por que o novo não pode ainda nascer? Porque está dominado por fenômenos patológicos ou doenças criadas nas consciências das forças dirigentes, partidárias e populares, que contaminam as perspectivas com as posições defensivas; por isso, defendem que a obrigação agora é unir-se para socorrer o velho, para que ele gere empregos e não perturbe o projeto institucional.
Enquanto as forças partidárias acreditam que a solução é institucional, mantendo ou dispensando a presidente da república, o capital e os poderes da república, em nome do desenvolvimento, devastam o que resta do semiárido brasileiro; alagam a Amazônia com hidrelétricas; poluem a natureza com agrotóxicos; secam os rios; geram catástrofes sociais e ambientais soterrando povoados inteiros; estrangulam os povos nativos e quilombolas; aquecem e poluem o planeta; cavam nas profundezas da terra o petróleo para mover veículos particulares; aumentam impostos, cortam benefícios etc.; com todas essas contribuições, o velho não pode ainda morrer e continua a matar.
            Mas até quando vamos acreditar que as mudanças ocorrerão por consenso? Que a encíclica do Papa sobre a ecologia, convencerá os capitalistas que os rios que abastecem as cidades vão secar? Que o petróleo “é do povo brasileiro” e não uma fonte de energia suja insuportável para planeta? Que o capitalismo será superado pelo próprio progresso e que as revoluções estão fora de moda? 
            Precisamos acreditar que o capitalismo é o velho que ainda não morreu, mas se o deixarmos, mesmo cambaleante, impossibilitará a continuação da vida no planeta. Decidir-se pelo novo, é romper com as ideologias de que as soluções virão pelo processo eleitoral e que a política é coisa para corruptos. É preciso salvar o planeta do capitalismo. Ver dessa forma, pode até ser um olhar velho e repetido, mas é um chamado novo para atacarmos o capital em todas as suas frentes de ação, para impedi-lo que continue com sua escalada desumanizadora.
                                                                                                            Ademar Bogo, filósofo e escritor.   
             

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