Baruch
Spinoza em seu livro “Ética”, defende que o universo, incluindo Deus é composto
por uma única substância. “Uma substância absolutamente infinita é
indivisível”.[1]
Por sua vez essa substância também considerada como natureza apresenta-se de
diferentes formas expressas em corpos e coisas e, cada uma dessas coisas,
compostas por seus elementos específicos, recebe atributos que são os seus componentes
físicos, instintos, inteligência e as expressões estéticas diferenciadas.
O
entendimento de que há uma unidade estreita entre tudo e no ecossistema a vida,
imanente nos seres movimenta e reproduz os corpos finitos, está o entendimento ético
da unidade das formas substanciais oriundas da mesma origem. Voltar a Spinoza
(1632-1677), hoje, não é apenas uma visitação a um tipo de filosofia nascente
do racionalismo, mas entender que a importância dada ao homem, enquanto um ser
superior, tem a sua existência comprometida se as demais espécies não o fizerem
acreditar que ele deve converter os interesses privados em princípios
solidários capazes de orientarem e darem à civilização uma direção correta.
Quando
atualizamos os conceitos vemos que as ideias aproximam os tempos pela sequência
dos atos e, apesar das inovações tecnológicas, permanecem totais unidades na
substância infinita do universo, presente em suas formas coordenadas pela
natureza finita, assim sendo a Res extensa (extensão de cada corpo), não
é um acidente, mas um direito a existir e a ocupar um lugar no espaço.
Nesses tempos
de decadência do capitalismo, as crises setoriais são expressões de um todo
comprometido pela deterioração das sustentações econômicas, políticas,
culturais, religiosas e ideológicas. Por outro lado, surgem as filosofias salvacionistas
de que o homem pode concertar e colocar todas as espécies em acordo, sem retirar
de funcionamento as suas invenções dominantes. A ética nos convida a
compreender que a natureza é o destino da natureza e não o homem ou a
tecnologia. O homem, conforme Thomas Hobbes é o “lobo do homem”. Deixar que a
natureza se recomponha é também uma forma de reconhecer o poder recriador da
substância.
Mas eis que
surge a excitação de plantar árvores em enormes quantidades; essas iniciativas
encaixam-se em duas categorias de análise: a primeira, diz respeito à tradição
do reconhecimento culposo iniciado no pecado original cristão. Considerando que
a diminuição do dano é a penitência, surge ela como o reconhecido castigo a
receber por termos tocado demasiadamente nas florestas, por isso agora o
trabalho de recompô-las. A segunda, está ligada a avareza mercantil, cujo
interesse financeiro, promete recompensar com “créditos de carbono”, quem
refizer ou preservar as florestas.
Temos
como certo que existe a expansão como uma lei tendencial do capital, e que, por
isso, ele vai a todos os lugares propícios para a sua reprodução; nesse
sentido, as catástrofes lhes são benéficas. A natureza tem força de se
regenerar por si mesma, basta deixar em paz os territórios onde as formas
corporais com seus atributos possam existir. A pressa de ver as árvores
crescidas para mercantilizar os “créditos de carbono”, coordenados pelos
Bancos, com o objetivo de “sequestrar carbono” pode se converter num grande
mal. A tentativa de retirar da atmosfera
os gases inadequados produzindo mais gases, significa, por um lado, o sequestro dos
territórios dos países pobres, com partes transformadas em santuários intocáveis,
simplesmente para que os ricos purguem as culpas, por terem poluído o planeta
e, por outro lado, com esses contratos, impõem o domínio sobre a soberania como
verdadeiros proprietários das florestas intactas, rodeadas de pobres que, pouco
o quase nada contribuíram para o atual
estado de crise ambiental; enquanto os países ricos continuam com as suas
matrizes produtivas poluidoras. Isso também ocorrerá com a implantação de
sistemas de energia limpa, eólica e solar, pois nos lugares instaladas essas
estruturas o domínio territorial é total.
