domingo, 27 de agosto de 2023

MAIS POLÍTICA PARA A POLÍTICA


            Na atualidade há duas forças que concebem as em ideias em circulação e procuram matar a força da dialética, como se a linearidade dos processos se ancorasse na oposição dos “altos e baixos” e não nas contradições e nos choques entre os contrários. A primeira posição antidialética, procura apresentar a realidade com uma visão contrária à política e, investe grande parte do tempo na doutrinação religiosa; nas ações sociais e nos movimentos corporativos reivindicatórios.  A segunda, um pouco mais consciente das coisas, mas não menos colaborativa, é mais pragmática e se atém ao fortalecimento e ao engrandecimento do referencial favorável como: situação sobre oposição, formando maiorias representativas contra as minorias importunantes. Investem na conciliação contra o conflito e na cooptação para obterem vantagens na correlação de forças.

            Aparentemente, para todos, o capitalismo passou apenas a ter alguns desiquilíbrios gerados por causa dos setores mais afoitos desrespeitarem as convenções. Por isso veem que as contradições não estariam nos princípios perversos e destrutivos do capital. Para ambas as visões, bastaria entrar em acordo e colocar certos freios para diminuir a velocidade das forças “ruins”, enquanto as forças “boas” realizam os investimentos financeiros em favor do progresso sem fim.

            Pouco ou quase nada se estuda sobre o conteúdo das contradições. A crítica à economia política feita no passado parece ter se tornado inválida e, agora a única preocupação seria com o excesso de cuidados com a inflação, cerceada com as altas taxas de juros. Se isso se resolvesse, os custos dos empréstimos diminuiriam e o país se tornaria um único canteiro de obras; estas gerariam empregos, o Estado recolheria mais impostos e tudo fluiria na mais perfeita paz.

            Karl Marx em 1847 ao escrever contra a “Metafísica da economia política” de Proudhon, cujo texto todo passou a se chamar: “Miséria da filosofia”, quis mostrar que as forças colocavam as ideias na frente da realidade, como se a verdade estivesse na cabeça e não nas circunstâncias históricas. Chamou atenção: “Dia após dia, torna-se assim mais claro que as relações de produção nas quais a burguesia se move não têm um caráter uno, simples, mas um caráter dúplice; que nas mesmas relações em que se produz a riqueza, também se produz a miséria...”.[1] Isso não é apenas uma contestação contra a ingenuidade de achar que o capital, por encontrar menor resistência pela frente, facilitaria também os ganhos dos trabalhadores, empregando todas forças e pagando a elas o salário mais digno possível, mas um alerta para entendermos o real movimento do capital.

            É a riqueza que engendra a miséria, portanto, o aumente de ambas é uma interdependência real. O princípio é simples: se distribuírem não poderão acumular. Nesse sentido, a política quando se descaracteriza como força crítica, perde o seu caráter conflitivo e passa, sem deixar de ser política, a confundir-se com assistencialismo, caridade e conciliação. O próprio Marx irá concluir o seu texto dizendo que: “Não diga que o movimento social exclui o movimento político. Não há, jamais, movimento político que não seja, ao mesmo tempo social”.[2]

            O esforço separatista que fazem as religiões e os movimentos populares em considerarem-se “apolíticos”, respeita o princípio condenatório de delegar aos representantes de todas as classes, o poder de ignorá-los ou investigá-los com Comissões Parlamentares, quando julgam conveniente utilizá-los de um ou outro modo no jogo político. Não importa se um eleitor vota a favor de um, tendo em mente que é contra outro candidato, mas sim que o mesmo pleito legitima todos os que irão assumir os mandatos como “representantes do povo.”

            É assombroso o rebaixamento do nível das ideias no meio partidário e social que, por perderem a referência das contradições, atem-se aos mesmos temas como se política seguisse o receituário das notícias pautadas pela mídia. O resultado é o esvaimento das forças possuidoras de um passado de lutas, que, respeitosamente, ao invés de expressarem palavras conflitivas, antagônicas, acabam verbalizando a “política da natureza”, com expressões agroecológicas, produtos orgânicos e recuperação das florestas. Enquanto isso, a barbárie avança, carcomendo o resto de organização e mobilização social colocadas na direção da luta de classes.

            Um movimento social não precisa ser um partido, basta que se assuma como organizador da “parte consciente” da sociedade e monte um programa para enfrentar as contradições do capitalismo. Parece ter se tornado mais cômodo, entregar as responsabilidades políticas para os profissionais da democracia representativa e somar-se a eles oferecendo militantes e apoio para compor o teatro da submissão ao estado de direito.

            Se no passado os estudos voltaram-se para fazer a crítica da economia política, do Estado e dos ordenamentos jurídicos e, portanto, essas críticas estão feitas e continuam válidas, agora, é a hora de criticarmos os comportamentos, o atrelamento aos partidos ordeiros, as linhas políticas produtivistas e a volta ao naturalismo. Não será com galhos de árvores jogados no caminho, que a frota dos capitalistas, cada vez mais modernizada deixará de avançar.

                                                                                   Ademar Bogo



[1] MARX, Karl. Miséria da filosofia: São Paulo: Expressão popular, 2009, p. 139

[2] Idem. p. 192.

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