Costumamos chamar de “fiasco” um
fracasso ou um desastre propositalmente provocado, justamente porque as coisas
não saem de acordo como planejadas. O filósofo Nietzsche, chamou de “tragédia”
e “fracasso” tais infortúnios. Para ele o estado em que fazemos o mal é
raramente agradável como quando fazemos o bem, e isso é um sinal de falta poder,
por isso “(...) traz consigo novos perigos e incertezas quanto ao poder que
possuímos e turva nosso horizonte com perspectivas de vingança, escárnio,
punição, fracasso”.[1]
Tivemos a impressão nesses primeiros
meses de 2025, que no coração e na mente do império norte-americano, as
frustrações avançaram tornando-se perigosos fiascos, tendo por companhia, a
vergonha, a vingança, o escárnio e o fracasso. Isso se deve ao reducionismo cada
vez maior do controle do poder de um grupo minoritário, caprichoso, elitista e totalitário;
embora apresente-se como exemplo de democracia mundial. Eric Fromm (1900-1980),
filósofo e psicanalista alemão, ao tratar do Medo à liberdade, chegou ao
entendimento que: “O único critério para a concretização da liberdade é saber
se o indivíduo participa ou não da determinação de sua vida e de sua sociedade,
e isso não apenas do ato formal de votar, porém em sua atividade diária, em seu
trabalho e em suas relações com outras pessoas”.[2]
Quando
tememos a própria liberdade não praticamos o exercício da participação;
revivemos as sensações de perigos constantes em todos os países capitalistas,
cujo poder do capital obriga os governantes a usarem, desde cedo o
totalitarismo ou a subordinarem-se aos interesses mesquinhos das elites
dominantes. Um golpe de Estado, na atualidade, nasce e se consuma com tamanha
facilidade que é de fazer inveja as ditaduras do passado. As ideias acostumam-se
a transportar o medo para o campo das ameaças, com ou sem fundamento. Quando
levadas a sério, as ameaças, causam efeitos danosos, quando não alcançam a
realização, para a nossa sorte, tornam-se fiascos. É disso que falaremos. Nos
Estados Unidos da América, os eleitores que votaram “sem medo” e venceram, recebendo
como prêmio a anistia pela anterior tentativa de golpe de Estado, aos poucos vão se dando conta que a força do
fôlego do dragão para soprar as chamas sobre os inimigos externos, não passa de
uma série de bravatas, mentiras e fiascos produzidos pelas big Techs e por um
presidente alucinado; por isso, as chamas que deveriam queimar à distância,
como o xixi do Tio San, não vão além do bico dos próprios sapatos. Daí o medo
de ter que arcar com as consequências pela escolha malfeita, é cada vez mais
crescente.
A
sinuosidade na escolha dos inimigos converteu o fiasco em escárnio, pois,
oscilou entre a guerra na Ucrânia, a dominação da Palestina; as anexações do
Canadá e da Groelândia; na elevação vergonhosa das taxas, tornando inviável a
importação de produtos chineses, dentre outras medidas as únicas duas que foram
vitoriosas se referem as deportações de alguns milhares de imigrantes ilegais e
a mudança de no do Canal do Panamá e, para completar redução, termina agora, no
início do mês de maio, conforme noticiam alguns jornais, com o envio de um
emissário ao Brasil, para estudar punições ao Ministro do Supremo Tribunal
Federal, Alexandre de Moraes. Ou seja, aquilo que parecia ser uma guerra
nuclear está acabando numa simples tentativa do impedimento de um ministro. O lado
positivo desse intento é a declaração de que o bolsonarismo já perdeu e, não tendo
força para livrar os golpistas da cadeia, recorre à truculência externa, juntando
o fiasco daqui com o de lá.
Os
fracassos das iniciativas punitivas na sede do império, tendem a bater com a
mesma velocidade nas portas dos gabinetes das autoridades que emitiram as
ordens, logo se ver-se-ão obrigados a entregarem os seus cargos. Ouviremos nos
próximos dias e meses os sons das ordens emitidas: “O governo dos Estados
Unidos da América, volta atrás”. De onde nos vem esta certeza? De dois
movimentos em ascensão. O primeiro movimento, está no que se costuma chamar de
“o resto do mundo”. As taxas de impostos elevadas além de irem contra todos os
princípios neoliberais, atacam todos os países de uma só vez que, ao invés de se
ajoelharem para pedir clemência, abandonam o barco da subserviência e buscam
outras articulações. A continuar assim, logo, logo, veremos a noiva sozinha
diante do bolo, todo esfarelado sem ânimo para contá-lo. Se todos os países estão
fazendo os seus arranjos comerciais, certamente também negociarão com outras
moedas e associarão os recursos em novos investimentos fora dos monopólios
tradicionais. O segundo movimento, diz respeito à situação interna da economia
e da população norte-americana; em um tempo em que a globalização, por meio da
ideologia neoliberal estabeleceu que as fronteiras dos países devem ficar abertas,
permitindo liberdade ao capital, fechar as portas, servirá para dificultar as
exportações dos próprios produtos.
Desse
segundo motivo, desprender-se-ão os respingos do fiasco que contribuirá para o
fortalecimento de pelo menos três reações: da economia, da política e das novas
articulações internacionais. Do ponto de vista econômico, apenas um exemplo, os
compradores de produtos externos, como é o caso da China que adquiria 52% da
produção de soja dos produtores norte americanos, como também 15% da carne
bovina e suína, com a inviabilidade dos impostos, buscará esses produtos em
outras fronteiras agrícolas, dentre elas o Brasil e, as consequências já
sabemos: mais devastação, mais concentração de terra e envenenamento ambiental.
No aspecto da política, o fiasco do Tio
San de assumir-se como extrema direita, empurrará as forças políticas dos
países para a posição de centro esquerda, dando um pouco mais de tempo às
democracias representativas que não são as ideais, mas bem melhores do que os
regimes totalitários puros. E, no aspecto das articulações internacionais, é
provável que nesses longos quatro anos de bravatas asquerosas ainda por virem,
os países de economias historicamente dependentes dos EUA, se soltarão e incorporarão
tecnologias bélicas e industriais de outras matrizes.
Portanto,
a reação positiva dos países diante das ameaças, ao invés de medo, transformou
os rompantes indigestos do presidente Trump em desastrosos fiascos, dando a
conhecer ao mundo que, um erro fatal de estratégia política nem sempre é
perdoado pela história. É evidente que esse fracasso não é mérito de um só
indivíduo. A decadência do capitalismo está atingindo por primeiro os países
tradicionalmente dominantes, por isso as economias emergentes, por serem as
mais leves e dinâmicas, se defendem com maior facilidade. Estamos claramente
diante da expressão da lei da dialética conhecida como “negação da negação” que
se manifesta pela concordância da ação e reação, ainda dentro da ordem
dominante.
A
nós não cabe adorar o medo. Mesmo com poucos avanços é preciso afirmar o desejo
de liberdade. Trancar as portas dos retrocessos e assumir a defesa do direito
às transformações sociais na linha socialista. Mas elas não virão de uma vez
só, é preciso agarrar as cordas que se soltam e se arrastam atrás da locomotiva
da história, como é o caso de não permitir a anistia aos golpistas; a defesa da
soberania nacional e a luta pelas reformas estruturais. Quem nada faz, não faz nada.
É preciso arriscar, investir e conclamar para que as desobediências parciais se
convertam em insurreição total e não em um fiasco.
Ademar
Bogo
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