quinta-feira, 10 de março de 2016

A VERSALHES BRASILEIRA



            Diante das investidas raivosas de setores da classe dominante, tendo a seu serviço os instrumentos jurídicos, a Polícia Federal, o Congresso nacional, a mídia etc., para além de uma reação de autodefesa das forças populares, é importante compreender a natureza da burguesia, isto porque, a classe capitalista, em termos de essência, é o que foi em todos os tempos.
            O que defende a classe dominante? Nada mais que o conjunto das leis. Primeiramente as leis econômicas, aquelas reveladas por Karl Marx que estão na extração da mais-valia; a lei da valorização do valor, portanto, do livre mercado; a reprodução do capital tendo como base as altas taxas de lucro e de juros; a centralização da renda e da riqueza; a concentração da terra e da renda advinda dela; o superfaturamento dos contratos etc.
            Paralelamente a essas leis econômicas, funcionam também as leis jurídicas do Estado, feitas para dar garantias aos investidores, especulares e agiotas que manejam a propriedade privada dos meios de produção; as empresas de serviço; os Bancos; os meios de comunicação etc. As leis não estão imunes aos interesses de classe e, de acordo com esses interesses são aprovadas, emendadas, revogadas ou substituídas.
            A íntima relação que há entre o capital e o Estado, é de fácil compreensão, se entendermos que se trata apenas da combinação entre formas. O Estado que ora conhecemos e nos sentimos impotentes diante dele, pelo simples fato de um juiz poder determinar que a polícia possa colocar aparelho de escuta na casa de qualquer pessoa, obrigá-la a ir prestar depoimento a qualquer hora e ficar presa, sem provas, se assim o desejar aquela autoridade, surgiu com o capitalismo. Logo, se o capital se reproduz a partir das formas econômicas, o Estado se estrutura a partir das formas política e jurídica. Juntando as diferentes formas temos um sistema de dominação e, por isso, quem é apenas dono da força de trabalho, é coagido e ameaçado pelas formas econômicas, políticas, jurídicas e ideológicas.
            Há períodos em que a classe burguesa, aparentemente, comporta-se com tolerância, cordialidade e parcimônia. São os períodos em que as coisas funcionam bem para os seus interesses. Finge-se de aliada e prestativa. No entanto, quando sente que os seus interesses estão ameaçados e terá de diminuir os seus ganhos, expõe a sua natureza sanguinária e vingativa, comporta-se como um crocodilo faminto que come o próprio tratador.
            Dito isto, o que temos a ver com a Versalhes francesa? Muita coisa. Quando em 18 de Março de 1871, Paris foi acordada com os gritos de: “Viva a Comuna!”, a burguesia fugiu e se aquartelou na cidade de Versalhes, a 30 km de Paris. De lá retornou em 18 de Maio do mesmo ano, produzindo a maior carnificina que se viu na história; retomou Paris, deixando de saldo cerca de 20 mil trabalhadores. Isso fez Marx afirmar que, se algum erro se poderia atribuir à Comuna “foi o de não ter avançado logo sobre Versalhes”.
            Aqui estamos nós, após 12 anos de governo sob a eminência de vermos a governabilidade destruída, com dezenas de lideranças presas e todas as conquistas incendiadas pelo ódio burguês. E onde está o erro? Não termos avançado logo, quando tínhamos força e popularidade, sobre a exploração da mais-valia; da propriedade privada dos meios de produção; das taxas de lucro e de juros; da mídia financiada com dinheiro público; da Constituição carente de mudanças e da opção pelas não reformas estruturais. Agora, o que resta é reagir, primeiro, formulando um projeto para elevar o conteúdo da disputa e juntar as forças para avançar sobre as formas de poder da burguesia, impedindo que ela jamais retorne.
Que em 18 de Março, 145 anos depois, possamos gritar: Viva a Comuna! A vez da verdadeira reação chegou.                                                          Ademar Bogo, filósofo e escritor

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