O filósofo Nietzsche ao trata da Genealogia da moral, nos
mostrou que “o homem olhou com mau olhado por muito tempo as suas inclinações
naturais e identificou-se com a “má consciência” (XXIV). Esse “mau olhado”
poderia ter origem na necessidade de defesa das forças da natureza e no combate
aos ataques dos animais e de ameaças climáticas. O ocorre que, no decorrer da
História, todas as energias de combate e imposições voltaram-se contra os semelhantes
humanos.
A má consciência não é de tudo má. Ela é a demonstração dialética
de que o errado é errado. O outro lado é o certo e, se nos envergonha o oposto,
fazer o contrário, deveria consistir o caminho do enfrentamento. Na medida em
que o mal não é combatido, nem com o mal e nem com o bem, mas com a justiça, é
preciso estabelecer primeiro o que é justo e depois buscar alcançá-lo com os
atos.
O defeito da “boa consciência” é que os seus portadores
aceitaram as pregações da ordem e passaram a desenvolver a crença na justiça
dos tribunais. O crime é universal, mas o julgamento é singular. Um tribunal,
de posse de uma lei, impõe o veredicto sobre a ofensa de cada ato; quando na
verdade, o ato é a expressão de um comportamento coletivo de uma força particular
formada com a “má consciência”
A má consciência em nosso tempo, transformou o dever de
servir em “poder de servir-se”. Joias e colares são pequenas expressões do luxo
que energiza a corrupção do poder público. “Vender-se” é para certos meios o
imperativo moral do agente que anseia prosperar sem o esforço do trabalho.
No entanto, tal qual o animal selvagem que não escava a
sua toca sem as unhas, o homem de má consciência não transitaria pelo mundo dos
desvios sem os instrumentos do roubo. A grande derrota da civilização liberal
foi entregar, o poder de decidir, entre fazer o certo e o errado ao indivíduo.
As religiões pregam o livre-arbítrio a ser aplicado por um indivíduo que não é
livre nem de si mesmo. A ética civilizatória não deveria ser uma questão de
escolha se faço ou se não faço. O certo não poderia ter subdivisões no comportamento,
um para o público e outro para o privado.
Ser
ético em qualquer circunstância é um dever não uma obrigação. Se fazemos por
obrigação, quando podemos enganar cometemos desvios. Não respeitamos a
sinalização no trânsito por causa da presença do guarda ou do castigo da multa
que deveremos pagar, mas, pelo dever do respeito à vida.
Mas
o dever também nos chama a combater a má consciência em todos os demais
aspectos de suas manifestações. Dos direitos sociais consta também o direito á
mobilização, à greve, à ocupação e, principalmente, de reunião e organização. Assim
como a força da luta não se cria individualmente, a consciência crítica não
acontece fora da coletividade. Na medida em que os indivíduos portadores da “má
consciência” se reúnem, porque desejam transformar em justo o que é injusto, o
outro lado não pode ficar se esquivando atrás de outros indivíduos que possam
atuar em sua defesa na institucionalidade.
A
consciência crítica é decorrente da luta de classes. Portanto, a classe é a
substância que sustenta a consciência. Paralisados diante um governo, e
amedrontados pelo perigo do fogo das armas como se elas representassem um
vulcão que tudo pode queimar, nada se
pode fazer. Quando os métodos não funcionam é porque as táticas foram
saturadas. É evidente que ninguém fará mudanças pulando para dentro de um vulcão,
mas contornando-o.
As
forças maldosas sempre usam as mesmas saídas. Quando perdem temporariamente parcela do poder institucional, agem violentamente
com a parte que lhes sobra. Ou seja, perdendo o poder executivo, atuam com o
legislativo com aprovação de leis, criação de CPIs e com parcelas do
judiciário. Na atualidade o crime organizado tornou-se um braço armado da política
e, setores evangélicos o braço religioso. Mas todos esses fragmentos não formarão
a hegemonia, se formos capazes de atrair, não para dentro dos governos, mas para
as lutas sociais, a maioria dos trabalhadores e as massas populares.
É
hora de mobilizar, realizar grandes acampamentos que permitam simbolizar a
força da consciência de combate aos redutos mal-intencionados. Renovar as
táticas é renovar o fôlego das ações. A má consciência não pode ter razão porque
ancora-se no direito à propriedade ou na representatividade alcançada pelo
voto.
Ao
contrário dos portadores da “má consciência” que prometem crueldades, nós prometemos
a nossa força e a nossa consciência. Mas não basta apenas prometê-las é preciso
colocá-las a serviço das mudanças.
Não
se pode esperar por algo que não virá. Tudo o que há de vir há também de ser
feito.
Ademar Bogo
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