domingo, 26 de janeiro de 2020

A IDEOLOGIA ALEMÃ


            Quando Marx e Engels polemizaram com Bruno Bauer, Feuerbach e Max Stirner, enfrentaram pensadores bastante qualificados, com os quais haviam formado o mesmo grupo dos “jovens hegelianos”, mas, devido aos desacordos nas ideias foram obrigados a contestá-los rigorosamente com diversas elaborações.
            Se as polêmicas mais duras travadas com Bauer se deram em torno da emancipação política dos judeus, cujo autor defendia que eles antes deveriam abandonar a religião, porque, para que houvesse de fato a emancipação, o Estado deveria ser laico. Bauer via que, sem as demandas religiosas o Estado poderia atender as demais reinvindicações e garantir os diversos direitos sociais e políticos. Para Marx, esse discurso ideológico era um disfarce, pois, para os capitalistas alemães, pouco importava se os judeus seguiam ou não uma religião. Na vida social, as contradições eram materiais e não espirituais. Precisavam sim de enfrentar o Estado e a classe dominante para extinguirem todas as mediações que impediam os judeus de serem livres e iguais.
            Por outro lado, ao discutirem as ideias de Feuerbach no sentido histórico, ironicamente Marx e Engels consideraram que não valeria a pena explicar para aquele e outros filósofos, que eles não haviam feito avançar um único passo a libertação do “homem”, ao terem reduzido a filosofia e a teologia a um monte de lixo. Também não gastariam tempo explicando que somente seria possível conquistar a libertação real, no mundo real, com o emprego de meios reais, porque, certamente não entenderiam que não seria possível libertar os homens enquanto eles fossem incapazes de obterem a própria alimentação, a bebida, a habitação e a vestimenta em quantidade e qualidade adequadas.Além disso, a libertação deveria ser vista como um ato histórico e não como um ato de pensamento e, ainda mais, condicionada por condições históricas criadas pela indústria, comércio, agricultura e outros intercâmbios materiais.
            Sobre Stirner, chamado de São Max, que havia escrito o livro, “O único e sua propriedade”, Marx o criticou porque queria fundar uma causa sobre o nada e, por meio de lamúrias expressava o “brado crítico”, repetindo sempre que “tudo há de ser sua causa” e que a “causa de Deus, a causa da humanidade, da verdade, da liberdade e outras mil causas acabavam caindo sobre os seus ombros.
            Marx fez a seguinte descrição sobre o texto de Stirner: Ele investiga a “causa de Deus”, “a causa da humanidade” e conclui que são “causas egoístas”, isto porque, tanto Deus quanto a humanidade só se preocupavam com o que era deles e se encontravam em situação sempre favorável. No entanto, Stirner se perguntava: “e eu?”, e logo dava a resposta: “Eu, de minha parte, tiro disso uma lição e prefiro, em vez de continuar a servir a esses grandes egoístas, ser Eu mesmo o egoísta”. A verdadeira conversão então, se daria as avessas, iria em direção ao egoísmo e entraria em competição com “Deus” e com “a verdade”, porque queria Stirner criar a sua própria verdade.
            Marx e Engels perceberam que aquelas ideias deturpavam a verdadeira análise da realidade e por isso as denominaram de “ideologia”, para que elas não ganhassem força na mente dos judeus e trabalhadores alemães, atacaram-nas com veemência, demonstrando que elas serviam à classe dominante que precisa em cada época, controlar também as ideias que manipulam as consciências pelo mundo afora.   
           
