O filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), em sua “Teodicéia”, preocupou-se em justificar, o por que se Deus é bom, existir o mal no mundo? Para ele havia três tipos de males: metafísico, físico e moral; todos eles causadores de desarmonia. O seu otimismo com a criação do mundo perfeito, por intermédio de um ser perfeito que, por ser o melhor, somente podia criar o melhor e, seja por sua natureza, seja pela sua bondade, Deus não poderia agir de outro modo. O pessimismo, no entanto, estava no mal. Este era visto como “acidente”, surgido e desenvolvido no percurso da vida humana. Se quisermos uma conclusão primeira dessa elaboração de Leibniz, é que, se Deus é um ser perfeito o homem é um ser “acidentado”.
No entanto, depois de motivadas as
tipificações do mal, obrigou-se o filósofo a explicá-los. O mal metafísico,
descreveu ele, estando na própria origem humana, constituída de sua necessária
finitude, afinal, algo a menos devia possuir da perfeição de seu criador,
porém, esta imperfeição tornou-se a condição para o surgimento de todos os
males. Podemos acrescentar nessa caracterização específica, o mal das ideias,
pensamentos, consciência ou, como diziam os filósofos mais antigos, “do
espírito”.
Decorrente do mal metafísico,
justificador da imperfeição espiritual do ser humano, há o “mal físico”, cujos
sintomas estão em todas as dores que, se por um lado revelam as fraquezas
humanas, por outro lado poderia ser visto como uma cobrança e também como
punição pela má direção dada à organização social. E, por fim, o “mal moral”
voltado prioritariamente para a imperfeição do comportamento, no que diz
respeito aos aspectos afetivos e passionais, formuladores das ações propulsoras
da perda da liberdade.
As proposições de Leibniz, mais do
que segui-las, nos fazem pensar sobre os freqüentes embates reais e imaginários,
do otimismo com o pessimismo da vida cotidiana. Ou seja, em certos aspectos nos
animamos e agarramos as oportunidades; já, em outros, sentimos um mal-estar e,
pelas tendências apontadas, ficamos desapontados ou no mínimo desesperançosos.
Há sem dúvida os males metafísicos
fortalecidos nas ideias negacionistas sem qualquer materialidade comprovável e
que, nos últimos tempos, reuniram em uma mesma elaboração, tudo o que ruim foi
pensado no passado. Dentre as ruindades mentais, estão o nazismo, o fascismo e
o integralismo, como expressões das concepções da civilização destrutiva.
Por outro lado, não se pode fechar
os olhos para o agravamento do males “físicos”. A proliferação das doenças,
epidemias e pandemias, ditam, praticamente, o ritmo do desenvolvimento
econômico, do comportamento político e das relações sociais. São dores que
atingem todas as espécies e males irreparáveis. A fome atinge os animais
selvagens e os homens que parecem sobrar sobre a terra e, a própria violência
vigora com tanta regularidade que, as estatísticas podem, com certeza, fazer as
suas previsões antecipadas.
Combina-se com os dois males já tipificados,
o “mal moral”. O comportamento humano moldado pelos avanços tecnológicos
transformou cada indivíduo numa máquina de eliminação de produtos. O desejo em
consumir, dita como cada um deve se posicionar para devorar a sua “próxima
vítima”. As relações se dão cada vez mais com os objetos e cada vez menos entre
os seres humanos. Aliás, a alienação acelera a coisificação e tudo se move com
esse entendimento, de que a realidade cotidiana constitui-se de coisas
fabricadas, carregadas, trocadas e destruídas por coisas vistas como sendo inteligentes.
E diante do caos, surgem os
“arautos”, anunciadores das perspectivas de sucesso. O progresso econômico é a
base de todas as anunciações e, ele virá pela mágica que o Estado capitalista
operará logo após a ocorrência do batismo nas águas do processo eleitoral. Mais
de uma dezena de candidatos à presidência da República já estão postos, um ano
antes do pleito. Apresentam-se como “coisas da política” para gerirem a “coisa
pública”. Mas a “coisa pública” é a realidade social tomada pelos males
metafísicos, físicos e morais, alimentados por esta potencial indústria de
fabricar desigualdades: o sistema capitalista
Sendo assim, os “inventores do mal”, não
negam existir as imperfeições, classificam-nas em: mal maior e mal menor. Com
esses dois parâmetros jogam com as inversões. Hoje por exemplo, o mal maior não
é o capitalismo, mas um “polipata” instalado no governo. Tirando-o tudo voltará
ao normal? Mas para quem? Por essa ilusão e confusão, temporária ou
definitivamente desaparecem os princípios, a coerência, as contradições de
classe, as forças armadas forjadoras de golpes, o imperialismo e tudo o mais.
O mal, quando personalizado ganha
uma simbologia que confunde a essência com a aparência e leva à alienação. Por
mais evidente que pareça o mal não se origina no indivíduo e, por isso, não
basta retirar o incômodo, como faziam as máfias no passado ou fazem hoje as
milícias e narcotraficantes, para abrirem espaços para o crime. O mal se
origina nas mediações injustas criadas na sociedade. Logo, o mal tem origem
coletiva. Somente com a eliminando das estruturas injustas, coletivizadoras o
mal, será possível superar as perversidades humanas.
É bom sermos otimistas, mas lutar
sempre com consciência de que a transformação social passa pela implosão das
estruturas abrigadoras dos causadores de todos os males.
Ademar Bogo
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