domingo, 16 de outubro de 2022

CONTRADIÇÕES REBAIXADAS

 

            Todo ano o mês de outubro sempre chega trazendo e revivendo as suas marcas históricas. Na política, destaca-se Ernesto Che Guevara e a lembrança de que, é preciso investir na formação do “homem novo”. Na religião destaca-se o dia da padroeira Aparecida, motivadora da unidade nacional, do respeito às mulheres, do combate ao racismo e, acima de tudo, nos ensina a praticar da tolerância. Ainda temos a exaltação das crianças e a homenagem aos professores e professoras responsáveis pela escolarização de todos. De um outro modo, no mesmo mês, a cada dois anos surge o embate político das disputas eleitorais.

            Essas referências concentradas criam diferentes reações, protestos, festejos e comemorações. No entanto, a política e a educação resguardam as mais intensas emoções. Nas mensagens que vão e que vêm destacam-se as ideias conscientizadoras ou o seu contrário. Paulo Freire é o preferido. Em seu livro “Pedagogia do oprimido” publicado nos primeiros anos da instalação da malfada ditadura militar no Brasil, destacou que: “(...) o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com a educação que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os argumentos de “autoridade“ já não valem(...)”. Esse processo inicia com as crianças antes mesmo de se porem em pé, quando são levados para as creches e círculos infantis. Depois avançam nos próximo períodos e chegam, não todos, à diplomação universitária.

                Deveria ser assim também na política. O político deveria ser também um educador e educar-se enquanto exerce a sua função.  No entanto, essas relações de profundo respeito ou desrespeito, formam aprendizados com diferentes formas e conteúdos; principalmente quando a antipolítica, com seu faro mofo, busca restringir a universalidade educativa para os cubículos estreitos da moral conservadora, de interesse mesquinho e ideologia perseguidora dos oponentes.

                Para verificarmos isso, basta tomarmos o tema da discussão da sexualidade nas escolas. É um assunto separado, deixado e intocado também nas religiões. Afasta-se a criança do entendimento sobre o seu próprio corpo, como se afasta o corpo da proximidade do fogo. Não se fala de sexualidade como não se brinca com fogo. Sigmund Freud em 1905 ao escrever os “Três ensaios sobre a sexualidade”, entrou profundamente no tema da sexualidade infantil e revelou que, popularmente acredita-se que a pulsão sexual está ausente na infância e só aparece no período da puberdade. E dirá que este é um equívoco causador de graves consequências. Então nos mostra  que, “Ao mesmo tempo em que a vida sexual da criança chega a sua primeira florescência, entre os três e os cinco anos, também se inicia nela a atividade que se inscreve na pulsão de saber ou de investigar”. Quem a impede que investigue? Os moralizadores tementes aos próprios medos, recalques e complexos. O que ganham com isso? Uma juventude com desajustes na formação individual que ignora o funcionamento dos próprios sistemas físicos e mentais.

                A política é tão preciosa quanto é a educação. Ela deveria preservar os ouvidos das crianças evitando que ofensas, palavrões, calúnias, mentiras e todos os tipos de agressões fossem expostas nos programas eleitorais. O cristão que vai à Igreja e em casa vigia as crianças para que não acessem temas pornográficos na internet e segue à risca as orientações de impedir que os filhos assistam programas impróprios para as suas idades, não tiram as mesmas da sala quando o programa eleitoral de seu candidato é exibido no horário nobre. Se as crianças nas escolas praticassem o que dizem e fazem os políticos e muitos agentes públicos, transformariam as escolas em redutos do crime organizado.

               Em tudo isso, importante é compreender que a educação é fundamental para que uma sociedade se desenvolva; por isso a exigência para termos boas escolas, juntamente com a valorização dos professores e professoras. Mas não se educa para viver apenas dentro da escola.

                Na medida em que fora da escola praticam-se formas educativas desajustadas e se reproduzem conhecimentos, na política, nas igrejas, no mercado etc., avessos  à verdadeira libertação, a escola será vista como um aparelho a ser direcionado para satisfazer os interesses do consumo e da domesticação moral.

                Em tempo de campanha eleitoral, um candidato que promete investir em educação e na fala seguinte, ao invés de demonstrar como ele próprio é educado, desanda a destratar, ofender, criminalizar, rebaixar etc. os seus oponentes, no intuito de acirrar ainda mais o ódio já disseminado, não pode estar falando sério.

                Evidentemente, acreditamos que em todas as relações existem contradições, mas da forma como estamos vendo, o conteúdo das campanhas eleitorais, fez do rebaixamento um dicionário de palavras ruins que servem apenas para demonstrar que estamos vivendo uma profunda crise da civilização.

                Precisamos retomar os princípios da civilidade e fazer com que a linha de conduta siga os interesses do Bem comum. Enquanto o político xinga e a população aplaude estaremos sempre mais próximos de acreditarmos que a ignorância é de fato o nosso destino. A prática do “bateu levou”,  é o sinal de que, se não somos, parecemos ser todos iguais.

                Uma população eleva o seu nível de consciência se na convivência social escuta e expressa palavras que formam a consciência. Tal qual como ocorre com a criança que ao nascer e encontra o sistema linguístico pronto e precisa aprendê-lo para se comunicar, ocorrerá com as futuras gerações que deverão governar o país. Se aprendem com os políticos que politica se faz com baixarias, rebaixam-se e verão as contradições apenas no nível das ofensas.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      Ademar Bogo

Nenhum comentário:

Postar um comentário