Aristóteles foi o filósofo capaz de transformar a relação
entre justiça e injustiça em problema filosófico. Grosso modo, divide a justiça
em duas formas: distributiva e corretiva. Na primeira, o justo é proporcional e
o injusto é o que viola a proporção. Ou seja, o indivíduo que fica com uma
parte muito grande daquilo que é bom, tira dos outros a oportunidade de também
usufruírem do mesmo produto. Dessa forma, o filósofo, na Ética a Nicômaco afirma
que: “A outra espécie de justiça é a corretiva, que tanto surge nas transações
voluntárias como nas involuntárias”(LivroV. 4). O julgamento dessa forma de
justiça busca sempre o equilíbrio entre a perda e o ganho.
Em se tratando da sociedade capitalista, “saber perder
para o outro poder ganhar”, vai contra as leis fundamentais da acumulação da
riqueza ou de qualquer vantagem nas pequenas coisas. Assim vemos que, o grileiro
busca tornar em propriedade particular, as terras públicas e as reservas
indígenas; o capitalista sonega o imposto para gerar emprego e dos
trabalhadores contratados extrai ainda mais-valia; o governante tenta ludibriar
a fiscalização para ficar com as joias pertencentes ao patrimônio público; os
arruaceiros imbuídos do espírito destrutivo atacam os prédios públicos em busca
de darem um golpe de Estado e, no final reclamam dos julgamentos e das punições.
Não se trata de considerarmos que existem dois pesos e
duas medidas. Há a medida dos interesses que, em determinados momentos se
avolumam em uma direção e, em outro momento, devido a mudança na correlação de
forças, faz o pêndulo das punições demorar mais no polo oposto.
Se observamos com um pouco de atenção, compreenderemos
que, há dois anos pelo menos, o chicote da lei havia massacrado o bom senso e,
com a veemência dos atos jurídicos dado razão aos “fora da lei”. Por pouco não
tivemos um caos juridicamente sustentado pelo negacionismo.
É evidente que os interesses do poder econômico, coloca-se
sempre em primeiro plano e, contra este não há legislação que o enquadre. Porém,
no Brasil temos sofrido de uma doença conhecida como “parasitismo institucional”
que, quem está dentro da máquina do Estado tem maior proteção e garantias de
defesa. O círculo estreito do poder político, com poucas exceções, se ancora na
força das instituições e, por isso, o rigor das leis é amenizado.
Por
outro lado, o amedrontamento e ameaças das forças armadas paralisa os poderes e
acaba deixando que os laboratórios de golpes de Estado, sejam experimentos com
diversos requisitos. Todos sabemos que em 2016 tivemos um golpe tutorado pelas
forças armadas. Que ao ex-presidente Lula foi negado um Habeas Corpus pelo
Supremo Tribunal Federal, por um voto que o tirou das disputas eleitorais e
somente voltou a ter liberdade pela incomensurável e vergonhosa administração criminosa
dos adeptos do negacionismo.
O
poder militar, ora desmoralizado, permite ao poder judiciário levar à frente a
punição dos insurgentes ingênuos que acreditaram na possibilidade dos militares
se manterem no poder em 2023, por um simples equívoco do novo presidente eleito
que, diante do descontrole político, utilizaria o recurso da “Lei de garantia da ordem” (LGO)
para movimentar os tanques contra si mesmo.
Um verdadeiro fiasco político, mas que foi arquitetado
por pessoas influentes e que escapam das punições por falta de coragem de
passar a História a limpo. Os crimes cometidos contra os direitos humanos
escrachados na pandemia, os quais suscitaram a instalação de um CPI para apurar
e punir os culpados, serviu apenas como espetáculo para iludir as vítimas de
que a justiça seria feita. A corrupção galgou os mais altos escalões na compra
de vacinas e respiradores, mas a lei não alcançou ninguém.
Cada época é portadora de contradições próprias, mas é
importante alertar àqueles que confiam nas leis com sendo paredes de proteção
permanente e, por estarem no governo e gozarem da imunidade parlamentar, que o
tempo não passa. As forças ao se movimentarem fazem surgir novas contradições e
as leis continuam sendo o escudo dos grupos poderosos.
Ninguém quer estar “fora da lei”, mas é importante,
posicionar-se como Aristóteles, quando
defendeu que: “A justiça política é em parte natural e em parte legal”. A parte
natural é aquele que tem a mesma força em todos os lugares. Esta está enraizada
na organização social. Já se disse no passado que “a luta faz a lei”, mas não
basta somente fazê-la, é preciso continuar lutando para aplicá-la contra os
projetos inimigos.
Ademar
Bogo
Nenhum comentário:
Postar um comentário