Sem
uma postura crítica dos sujeitos sociais envolvidos nessas políticas rentistas,
as soluções encontradas pelos estudiosos para despoluir o planeta, são, apesar
da materialidade capitalista, metafísicas, ilusórias por estarem isoladas umas
das outras, sem nunca se preocuparem com as mudanças estruturais, nem com os
hábitos comportamentais no consumo de mercadorias, ou com o planejamento
produtivo. Há estudos reveladores que o gás metano (CH4) produzido pelos
animais ruminantes, é 21 vezes mais ofensivo do que o dióxido de carbono (CO2);
mas continuam incentivando e subsidiando o agronegócio para produzir e exportar
carne. Evidentemente as frotas de veículos motorizados são maiores que os
rebanhos, por isso ambas são prejudiciais ao planeta. Mas vejamos, se o contraponto
ecológico responde com esses dados comparativos. Um ruminante produz até 120kg
de gás metano por ano, enquanto que uma árvore, retém, em média 22 Kg do mesmo
gás, impedindo que ele vá para a atmosfera. Isto significa que antes de alguém pensar
em criar uma cabeça de gado deveria verificar, se no ambiente próximo há, pelo
menos, 6 árvores adultas preservadas, caso elas não existam, é preciso
plantá-las.
Quando
se pensa na pecuária brasileira, adorada por todos os governantes, sem exceção,
o processo em andamento é invertido, pois, primeiramente eliminam as florestas,
com ajuda de incêndios, venenos desfolhantes, para que, no lugar germinem as
pastagens. Portanto, os países ricos, além de poluírem o planeta com as suas
indústrias, também responsabilizam os países pobres para produzirem a carne que
eles consomem, contribuindo duplamente pelo agravamento da crise ambiental.
A
consciência ecológica não pode ser formada apenas voltada para as florestas, deve,
principalmente, integrar a organização da luta de classes, isto porque, há duas
forças imanentes a serem consideradas: a primeira é aquela vista por Spinoza demonstrando
haver na natureza a energia motora viva que a faz permanecer os movimentos
reprodutivo e, a segunda, indicada por Karl Marx, que, “O capitalista só possui
um valor perante a história e o direito histórico à existência enquanto
funciona personificando o capital”.[2]
Ou seja, temos a força da vida e a força do capital. A primeira está na
reprodução natural e na organização política dos pobres para garanti-la, a
segunda está no capital corporificada nos capitalistas ricos. Esta contradição
é irreconciliável. Uma das duas perderá para a outra vencer.
Nesse
sentido, podemos encontrar diferenças nas relações entre as espécies diversas e
o ser humano, em duas direções: a primeira é esta de que somente o homem pode
encarnar o capital e ajuda-lo a ir aos pontos adequado para a sua reprodução e,
a segunda, está na composição elementar das células. Quando comparamos os
elementos químicos das células humanas, encontramos, grosso modo, cinco
elementos: carbono, hidrogênio, nitrogênio, cálcio e fósforo; eles representam,
segundo a visão de Spinoza, os atributos dessa substância finita. Por outro
lado, os alimentos que contém ferro, potássio, cobre, zinco, selênio,
fundamentais para manter esta espécie viva, nenhum deles estão no corpo humano,
são atributos, contidos em diversos alimentos ou em apenas uma espécie que são
as larvas. Ou seja, se ingerimos ovos, carnes, frutas e farinhas é porque o
nosso organismo é pobre nessas imanências, as larvas são superiores ao
capitalista, que apenas pensa ser superior porque encarna o capital.
O
entendimento de que há uma “ecossubstância” a ser encarada, nos chama para
incluirmos a política nas causas ecológicas e, em primeiro lugar, estendermos o
conflito direcionando-o contra as mediações destrutivas que estão representadas,
pelo capital, o Estado, o mercado, a propriedade privada e as ideias
ideologizadas. Em segundo lugar, investir na formação da consciência social em
vista da transformação social e, em terceiro, enfrentar o desafio da educação
do povo para a formação de uma nova cultura.
Há
de se retomar a luta para a superação do capitalismo e, dentro disso incluir
todas as formas de lutas, ao mesmo tempo em que se intensifica a retomada do
associativismo, promotor do ressurgimento de coletividades; desse modo,
evoluiremos para a prática da moral revolucionária que emancipa as pessoas da
ignorância, do medo do juízo final e do comodismo alienado.
Ademar
Bogo
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