O filósofo Hegel em 1821, um pouco mais de duas décadas
antes da realização das Revoluções Liberais na Europa, ofereceu para a burguesia
em ascensão, a teoria do Estado, com as diversas proposições, dentre elas
caracterizando o poder do soberano. “O poder do soberano contém em si mesmo
três momentos da totalidade, a universalidade da constituição e das leis, a
deliberação como relação do particular com o universal e o momento da decisão
última como autodeterminação à qual tudo o mais retorna e de onde toma o começo
da realidade...” (§275).
Antes de tudo, devemos compreender que a universalidade
do poder para Hegel, está na constituição e nas leis. Acima destas duas forças
não há outro poder. Evidentemente que essas leis deliberam segundo a vontade
dos indivíduos que as manuseiam fazendo com que as decisões finais saiam de
acordo com os interesses propostos a serem alcançados.
Sem muitas delongas, devemos entender que o Estado com o
conjunto das leis e a interrelação dos três poderes, não formam um conjunto neutro
e, nem tampouco se mantém estático como uma estrutura de instituições e
funcionários concursados. As pessoas, dentro da estrutura do Estado movimentam-se
orientadas pelos interesses externos e, fazem cumprir o essencial obrigatório,
mas, acima de tudo, reagem segundo as vontades que se formam a partir das
circunstâncias particulares.,
As representações da sociedade civil, se dão pelos
poderes executivo e legislativo. Essa representatividade, supostamente revela o
grau de democracia reinante em um país. No entanto, há setores sociais mais representados
do que outros e por isso dirigem o Estado ou pressionam os demais poderes para
que os seus interesses sejam garantidos.
Há uma estrutura estatal deliberadamente coercitiva, garantidora
da ordem, composta pelas forças de repressão, auxiliadas pelo ministério
público. Mas, a disparidade de forças
entre os poderes levou, já em 1823, antes mesmo da Proclamação da República no
Brasil, ao parlamento criar comissões de investigações independentes. Somente
em 1934, os constituintes incluíram naquela Constituição, a possibilidade da
criação de Comissões Parlamentares de Inquérito. As outras Constituições
seguintes, todas elas mantiveram essa decisão e, em 1988, as CPIs ganharam
destaque maior passando a ser equiparadas ao Poder Judiciário e policial. Ganharam,
portanto, o poder de investigar pessoas e instituições, quebrar sigilo bancário,
telefônico e fiscal; fazer diligências e se preciso for decretar a prisão de indivíduos.
Os
assuntos que levam a criar uma CPI, depende dos interesses e da correlação de
forças existentes em cada momento político. Geralmente, aparentemente elas
servem para fortalecer as disputas entre grupos rivais, mas, na verdade, elas
cumprem a função de elevar o grau de coerção do Estado e, em certos sentidos,
descaracterizar a justiça e estabelecer métodos de vingança.
Nas
últimas duas décadas, já se tornou parte da cultura política no Brasil que,
quando o poder executivo sofre alguma mudança, como a de revezar as forças partidárias
no poder, principalmente, quando tende mais para a esquerda, as forças
dominantes do capital, não tendo aquele instrumento para fazer a coerção, transformam
o legislativo numa força investigativa e punitiva dos desafetos.
Com
a pressão sobre o poder Executivo, quando governado por forças mais
democráticas, as forças retrogradas visam atacar as bases de apoio das autoridades
que governam, para enfraquecê-las, impedindo inclusive que atuem a favor do próprio
programa de governo.
Temos
no Brasil problemas agrários históricos, porque a questão agrária nunca foi
enfrentada para ser resolvida. Com essa indefinição e tendo uma legislação
incompleta para regular a posse da grande propriedade, os capitalistas transformaram
o capital agrário com teor destrutivo, em uma força capaz de oferecer commodities
para o mundo. Essas mercadorias especiais, negociadas nas bolsas de valores,
pressionam os governantes para, em nome do fortalecimento das exportações, principalmente
nos períodos de economia em crise, aceitarem os seus desmandos.
Por
outro lado, os movimentos camponeses que nas últimas décadas se dispuseram a
servir de base militante para as forças de esquerda, afetadas pelas estruturas
governamentais, lançaram-se, como última esperança, na defesa de candidaturas com
maior vigor do que os próprios partidos, esperando um retorno, com a aprovação de
leis e medidas favoráveis em favor da reforma agrária. Mas pouco foi e está
sendo feito para enfrentar a questão agrária no Brasil.
A
precaução das forças de direita de atacar imediatamente no início do atual
governo, tem por objetivo, impedir qualquer atitude positiva em favor dos Sem
Terra para isso utilizam o poder legislativo, dominado por setores
conservadores, para impedir qualquer iniciativa do governo em direção à
acumulação de forças dos movimentos que sirvam de apoio para a sustentação do
próprio política desse mesmo governo que, incapaz de fazer a correta leitura
das intensões inimigas, procura manter-se à margem, praticando as normas e as
restrições burocráticas.
A
classe dominante já provou que não tem aliados fora de sua classe. Os seus
representantes são de extração identitária aos interesses dos grupos ligados ao
grande capital. Nesse sentido, a ingenuidade política com sinais de covardia,
ao invés de incentivar a luta e os enfrentamentos nas ruas e territórios em
disputa, aconselham ao enquadramento político para cumprir obedientemente a
agenda imposta pela CPI, que usará o parlamento como palco para fazer
propaganda midiática e projetar alguns dos seus para ganharem evidência como
nome de oposição, contribuirá para o verdadeiro massacre e aniquilamento
político.
Os
velhos bordões, como esse de Bertold Brecht, de que, “quem luta pode perder, mas
quem não luta já perdeu”, ecoam por todos os lugares, basta que os ouvidos se abram para poder ouvi-los.
Sem luta, a história perde a sua força e os interesses dominantes acabam sendo
a referência das novas narrativas.
Ademar
Bogo
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