Lenin ao cumprir pena desde 1897 na Sibéria, aproveitou
para aprofundar os seus estudos. Naquele lugar isolado onde o frio chegava a 25º
negativos, apropriado para a deportação de presos políticos, apesar de ser minimamente
habitado, dificilmente alguém conseguiria sair por conta própria daquelas
muralhas de gelo, porém não impedia de que houvesse certa liberdade interna.
Tendo sido criado o Partido Operário Socialdemocrata da
Rússia (POSDR) em 1898, embora todo comitê central tivesse sido preso no
Congresso de fundação, Lenin, ausente e deportado, já havia assimilado a teoria da organização
política nos textos de Marx e Engels. Eles haviam escrito o Manifesto do
Partido Comunista e organizado já duas Associações Internacionais. Isso ajudou a
dar um salto para frente nas experiências já feitas pelas “Uniões de Luta”, movimentos
reivindicatórios e criar uma nova forma de organização.
Lenin após a execução de seu irmão em 1887, por ter cometido
o atentado contra o tzar Alexandre III, sem sucesso, convicto de que o caminho
a seguir precisava deixar para trás as formas terroristas e populistas de
organização e, por isso passou a denominar a iniciativa de 1898 de “Partido de
Novo Tipo”.
Esse partido não deveria pautar-se por ações espontâneas e
realizadas sem sustentação organizativa. O partido poderia ser constituído organicamente
e funcionar permanentemente como um todo organizado e disciplinado. Para tanto,
todos os seus membros precisavam respeitar e seguir o programa partidário.
Os anos de prisão e deportação de Lenin ofereceram tempo
suficiente para ele voltar a sua atenção para os estudos, principalmente sobre
o desenvolvimento do capitalismo na Rússia. Esse domínio esboçar o programa
partidário com a clara intenção de apontar o caminho para a conquista do poder
político.
O respeito a todos os esforços anteriores foi destacado e,
embora com todos os desvios e fraquezas, era a herança que os revolucionários
do passado haviam deixado. Porém isso não significava aceitar tudo, por isso,
uma série de textos elaborados por Lenin começou a circular. Um deles com o
nome de “A que herança renunciamos?”, atacava as ideias iluministas e reformistas, pois a teoria marxista apresentava-se
como referência para direcionar os pensamentos e as ações revolucionárias.
Ao final do cumprimento da pena na Sibéria, em 29 de
janeiro de 1900 Lenin, na manhã daquele dia, embarcou em um trenó puxado por
cavalos e partiu rumo a uma nova etapa de sua vida. Inicialmente vigiado pela
polícia e proibido de ir a Moscou, procurou estabelecer contatos com a firme decisão
de criar um jornal para divulgar as ideias e agregar, em torno dele, toda a militância
com o objetivo de realizar o segundo congresso do partido, o que veio a ocorrer
somente no ano de 1903. Após seis meses de perseguição, Lenin preferiu
exilar-se na Europa e passando de pais em país, de lá orientou a política de
organização.
Com a criação do jornal Iskra (Fagulha) em Leipisig em
1901 na Alemanha, por ser clandestino precisou ser impresso também no exterior.
Foi por meio dele que todas a discussões passaram a ser orientadas
principalmente em preparação ao “Segundo Congresso”, orientado pelos escritos
diversos, com destaque para dois textos importantes de Lenin: “Por onde
começar?” (1901) e “Que fazer?” (1902).
A preocupação com os passos certos a serem dados na
organização política levou a muitos embates e disputas, isto porque, não havia nenhuma
experiência vitoriosa e tudo precisa ser inventado. A luta contra as ideias
divisionistas e de influência burguesa era intensa. Por isso uma das tarefas
fundamentais do partido era a educação política e a formação da consciência revolucionária.
O desejo era criar um novo tipo de militante que se diferencia-se do indivíduo
burocrático, mas que se parecesse com “o tribuno popular”, ou seja, precisam
treinar a juventude para as discussões públicas, principalmente na capacidade
da eloquência dos discursos para realizarem as “revelações” das verdades
obscurecidas pelos interesses burgueses.
Os pseudônimos como, Lenin, Stalin, Trotski, passaram a
ser de uso necessário para todos os membros do partido poderem atuar
clandestinamente. Com isso, o partido não tinha “cara pública” a não ser a suas
ideias em circulação.
Antes da Realização do Segundo Congresso, iniciado em 17
de julho de 1903, em Bruxelas, e que, devido a perseguição da política belga,
tiveram que transferir as discussões para Londres, na Inglaterra, Lenin ainda
escreveu um texto “Aos pobres do campo”, tendo em vista a sua visão de que o
partido deveria jungir as classes operária e camponesa e arrastar atrás delas a
maioria da população.
Do Segundo Congresso participaram 43 delegados
representantes de 26 organizações. Lenin foi escolhido para ser um tipo de “secretário”
das comissões do Congresso, cujas anotações serviram para, posteriormente ele fazer
uma profunda análise das discussões e publicá-las como uma verdadeira crítica
documental no livro conhecido como “Um passo atrás, dois passos à frente”.
As disputas mais ferrenhas deram-se em torno da aprovação
dos estatutos e, ao contrário do que imaginou Lenin, o partido dividiu-se em
duas frações: Os bolcheviques (maioria) e os mencheviques (minoria). Ambas
permaneceram até o triunfo da revolução em 1917 com a supremacia dos primeiros.
Para além da História, interessa-nos mais aqui entender a
importância dada ao partido político como instrumento fundamental para a organização
e direção das lutas. Essa crença de que só poderia haver movimento
revolucionário com uma organização de vanguarda revolucionária, foi fundamental
para que o processo culminasse com a insurreição e a tomada do poder político,
vislumbrado desde o início.
O partido não pretendeu inibir nem concorrer com a organização
sindical. A clareza de que as tarefas eram diferenciadas, permitiu orientar a
militância para que as lutas reivindicatórias fossem realizadas abertamente e
os enfrentamentos políticos revolucionários, clandestinos. Nesse sentido, a luta
econômica não poderia dirigir ou pautar a política, desta, o partido político
deveria ser o dirigente se fosse constituído por militantes conscientes e
capazes de formularem métodos de ação diferenciados e eficientes.
A Revolução russa, com toda sua trajetória conflituosa,
mas vitoriosa em 1917, foi a primeira demonstração de que uma Revolução só é
possível se houver um comando fortemente organizado, com capacidade consciente de
dirigir, convencer e organizar a maioria da população para tomar o poder, caso
contrário, os processos se derrotam pelo próprio esgotamento.
A principal lição a extrairmos desse processo é que, na
luta revolucionária devemos pretender alcançar o máximo e não o mínimo, isto
porque, o máximo guarda dentro de si os objetivos inegociáveis. Para atingir o
mínimo, muitas vezes podemos ser maleáveis e tolerantes nas negociações com os
inimigos; para atingir o máximo é preciso ir às profundezas da coerência e não
vacilar diante dos perigos.
Ademar Bogo
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