Karl Marx quando tratou da
emancipação política e humana, quis mostrar que há uma significativa distância
entre as duas e, para além do mais, alertou que se cair na ilusão de, tendo a
primeira, imaginar-se vivendo na segunda, no entanto, a distância entre as duas
é mesma que separa o particular do universal.
Isto quer dizer que, se temos a
emancipação política, temos certas liberdades alcançadas, mas elas não correspondem
à autonomia de fato, porque quem nos delega os direitos também nos controla. Os
direitos reconhecidos, sempre são medidas que atendem alguns requisitos, mas
que podem ser revogados a qualquer momento. Já a emancipação humana encarna-se
na própria natureza do indivíduo colocando acima das mediações que na
emancipação política o submetem.
Podemos considerar a emancipação
política como um “relativo progresso”. Isso quer dizer que, se compararmos o
servo do tempo do feudalismo com o operário no capitalismo, este último conseguiu
alguns direitos que os trabalhadores nunca haviam tido na história da
humanidade. Mas isso é tudo o que queremos ter?
A liberdade de cada um vender a própria
força de trabalho foi uma grande inovação que trouxe o capitalismo, isto porque,
os trabalhadores passaram a vender aquilo que antes lhes era tirado a força e
pouco ou quase nada era lhes dado em troca.
Junto com a liberdade de escolher o
trabalho e poder vender a força física, vieram alguns outros direitos, como o
de votar, tirar férias e se aposentar. Mas, de duas coisas os burgueses não
abriram mão: o direito à propriedade dos meios de produção e ao controle do poder
do Estado. Com o direito à propriedade os patrões controlam a produção feita
por diversos trabalhadores e, com o poder do Estado eles garantem que aquilo
que fazem é justo, por isso, mesmo que seja por meio da coação, todos aceitam.
É nesse sentido que a emancipação
política ao invés de representar um grande avanço, reduz o indivíduo a membro
da sociedade burguesa e, mais ainda, a indivíduo egoísta, que se obriga a
cuidar de si, ao mesmo tempo em que fica cada vez mais dominado pelas leis e instituições.
Mas ocorre na explicação de Marx algo
ainda mais interessante quando ele compara o singular e o universal. Mostra que
essas categorias se assemelham às categorias de homem individual e de cidadão
abstrato. Isso nos diz que se hoje nos denominamos de cidadãos e não somos ou
somos apenas de forma abstrata, para sermos cidadãos de verdade precisaríamos
eliminar as mediações que nos impõe o controle, seja no emprego, na política,
já justiça ou na convivência social. Teríamos que ser indivíduos e sociedade,
como é a particularidade que compõe a totalidade sem ter ninguém intermediando.
Dessa forma chegaremos ao ponto de considerar um erro acreditar que o Estado e
a propriedade privada sejam as forças que universalizam a emancipação humana.
Ao contrário é com a permanência delas que jamais seremos emancipados
verdadeiramente.
Esse raciocínio é para explicar que
a singularidade e a universalidade funcionam a nível mundial, quando o “indivíduo”
é um Estado nacional e o universal é o capitalismo como modo de produção. Se
convertermos os dois elementos fundamentais dessa ordem, teremos, no aspecto
político, a dominação imperialista e no aspecto econômico, os capitais:
produtivo, especulativo com todas as formas parasitárias de acumulação.
Ao raciocinarmos sobre a relação
entre o singular e o universal, percebemos que lidamos com os limites da
emancipação, tanto no sentido singular quanto no sentido universal, ou seja,
enquanto indivíduos fomos sempre dominados por instituições e empresas e, enquanto
nação sempre fomos submetidos às imposições colonialistas e imperialistas.
Em momentos de crise, econômica e política,
principalmente, percebemos como os direitos que, aparentemente garantiam a
emancipação política, são retirados em uma rodada de votação e a soberania
nacional, tão exaltada pela História desde 1822, é destituída sem qualquer cerimônia;
o país, como um vagão de um trem é atrelado atrás de outros que são puxados e
direcionados pela mesma locomotiva.
A ilusões caem por terra, quando os
indivíduos reais sentem as consequências reais. Assim aprendem que a
valorização das mediações que servem para que a classe dominante domine os
explorados, devem ser substituídas quando se tem força política e não
fortalecidas. Se por muito tempo conseguimos os direitos políticos e sociais e
acreditamos que eram suficientes, nos esquecemos de que estes direitos não eram
definitivos e a qualquer momento os controladores da ordem poderiam querer
apagá-los do livro das leis.
Sendo assim, é bom que, de tempos em
tempos existam governos ruins, eles servem para alertar-nos que, as ruindades
burgueses são garantidas pelas mesmas estruturas que quase sempre admiramos e
queremos vê-las funcionando exemplarmente. Para mudar as condições
emancipatórias precisamos mudar o estado de coisas, caso contrário, o próximo
período apenas servirá para repor o que já tínhamos e perdemos.
Ademar Bogo
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