O filósofo alemão Wolfgang Fritz
Haug escreveu no século passado, o livro, “Critica estética da mercadoria” e
nos mostrou como os indivíduos na sociedade fascinam-se quando entram em
contato com as mercadorias. A qualidade torna-se um símbolo que atende e supre
às necessidades imediatas; por isso, a característica particular do artigo de
marca baseia-se na imagem que afirma o proprietário ou o monopólio.
Portanto, é de fundamental
importância observar que nos movemos cotidianamente por valores estéticos que,
no jogo comparativo entre o bonito e o feio, o atrativo e o repulsivo, o bom e
o ruim, o forte e o fraco etc., tendemos sempre a ficarmos com as referências
que entendemos como positivas. Quanto a isso pouco temos a dizer, pois,
entendemos que as escolhas fazem parte de nossa “privacidade democrática”. O
que não sabemos claramente é que, essas escolhas fazem parte do jogo
capitalista de legitimar as necessidades da classe dominante, ao mesmo tempo em
que legitimam também as necessidades dos dominados e, estética, vista aqui como
a viam os gregos, como “a arte de sentir”, participa como a força de
legitimação.
É nesse sentido que podemos falar de
“engano consciente” que impulsiona o indivíduo para o consumo porque gosta ou
se sente atraído pelo produto, mas, ilusoriamente engana-se o indivíduo ao
achando ser melhor aquilo que o satisfaz. A atração é aumentada por meio da
propaganda que ataca propositalmente o Id humano, responsável pelo princípio do
prazer, que fica ainda mais exacerbado quando toma conhecimento, por meio da
propaganda que há produtos em promoção.
A transmutação da estética do
mercado para a estética política acontece pela simples substituição dos
produtos oferecidos. As necessidades subjetivas precisam também serem
despertadas e supridas pela fascinação. A relação é tão íntima entre o mercado
e a política que não há como fazer uma boa campanha eleitoral sem oferecer
resultados ou valores de uso antecipados.
As semelhanças tornam-se ainda mais
evidentes quando tomamos como referência de análise a categoria da
“concorrência”. As propostas apresentadas pelos candidatos estão no mesmo nível
de fascínio, isto porque, elas não ameaçam, ao contrário, fortalecem a
esperança do consumo. Elas aproximam, por meio da fantasia, o eleitor da futura
aquisição: casa, eletrodomésticos, pacotes de viagens, acesso à escola etc.
Se isto é verdadeiro, com muita
facilidade compreendemos porque há oscilações e, muitas vezes, bruscas
inversões dos regimes democráticos para regimes totalitários e exemplo do que
vemos no Brasil quando houve o desprezo pelo novo-desenvolvimentismo pela
escolha do fascismo. Qual é o ponto crítico dessa inversão? Podemos atribuí-lo
sem medo de errar: ao fascínio do consumo que, ao seu redor gravitam outros
desejos.
A lógica para explicarmos esse
fenômeno reside no próprio movimento da consciência das massas que têm por base
os elementos da estética econômica. Na medida em que o sistema capitalista se
mantém intocável, as satisfações devem ser encontradas nele mesmo. Logo, não
havendo consciência critica é o fascínio do consumo prometido que impede de
percebermos os fundamentos estruturais da exploração e, o indivíduo atraído coloca-se
frente ao tempo espera como se estivesse diante da porta de um supermercado,
com produtos em promoção, no aguado do horário que as portas se abram.
Se a promoção pode deslocar as
pessoas de uma loja para outra, é sinal que elas não estão preocupadas com os
concorrentes, muito pelo contrário, querem que eles concorram, pois, quanto
mais concorrem, mais fascínios provocam. Por sua vez, a classe dominante, ao
perceber que despertou a ansiedade do consumo que prometem “uma vida melhor”,
aproveita para violentar as ideias contrárias que concorrem, mas, no fundam
alimentam as mesmas intenções.
