O termo emergência, na Filosofia, costumamos usá-lo para designar quando um fenômeno forma-se a partir de outro fenômeno. No sentido corriqueiro é o movimento de fazer surgir das águas alguma coisa que estava submersa. No primeiro sentido temos a possibilidade de observar e direcionar a análise e, também os resultados do fenômeno que surge, na segunda, a lógica faz considerar aquilo que é direcionando os efeitos previsíveis.
O Filósofo grego Epicuro, que morreu em 270 a.C
descobrira que “tudo o que acontece no mundo deve-se às ações e as interações
mecânicas dos átomos”. Esse entendimento direcionado aos átomos pode ter levado
a uma compreensão bastante estreita porque, no fundo, para o filósofo, todas as
coisas, inclusive os deuses eram compostos de átomos, mas, o mais importante
foi que ele nos alertou de que há um movimento que faz as coisas interagirem,
chocarem-se ou aliarem-se.
O raciocínio fica ainda mais integrante quando nos damos
conta que as ações e interações quando vamos para a política. O movimento dos
corpos compostos de átomos que gere a mesma é bastante confuso. As razões para
essas confusões podem ser encontradas nos interesses, nas vontades e desejos
dos indivíduos que manejam os encontros e os desencontros reais. A pergunta que
tentaremos responder é: se os corpos que dão forma ao sujeito estruturam e
conduzem a política, foram, são e serão compostos por átomos quem os dota de
vontade e desejos para se colocarem em certas posições em cada época?
Se “uma longa marcha começa com o primeiro passo”, diz o
provérbio chinês, tudo depende da escolha e do lado para onde a marcha deve ir,
mas, principalmente, por que e o que se quer encontrar no final? Aliás, a definição
do objetivo e a escolha do percurso já definem para onde e com quem a marcha
será feita.
Para ilustrar ainda mais este preâmbulo, o pensador
humanista holandês, Erasmo de Roterdã (1467-1536), nascido e morrido no
Renascimento, bem antes da Revolução Industrial, mas que já indicava o seu
surgimento optou, propôs que, invés de combater as forças conservadoras que se
colocavam contra os avanços científicos, artísticos, literários etc., deveriam
incluir na política, o ideal moral que visava antes converter os príncipes para
que praticassem os ideais cristãos e, dessa forma eles fariam com que reinasse
a paz e a harmonia. Numa clara afronta ao italiano a Maquiavel, falecido em
1527 que havia proposto em “O príncipe” a
separação entre religião e política, Erasmo expôs em seu escrito, “A instituição do príncipe cristão”, as
ideias que, aparentemente, constituíam um programa com diversas medidas, dentre
elas constava: “Mobilizar todas as forças morais em favor da paz”.
Com essas referências podemos recolocar os parâmetros e
observarmos o movimento dos átomos e dos seus interesses e desejos na política
atual, isto porque, num momento em que se deve pensar mais profundamente como
colocar as forças para iniciar uma longa marcha de superação de todas as causas
estruturais que sustentam a decadência do capitalismo, o que vemos são os
velhos corpos emergirem das águas da política, trazendo consigo as marcas que
possuíam antes do naufrágio.
Todos os esforços empregados nos últimos tempos voltam-se
para convencer o “príncipe Kyros” (Ciro) que na etimologia grega significa,
“aquele que tem autoridade”. Em nosso caso, a “autoridade” de convencer
parcelas das forças da direita para fazer emergir a aliança editada em 2002 com
um vice de linhagem burguesa. Por essa razão é que, ressurgindo os mesmos
átomos, ressurgem as mesmas expectativas, vontades e desejos e, o primeiro
passo, para a realização da “longa marcha” fica suspenso, porque, a ocupação do
tempo em assistir a emergência dos restos naufragados, sintetiza o conteúdo da
alienação.
Sem muito mais explicações, devemos compreender que há,
pelo menos, duas possibilidades de emergências importantes, e elas poderão até
acontecer ao mesmo tempo como acontece com o movimento de todas as coisas, são
elas: a emergência do naufrágio político e a emergência do fenômeno político. No
entanto, só o segundo pode desencadear a longa marcha. O primeiro, como a
emergência de um corpo das águas, “morre na praia”
A emergência fenomênica nos diz que de um fenômeno surge
outro. É a lei do movimento das contradições que inovam e reorientam os
processos. Do naufrágio só pode emergir o velho, o anterior, o conservador e o
desejo de somar-se à ordem do sistema democrático assistencialista que como
Erasmo, os seus defensores sonham “humanizá-lo”.
A emergência do fenômeno se dá pela reação, nuca pela
conciliação, isto porque, o fenômeno antagônico causador da emergência precisa
ser superado. Mas este fenômeno não pode ser visto nem projetado por forças
apáticas. E elas não sairão dessa condição enquanto forem atraídas para a beira
do lago para apreciarem a emergência dos corpos naufragados puxados pelo mesmo
guindaste do processo eleitoral. Certamente, como Erasmo, fracassando mais uma
vez, porque, quando algo emerge de um naufrágio traz consigo resquícios de lama
e defeitos morais graves.
Por fim, a emergência também pode significar pressa. O
estado de decadência da civilização é tão caótico que, para interrompê-lo, não
basta torcer que candidatos um pouco menos pior no Estados Unidos da América ou
no Brasil sejam eleitos. A democracia eleitoral não pode mais ser o parâmetro para
medir se um Estado é totalitário ou não. O momento pede inovações e não
emergência de destroços.
Ademar
Bogo
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