domingo, 14 de janeiro de 2024

DECIDIR-SE PELA OFENSIVA


            Ninguém melhor que o revolucionário Mao Tse-Tung, explicitou o que significam as categorias “defensiva” e “ofensiva”. Para ele, a “defesa passiva” caracterizava-se como uma pseudodefesa. “Só a defesa ativa constitui uma verdadeira defesa, defesa com o fim de contra-atacar e passar à ofensiva”.[1]

            As duras críticas à concepção da “defensiva passiva”, elaboradas por Mao em 1936, na segunda fase da luta revolucionária chinesa, iniciada em 1924, levaram o Partido Comunista Chinês a ter de redefinir as táticas, principalmente porque a iminência da invasão japonesa, ocorrida em 1937 e logo em seguida, ter iniciado a Segunda Guerra Mundial (1939), era preciso partir para a ofensiva para sair da situação inofensiva do Exército Vermelho.

            Não vem ao caso discutir o longo texto: “Problemas estratégicos da guerra revolucionária na China”, exposto em cinco capítulos, interessa-nos aqui, tomar como referência as categorias postas como parâmetros, para que possamos observar a nossa situação histórica e combater alguns mitos produzidos pelo próprio comodismo das lideranças atuais.

            Há um consenso em todas as análises de conjuntura de que o capitalismo está em crise e que a classe trabalhadora e as massas populares estão paralisadas, caracterizando este processo como “refluxo”, termo mal-empregado para justificar o imobilismo das lutas.

            A falta de elaboração teórica sobre as concepções e posicionamento das forças leva ao comprometimento das poucas iniciativas de enfrentamento, isto porque, a única tática visível e abraçada por todas as forças, refere-se às disputas eleitorais. Não desprezemos tal esforço, imaginando que essa iniciativa não possa ser um dos pontos de enfrentamentos, mas, tomemos o processo eleitoral como referência de negação dos próprios argumentos expostos pela teoria do “refluxo”.

            O conteúdo da categoria da “defesa passiva”, exposto por Mao Tse-tung, revela que essa concepção direitista, se deve ao amedrontamento dos dirigentes diante do adversário, como se ele fosse um tigre exterminador; por isso, a única saída vista por eles, era defenderem-se, despistando-o sem atraí-lo para cercá-lo e aniquilá-lo.

            É esse amedrontamento que vem sendo usado para manter o pacifismo legalista, em toda a América Latina, em torno da ideia de que o “inimigo pode voltar”, por isso, segundo essa visão,  é preciso fortalecer as trancas dos palácios pois eles representam as moradas seguras para a sobrevivência das forças de esquerda. O “pacifismo defensivo”, instalou-se como uma enfermidade pandêmica nas consciências das lideranças partidárias em todo o continente. Trancadas no interior dessa tática, as massas são liberadas a saírem, cuidadosamente, apenas para os comícios e os festejos religiosos. Na maior parte do tempo ficam jogas à própria sorte ou alimentadas com as migalhas das políticas públicas.

            A crença de que ao derrotar o inimigo pelo voto e ter entregado a chave da governabilidade a uma pessoa de confiança dos setores progressistas pode-se respirar aliviados porque, por um tempo o “tigre” ficará distante e poderá inclusive ser perseguido por algum franco atirador do poder judiciário. Mal querem saber se esse agente irá atirar com munição de borracha para apenas afastar por algum tempo a fera faminta, das redondezas do poder, sem evitar que ela logo apareça ainda com maior simpatia.

            É importante refletir sobre essa posição, porque, se a tática da “defensiva passiva” faz bem aos setores mais abastados, principalmente porque ela ajuda a manter a ordem, significa que as organizações e os movimentos empenhados nessa implementação, colocam-se a serviço da classe dominante, enquanto esta dedica-se a engordar o tigre para que ele volte com saúde e vigor.

            Por que não há “refluxo” nas manifestações religiosas, nas festas carnavalescas, paradas de protestos temáticos, eventos musicais e, nas campanhas eleitorais? Evidentemente se pode apresentar muitas justificativas, principalmente se elas forem comparadas com as lutas. No entanto, não faz mal nenhum lembrar que são as relações materiais de sobrevivência que primeiramente movem as pessoas; se assim não entendermos deveremos passar a defender que, para a subsistência, cada indivíduo deve lutar por si mesmo, mas nos aspectos religiosos, festivos e comemorativos e eleitorais buscaremos as coletividades.

            O inverso a esse posicionamento pacifista ocorrerá se a categoria da “ofensiva” passar a permear o debate, as elaborações e as ações das massas populares. Aqui, poderíamos retomar todos os bordões postos como expressões teóricas, como este de Lenin escrito em seu livro “Que fazer?” de 1902, dando conta que: “Sem teoria revolucionária, não há movimento revolucionário”. Como também, podemos deduzir e fazer surgir outras, como: “Sem organização revolucionária não há lutas revolucionárias”; ou “Sem métodos revolucionários, não há práticas revolucionárias”; ou ainda, “Sem lideranças revolucionárias não há ações nem eventos revolucionários”.

            Sem cair no desvio do vanguardismo, devemos considerar que as ofensivas substituem o pacifismo quando as pessoas conscientes tomam a frente e apontam o caminho dos enfrentamentos. Quem eram e o que fizeram as duas dezenas de bolcheviques russos na cisão do partido no Congresso de 1903? E a iniciativa cubana? Com uma dezena de guerrilheiros deram o impulso para a grande revolução vitoriosa de 1 de janeiro de 1959. E na atualidade,  na Palestina com o Hamas? Estimam que possui cerca de 20 mil militantes, uma insignificância perante o poderio militar de Israel, Estados Unidos da América e Europa que os ataca.

            Diante disso, a nossa posição é de que não devemos copiar formas de lutas nem do passado e nem do presente; cada povo tem a liberdade de criar os meios e tomar as iniciativas mais acertadas para enfrentar os seus inimigos. No entanto, a prática de outros povos alerta e, principalmente, ensina a considerar que a “defensiva passiva” não é o caminho mais correto, quando os inimigos, temporariamente perdem apenas os cargos e não o poder.

            Podemos concluir que, se há “refluxo” não é poque as massas não querem lutar, mas, certamente porque não sabem contra quem devem lutar! A lenda do biombo da democracia representativa que protege do tigre faminto os defensores da “defensiva passiva”, é a maior mentira contada pela direita para a esquerda. Na hora que ele for derrubado, atrás estarão os teóricos e intelectuais brancos; os políticos obedientes e os setores que conseguem pagar pelos direitos que os pobres reivindicam sem sucesso da Constituição.

            Sem ofensiva contra o capital e o Estado, não há política revolucionária, é importante decidir-se logo antes que o tigre volte atacar as urnas.

                                                                                                     Ademar Bogo



[1] Mao Tse-tung. A defensiva estratégica. T.1. Pequim: Edições do Povo, 1975.

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