As “forças de esquerda” deveriam já
ter se dado conta de que concorrem com as “forças de direita” dentro da ordem
liberal como se fosse um grande supermercado. Dentro dessa ordem, se não atuam
para conscientizar permanentemente a população, para que compreenda que, “uma
vida melhor” depende da superação do capitalismo, mesmo “sem querer”, como
fazem os capitalistas, ela cumpre o
papel de fascinar as massas para o aumento do consumo de mercadorias.
O intuito de governar para “melhorar
a vida do povo” estão nos programas de ambos os concorrentes e isto não tem
como não sê-lo. Ninguém se proporia a fazer uma campanha eleitoral propondo
piorar as condições sociais. Mas é preciso, pelo menos, compreender que os
mandatos são ameaçados pelo tempo e, em cada pleito renovam-se as ilusões com a
presença de novos fascinadores e fazem as massas inconscientes mudarem de lado,
de ideias e de cores.
Mais do que isto, é importante
perceber que as classes dominantes manejam essas variações de regime porque
comandam a base econômica e confiam na estrutura de poder do Estado
capitalista. Agem com maior vigor, quando a “seleção natural” é desequilibrada
e as crises põem em risco a estabilidade de seus negócios. Nesses momentos,
preparam os ataques, convencendo as mesmas massas que ontem festejaram outros
concorrentes. Se para isso for preciso, temporariamente, reeditar o
nazifascismo, basta apenas fascinar as massas com algumas ilusões de melhorias
futuras.
Podemos concluir que, as relações
materiais determinam as demais relações sociais, sendo assim, a política
liberal, como ocorre no mercado, alimenta-se da concorrência entre as forças
que se substituem ou se revezam no comando, obedecendo o princípio da “maioria
sobre a minoria”. Esse revezamento, dentro da ordem liberal, do ponto de vista
da democracia, raramente ofende a classe dominante porque ela está assegurada
pelas leis do próprio sistema econômico. Também não afeta os maus tratos
sofridos pelas grandes massas empobrecidas, porque, elas vivem historicamente
nas favelas, o totalitarismo policial, o abandono do estado e a repressão das
milícias armadas. Há de fato, um prejuízo para as classes médias em geral que,
de algum modo, sempre estiveram inseridas no mercado de consumo, possuem os
direitos que realizam os fascínios profissionais e são elas que efetuam as
disputas políticas.
No passado, os comunistas tratavam
os desvios de comportamento da classe operária que só via os ganhos econômicos,
como “economiscistas”, pois, as táticas levavam a se manterem presos à luta
sindical. Na medida em que eram convencidos a tomarem o poder sob a direção do
partido de quadros intelectualizados, tornavam-se conscientes e assumiam a
vanguarda do movimento revolucionário. Agora, vivemos tempos que, a classe
operária e a luta sindical sofreram enormes desintegrações e, os partidos
políticos de esquerda, dirigidos por indivíduos da classe média,
distanciaram-se das massas e, atraídos pelo poder institucional, tentam
influenciar as massas não conscientizadas, com promessas fascinantes,
utilizando-as, não como vanguarda, mas apenas como objeto de uso para concorrer
com as forças de direita e governarem a mesma ordem liberal capitalista.
Sem a presença da classe operária
com princípios e consciência revolucionária, os grandes contingentes de massas
populares estão reféns das classes médias intelectualizadas, atreladas aos
capitalistas. Essas massas cumprem o papel de serem atraídas pelas fascinações
mercadológicas de promessas de uma “vida melhor” que, ora pendem para a direita para
fortalecerem os objetivos liberais e nazifascistas; ora para a esquerda
partidarizada, para ajudarem a realizar os objetivos populistas e reformistas
para, em qualquer circunstâncias, fazer funcionar o sistema capitalista.
Para quem sonha com a superação do
capitalismo é preciso romper com essa tradição, política, moral e intelectual e
combater a fascinação e os facínoras do nazifascismo com a mobilização, a organização e a
formação política, de setores das classes e das massas populares, entregando a
elas a responsabilidade de serem sujeitos da própria História.
Ademar
Bogo
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