domingo, 12 de julho de 2020

NOVAS FORÇAS E NOVAS POSIÇÕES



            Há épocas em que as circunstâncias históricas entrelaçam-se entre si e promovem enormes decadências. Uma espécie de desarrumação desorganiza o costumeiro e, as pessoas e as forças sociais são jogadas para fora da rotina. Essas situações aparentemente aconteciam em períodos de guerras mundiais, principalmente, quando todas as populações temiam a morte ou convocações para participarem ativamente das matanças. São épocas, portanto, que o futuro fica suspenso e o máximo que as pessoas almejam, é apenas continuarem vivas.
            A imensa maioria dos habitantes da terra nasceu depois da Segunda Guerra Mundial que levou à morte cerca de 80 milhões de pessoas. Na época, a população mundial era de 2,3 bilhões de habitantes que tiveram de retirar debaixo das ruínas as esperanças da reconstrução.
            A pandemia que ora vivemos assemelha-se a uma grande guerra, nos aspectos do temor e do sofrimento, embora ainda não saibamos qual será o tempo de sua duração e quantas vítimas fará. E, por mais que vivamos no mesmo modo de produção capitalista, as condições econômicas, sociais, políticas, morais e culturais, são profundamente piores, por isso prevemos que as esperanças estão ainda mais profundas e em muitos casos, mutiladas debaixo dos escombros.
            No término Segunda Guerra mundial, as potencias econômicas do mundo, Estados Unidos, União Soviética, Inglaterra e França, para citar apenas as principais, tinham respostas a dar para alguns dilemas da civilização. Do lado dos trabalhadores, a perspectiva sindical apontava para a busca de mais direitos e, mesmo que dentro do modelo hegemônico de Bem-Estar-Social, contemplavam-se os anseios de melhorias de vida. Se quisermos olhar também pela organização partidária, os partidos comunistas, embora submissos à Terceira Associação Internacional nos países da América Latina, tinham em torno de duas décadas de fundação e, do ponto de vista estratégico, todos defendiam, mesmo com equívocos táticos, a revolução e o socialismo.
            O tempo presente é o “avesso do avesso”. Se do ponto de vista do capital não há perspectiva de respostas, as economias das potências mundiais em queda amedrontam aqueles que sempre tiveram em mente o progresso sem fim. Os estrategistas do capital, o máximo que conseguem prever de crescimento médio nos próximos 40 anos é de 2% ao ano. Isso mostra que um país como o Brasil, cujo PIB cairá, se as análises se confirmam, a 11 ou 12%, levaremos 6 anos para colocar o país no degrau que estava no início da pandemia, que tinha 13 milhões de desempregados.
            É importante perceber que a decadência econômica sustenta as demais decadências que atropelam os sinalizadores que antes alertavam a civilização para cuidar-se da barbárie. Se observarmos os aspectos educacionais em todos os níveis escolares, não se tem uma porcentagem a ser estabelecida para medir o retrocesso, como se faz com o Produto Interno Bruto – PIB – mas, temos a nítida impressão de que não conseguiremos, no Brasil, reparar as perdas, quiçá por diversas décadas. E isso se deve mais à falta de condições e o estado de desprezo que se encontra a educação, do que pelos meses de paralisação devido o Covid-19.
            Quando nos voltamos para a política, vemos que o seu déficit é ainda maior que a depressão econômica. Se do lado da estrutura governamental a História pontua que jamais existiu na República uma relação tão estreita entre a ignorância e a perversão coletiva, do lado das forças de oposição jamais se registrou tanto cansaço e inoperância política.   
            Na Psicanálise estudamos que a “perversão” está vinculada as “pulsões sexuais” incluindo aquelas que estão no âmbito do “sadismo-destrutivo”, no típico modo de ser do indivíduo com “personalidade cindida” que, por um lado finge cumprir com o dever e, por outro, extravasa todos os tipos de tendências que impõem castigo aos desafetos. Podemos citar, para ficar apenas em alguns, o descaso com a progressão das mortes causadas pelo coronavírus; o genocídio dos índios; o incentivo à devastação das florestas e o teatro em torno do uso da Cloroquina.
            As circunstâncias pioram ainda mais, se observarmos no tempo histórico o posicionamento das forças de oposição. A decadência da honradez política é tão grande que o próprio conceito é atrelado à forma partidária que se tornou desprezível à ótica popular. O desprezo e a inutilidade dos partidos políticos é tão expressivo que, há décadas vinha demonstrando que, após as eleições, o “partido do presidente”, não opinava na montagem e no controle do governo e, na atualidade, o próprio presidente está sem partido e parece não sentir falta alguma.
            Quando, em Agosto de 1917 pouco antes da Revolução na Rússia Lenin escreveu o artigo, “A propósito das palavras de ordem” revelou que, para cada momento era preciso ter uma que resumisse o programa e unificasse todas as forças em torno dela. Por isso, a palavra de ordem “Todo poder aos Soviets”, que no mês de Fevereiro do mesmo ano fazia pouco sentido, naquele momento era fundamental a sua afirmação. Por quê? Para Lenin era fundamental olhar para frente e não para trás. Mas, acima de tudo, precisavam operar com novas forças e “não com as velhas categorias e partidos”.   
            Esse chamamento indica alguma coisa para o encontro com a saída da pandemia. Em primeiro lugar é preciso prestar atenção nas novas forças que poderão surgir e a elas creditar a responsabilidade de formular a palavra de ordem que supere as melosas palavras oportunistas que não vão além do interesse eleitoral, gritadas por gargantas roucas, envelhecidas sem disposição de mudar o tom, nem de indicar o caminho da ruptura. Essa posição, contribui para o aprofundamento da barbárie social e não o contrário.
            As circunstâncias estão ruins para nós e para eles. A vantagem é que nós podemos mudar, eles não.
                                                                                                         
                                                                                                    Ademar Bogo


              


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