Karl Marx quando estudou o
capitalismo e decifrou às suas leis tendenciais ( produção, exploração,
concentração e expansão para fora, na forma de imperialismo econômico),
aproveitou o mesmo estudo para demonstrar como deveria ocorrer o processo da
transição socialista.
O socialismo, visto como um processo
de transição para o comunismo ganhou com os estudos de Marx definições e
conceituações científicas naquilo que diz respeito às suas leis de funcionamento
que, tanto para a manutenção, quanto para a superação do capitalismo deveriam
ser formuladas de acordo com as circunstâncias de cada local. Assim deveriam ser
tomadas as medidas políticas apropriadas, que nem sempre se identificavam com a
ciência, pois, dependiam dos problemas e da criatividade dos governos.
Apontou ainda Marx, que o
capitalismo, devido à anarquia na produção desmesurada, promovida pelos
capitalistas que têm em mente apenas o lucro e por isso querem produzir cada
vez mais, produz crises periódicas que
desestabilizam a ordem estabelecida e facilitam para que as forças exploradas
se recoloquem de tal maneira que possam, com suas ações, provocar avanços na
correlação de forças.
Conscientes de suas responsabilidades,
os trabalhadores e suas organizações de classe sabem que a transição socialista não é uma
inovação imediata e utópica de sociedade, mas a superação das contradições e
dos obstáculos que impedem o acontecimento das mudanças para frente, sejam elas
na organização, da economia, da política, da educação, da cultura e de outras
tantas áreas que necessitam de avanços para, de fato, os processos caminharem
para o melhoramento da sociedade e da vida humana.
De outra forma, enquanto avança o
processo da revolução que leva em frente a transição socialista, primeiramente, por
meio do longo período de lutas para garantir a permanência ou a conquista de
direitos sociais, a classe dominante ou setores dela, agem com a contrarrevolução,
geralmente implementando medidas impopulares para garantir que a taxa de lucro
dos capitalistas continue sendo garantida, por isso, implementam reformas que
reorganizam o processo de acumulação de capital de acordo com as circunstâncias
de cada época.
Na transição para o socialismo,
juntamente com as medidas políticas, o processo exige que sejam adequados
outros elementos como, a organização, a formação da consciência e a elaboração programática
das soluções que deverão ser construídas passo a passo.
Na manutenção da dominação capitalista
estávamos acostumados a interpretar os “planos econômicos” editados pelos
governantes que iniciavam os seus mandatos publicando medidas que visavam
acertar os rumos da exploração econômica e da dominação política, mas eis que
nos últimos cinco meses, o que estamos vendo é uma contínua edição de
“desmedidas” sem um programa claro de governo.
A tradição do “pão e circo” iniciada
no Império Romano em crise tem muita semelhança com o processo do governo do
Nero atual. Lá, o objetivo da distribuição de comida e diversão visava
desorganizar e alienar a população para que ela se mantivesse fiel à ordem. O
pão, na verdade, era a distribuição de cereais, mas, o circo, não era apenas
formado pelas exibições artísticas; também havia os espetáculos sangrentos onde
enfrentavam-se até a morte, gladiadores bem treinados; apresentações de animais
ferozes devorando os cristãos presos e outras formas de corridas e torturas de
animais.
No caso brasileiro, há pouco pão
para ser distribuir, por isso, até o que foi dado com a mão esquerda, ameaçam
tomar de volta com a mão direita e, ao invés de medidas, o governo toma
“desmedidas” desmanchando o que foi edificado, em décadas passadas. Senão
vejamos: no ano de 2003 o Congresso Nacional votou o Estatuto do Desarmamento e
o governo desenvolveu uma campanha para que a população entregasse as armas de
fogo. Agora, por falta de espetáculos sangrentos suficientes para distraírem a
população, o governo, coerente com a política de contenção de gastos, edita um
decreto que flexibiliza o porte de armas em quantidade espantosa, para que a
própria população se ocupe e crie os seus “eventos sangrentos” nas ruas e nos
campos.
Dentre outras decisões de
“desmedidas”, os cortes no sistema de ensino com a ameaça de não enviar
dinheiro para as universidades pagarem água, luz, limpeza e sustentarem às
pesquisas, a mais recente investida está se dando contra o Código de Trânsito
Brasileiro, contrariando também as orientações da Organização Mundial da Saúde
(OMS). Primeiro investiu contra a instalação de novos radares, depois, intenciona
amenizar a pontuação na carteira em caso de multas e a desobrigação de utilizar
a cadeirinha no banco traseiro do veículo fragilizando a segurança das
crianças; além do mais prorroga o prazo da renovação da habilitação de 5 para
10 anos. Ou seja, são “desmedidas” que se editam sem dinheiro e fortalecem o liberalismo e o egoísmo
individualista, por isso parece que fazem o bem.
Por outro lado, é importante prestar
atenção, que este Nero que incendeia as discussões com as suas intervenções,
nada tem de ingenuidade. A verdade é que, não tendo nada a oferecer de benefícios
que envolvam investimentos materiais, ele oferece benefícios espirituais
voltados para a subjetividade individual, principalmente para assegurar o apoio
de parte da classe média, setores evangélicos e seitas pentecostais que ainda
se encantam com a política circense dos matadouros onde são abatidos jovens pobres e negros..
No entanto, essas “desmedidas”
cheirando a fanfarronices, atraem as atenções e descarregam o peso das criticas
sobre a política do espetáculo, enquanto ganha tempo para acertar a
liberalização das privatizações do petróleo e aprova as reformas que as elites
dominantes exigem. Depois disso, ao contrário do que parece, poderemos ser
surpreendidos, não com o descarte do comando governamental, mas com o seu
fortalecimento, porque, sem pão e sem circo, somente a brutalidade pode conter
as revoltas e os descontentamentos populares. Nesse caso, apenas um presidente
com sangue nos olhos, pode cumprir essa missão. Por isso, vigiar e “urrar”
desde logo, para expor as dores que a suposta sensação de prazer egoísta
profetiza, é a melhor maneira de se defender.
Ademar
Bogo
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