            No Brasil, se “a ideologia alemã”, por meio das ideias de Bauer, Feuerbach e de Stirner, não ofereceram grandes perigos, o mesmo não podemos dizer da outra surgida quase um século depois, conhecida como “Nazismo” e que agora vem-nos a perturbar. A ideologia nazista, nascida na Alemanha por volta do ano de 1924, quando surgiu o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, que tinha, além de Adolfo Hitler como líder maior, o propagandista das ideias escusas, o ministro da propaganda que atuou por mais de doze anos, conhecido pelo nome de Joseph Goebbels.
            No nome do partido “Nacional Socialista” estava presente a enganação das ideias nazistas, isto porque ao invés de ser uma força socialista era uma organização paramilitar de perseguição ao “diferente”. Na verdade, era um movimento de extrema direita que visava segregar parcelas da população em busca de criar uma “raça superior”, para tanto precisou criar uma ideologia e propagandeá-la para justificar o extermínio dos judeus, dos ciganos, deficientes físicos e mentais, negros e todos os adversários políticos, principalmente aqueles que defendessem as ideias marxistas.
            Esse partido foi sufocado em 1945 com o final da Segunda Guerra Mundial, mas as ideias permaneceram e, seguidamente reaparecem, tanto na base social quanto nas fileiras governamentais, como é o caso do Brasil na atualidade.
            O sinal de que “a ideologia alemã”, travestida de Nazismo, na atualidade, não deve apenas ser identificada nas palavras expressas pelas autoridades, como fez o Secretário da Cultura demitido recentemente, quando organizou uma cerimônia com as características e as simbologias utilizadas por Goebbels, no intuito de “nazificar” a cultura brasileira. Há outros elementos que combinam com o nazismo, mas como eles são apresentados envolto pela ideologia nazista, as verdadeiras intenções ficam disfarçadas.
            A primeira semelhança está na mentira. “Uma mentira contada mil vezes, transforma-se em uma verdade”, defendia Goebbels. Essas mentiras são de todos conhecidas. Elas vão desde a manipulação dos dados estatísticos para dizer que a economia está crescendo, à defesa à indissolubilidade da família, que, a começar pelo presidente e a próxima secretária de cultura, são especialista no assunto de desfazer as próprias famílias por diversas vezes.
            Em seguida podemos comparar os campos de extermínio da Alemanha Nazista que, com tecnologia e força repressiva especializada, milhões de pessoas (na maioria judias), foram mortas. Em nossos dias, os germes dos campos de extermínio são os presídios e, as forças especializadas são a milícias paramilitares que agem em conivência com o poder político. De outro modo, avança-se para oficializar as matanças por meio da aprovação de leis que isentam de culpa os policiais, quando eles alegarem “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.
            A censura e o corte de verbas de incentivo à produção à cultura, o fechamento da Agencia de Cinema (ANCINE), o desmantelamento do sistema de educação em nome da “purificação das ideias”, que acreditam terem sido esquerdizadas pelo pensamento do professor Paulo Freire, são outras formas de proliferação da ideologia nazista. Por outro lado, a pregação de que precisam “combater as ideologias” como se eles não fossem os seus maiores propagadores, é de fato a mentira contada milhares de vezes.
            Poderíamos seguir enumerando, situações em que as mentiras repetidamente comunicadas visam ganhar o status de verdade, mas interessa é percebermos que “A ideologia alemã”, agora com o nome de “nazismo”, continua viva entre nós e, as mesmas perseguições que sofreram Marx e Engels, os judeus, os negros, homossexuais e outros, se repetem com um público cada vez mais ampliado.
            Os motivos do renascimento dos fantasmas ideológicos que, de tempos em tempos aparecem com outras faces, inovando a trindade asquerosa, composta agora por Trump, que nega o aquecimento global; Bannon, o novo Goebbels da propagação da mentira e, Carvalho, que prega o achatamento da terra, deve-se à crise do capitalismo e a falta de alternativas para manter a reprodução do capital. São tempos em que se tornam propícios os surgimentos de tais excrescências como pestes repentinas inventadas por combinações de carências e interesses escusos.
            Como fizeram Marx e Engels ao enfrentarem a ideologia alemã, é tarefa da militância, nos tempos atuais, fazer o mesmo e combater as mentiras com o esclarecimento das verdadeiras intenções que se escondem nas dobras das informações produzidas pelos servidores da segregação, do ódio e da perseguição às forças que visam sobreviver para superar o capitalismo.
É a ideologia nazista e imperialista atualizada, pelos lemas: “Deus acima de todos” mesmo que desiguais; a família em primeiro lugar, mesmo que ela já não se identifique como tal; o Estado laico, com a presença da religião como base partidária; a segurança pública com o armamento privado; a educação profissional quando não há mercado para os profissionais que se formam; etc., que precisa ser contradita e combatida diariamente. Não existe luta política sem a disputa das ideias e, não existem ideias fortes, sem existirem causas fortes.

                                                                                                                     Ademar Bogo

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