A política nas últimas décadas tem se tornado um espaço
privilegiado para exercitar opiniões. As teorias não são mais formuladas em programas
e manifestos, nem produzidas sobre temas, como fizeram os clássicos das
revoluções que, após algum tempo, publicaram e tornaram “obras completas” escritas
em dezenas de volumes. Pouco já se escreve sobre as contradições fundamentais e
os aspectos fundamentais das contradições. Os textos seguem a ordem dos
discursos formulados espontaneamente, baseados, não no movimento dialético das
forças oponentes, mas na possibilidade de ganhar ou perder apoio. A rede social
exige o cuidado com imagem e não com o intelecto.
Os projetos de poder assumidos pelas permanentes vanguardas
institucionalizadas, formadas por parlamentares eleitos que desejam eternamente
serem reeleitos e, por isso, são forçados pelas circunstâncias a deixar de lado
a divisão presente na sociedade de classes. Nos países capitalistas, essas
forças conduzem os processos desconsiderando as contradições e, enfeitiçados pelo
convite à governabilidade e, em nome da democracia, tentam enfeitiçar as massas
para que sejam tolerantes. Marx e Engels apontaram no Manifesto Comunista que: “O
sistema burguês de produção, de troca e de propriedade da sociedade moderna
lembra um feiticeiro que já não consegue controlar os seus poderes infernais
desencadeados por suas palavras mágicas.”[1]
Por outro lado, os governantes progressistas, confirmados
pelos pelitos eleitorais, nos regimes democráticos representativos, arrastam
atrás de si dezenas de organizações e movimentos sociais, enfeitiçando-os com
os brilhos e unções de seus representantes com cargos e recursos financeiros.
Os que ficam de fora, por excesso de tolerância enfraquecem-se e tornam-se
incapazes de marcarem posições significativas. Por sua vez “os feiticeiros” parecem
esquecer que os mandatos possuem prazo determinado para iniciar e terminar; evidentemente que contam sempre com a recondução.
As
eleições por sua vez, não eliminam os interesses das partes envolvidas, tanto
assim que a condução da governança terá pela frente, a força da oposição,
ultimamente com força de massa mobilizada. No entanto, se Marx se deu conta o sistema
burguês e certamente quem governa é um “feiticeiro”, que já não controla os
seus próprios poderes (não importa se é de direita ou de esquerda) precisa
atrair para si os apoios para a reeleição. É aqui que entra o movimento da
dialética, para mais ou para menos, ou seja, poderá tornar-se mais forte
durante ou muito mais fraco, durante o mandato.
Provavelmente quem está profundamente envolvido com o
processo político eleitoral, não verá outra solução para fazer política, sem
mirar os cargos nas estruturais governamentais. O equívoco não está em querer
tomar o governo e governar. Essa estratégia foi usada inclusive em meio aos
processos revolucionários vitoriosos, mas em aceitar o jogo das “forças
infernais” e acreditar que, pelo impedimento de certos grupos representantes do
capital serem eleitos, o mal será menor ou até mesmo controlado.
Dominados pelo feitiço e por esse “ópio eleitoral”, as vanguardas
institucionalizadas, enfrentam críticas de dois polos extremos que apostam no
retrocesso. A extrema-esquerda caracterizada pela insistência em priorizar as
tarefas futuras mas com plena desconsideração das tarefas do presente, impõe um
discurso radical e totalmente desadaptado da realidade, por isso atrai poucos
adeptos. Na outra ponta está a extrema-direita que desenvolve as tarefas do
presente pensando em manter atualizado o passado pela continuidade da dominação
econômica, do conservadorismo moral e cultural. No centro, esquerda e direita,
costumeiramente aliadas nas disputas eleitorais buscam realizar as tarefas do
presente para permanecerem no presente, fazendo o possível para não ferir os
interesses dominantes e assistir as massas mais pobres.
Considerando que esses governantes não se preocupam com o
enraizamento orgânico de sua força, sustentam-se apenas na opinião pública
favorável. Mas a opinião é como o sabor do café matinal: um simples descontrole
de um ingrediente muda tudo. Logo, a democracia representativa é favorável para
quem possui popularidade, por isso ela tenderá a ser cada vez mais populista. No
entanto, esses processos eleitorais são cada vez mais de alto risco, por serem
vigiados e contestados ferrenhamente pelas forças imperialistas, que como “força
infernal” atuará sempre imensa por meio de farsas e tragédias. Quando as forças
de direta ganharem a democracia será consolidada, quando perderem, contestarão
e forçarão os resultados a seu favor.
Na medida que as forças de “esquerda”, investem somente em
eleições, se desmobilizam e não há como, desorganizadamente, enfrentarem as
investidas e os protestos da extrema-direita. Falta, portanto, dar-se conta de
que, para além das três forças postas atualmente no cenário, é preciso
contemplar a quarta possibilidade de construção, que é a força revolucionária.
Esta deve caracterizar-se pela realização das tarefas do presente para alcançar
o objetivo futuro de superação do capitalismo no futuro. Metaforicamente podemos
imaginar que, se as três posições, de algum modo, enfeitiçadas, circulam esbravejando
na base da escada, as forças revolucionárias devem subir nela e seguir decididamente
para chegarem no topo.
Podemos concluir dizendo que, não basta combater os
feiticeiros do sistema de produção e da política que viciam as massas com o “opio
eleitoral”; é preciso dar um passo à frente no caminho da superação da
feitiçaria capitalista, a verdadeira religião da classe dominante e seus
aliados. Agarrar com força todas as tarefas do presente, com a franca decisão
de alcançar as condições para realizar as tarefas do futuro, é, provavelmente, a
decisão mais urgente a se tomar.
Ademar
Bogo