No estudo da Filosofia encontramos
relações muito estreitas entre consciência e emoção, principalmente porque a
segunda é uma forma de expressão da primeira. O filósofo Jean-Paulo Sartre, ao
tratar do tema chamou a atenção que, para compreendermos bem o processo
emocional a partir da consciência precisamos considerar o caráter duplo de
nosso corpo que, por um lado é um objeto no mundo e, por outro, carrega em si a
experiência vivida e guardada na consciência. Em síntese, podemos dizer que
tempos dois sistemas funcionando no mesmo esqueleto: o sistema físico e o
sistema psicológico.
Sendo que a consciência é a
experiência vivida no tempo passado, ela é um conjunto de registros feitos
durante a história de vida do corpo físico. Portanto, não significa que a consciência
individual guarda a totalidade dos fenômenos sociais porque, muitos deles
passaram somente pela consciência alheia, sem estabelecer nenhum contato com a
consciência particular e, muitos assuntos não são conhecidos por todos.
A maneira mais simples de
entendermos a consciência é por meio das formas. Elas podem ser simploriamente nominadas
como “consciência social”; “consciência política”; “consciência religiosa”;
“consciência emocional”, etc. É em cada forma de consciência, que são postos,
pela sensibilidade, “os objetos” que aquela forma de consciência passa a se
ocupar. Temos apenas um complicador que subdivide o mundo da consciência em
dois: o da racionalidade e o da emoção.
Quando lidamos com a racionalidade,
as formas de consciência são estabelecidas e “convocadas” a se fazerem presente,
cotidianamente, às vezes ordenadas e outras vezes, segue saltando de um assunto
para outro, de acordo como os pensamentos fluem. Ou seja, se precisamos fazer um
cálculo estatístico, pois, estamos estudando o aumento da violência, exigimos
que a forma dc consciência matemática entre em ação, logo em seguida, ela se
“retira” e o estudo continua com a ajuda das outras formas de consciência.
Com a forma emocional de consciência
e seus objetos não é a mesma coisa, porque ela é constituída basicamente por
crenças, religiosas e não religiosas. Nesse sentido, se na racionalidade
colocamos como objeto de estudo a violência, na consciência emocional, quase
sempre colocamos ou deixamos que coloquem objetos de outra natureza como, o
medo, a angústia, a ilusão, a paixão, a
crença etc., que atuam interferindo sobre a vontade e o comportamento
individual. A diferença entre o objeto racional e o objeto emocional presentes
em uma mesma consciência, é que, o primeiro pode ser abandonado ou deixado para
ser utilizado quando houver necessidade de uso, enquanto que, o segundo,
permanece e atua como uma perturbação incontrolável, isto porque, o “sujeito
emocionado” e o “objeto emocionante” estão jungidos entre si. Nesta
diferenciação conceitual podemos ainda acrescentar duas manifestações opostas
de conduta: a “conduta-refletida” e a “conduta-irrefletida”. Interessa-nos
compreender melhor a relação existente entre a consciência emocional e a
conduta-irrefletida, motivada pelo ódio, medo, presunção, recalque, vingança,
crença etc.
Tomemos como referência a conduta
social de uma facção neo-nazista. Aparentemente ela é movida por uma
consciência política, que tem como objeto de ocupação da racionalidade a defesa
dos interesses de uma classe, de um grupo ou de uma parte da sociedade. No
entanto, as ações que desenvolvem são expressões de pura irracionalidade.
Considerando a natureza das ações e
a conduta-irrefletida, percebemos que, aqueles indivíduos agem conduzidos pela
consciência emocional, fixada em alguns objetos que foram propositalmente
produzidos por sujeitos influenciadores, preocupados em formar uma unidade
corporativa para alcançar objetivos obscuros, fazendo com que a ação seja uma
expressão de uma quase alucinação.
A consciência emocional embasa-se na
confrontação entre os objetos das crenças: de aceitação e de rejeição. Os
objetos da aceitação, quando por trás há interesses escusos, para os portadores
dos desequilíbrios emocionais são constituídos como mistérios, com boa parte do
conteúdo revelado que se configura como “mito”, “símbolo” ou “agressão”. Por
outro lado, os objetos de rejeição, são escolhidos pelos mesmos ideólogos que
necessitam situar os alvos “ameaçadores”, às vezes abstratos como o escuro que
causa o medo. Podemos citar como exemplo de uso atual, “o comunismo”, “a
pedagogia de Paulo Freire” e “a família”; outras vezes mais concretos, como os
negros, os índios, as instituições, os meios de comunicação e as autoridades
políticas que, mesmo sendo de extrema direita, por serem desafetos, são
classificadas como “comunistas”.
Preocupados com esses objetos
fantasiosos que alimentam a consciência emocional, os membros das facções
desconhecem a realidade e não há elementos racionais que os possa convencer.
Talvez existam apenas duas maneiras de correções destas perturbações: a
primeira representada pela frustração e, a segunda, pela reação e imposição de
uma derrota.
Quando a correção se dá pela
frustração, ela tende a produzir um período de luto, cujo tempo leva o sujeito a
ocupar-se dos objetos do arrependimento como a vergonha e a rejeição da própria
crença. A volta à consciência racional, pode ser acompanhada de um posicionamento
cético de desprezo pela política e pelas mediações que conduzem a mesma. Quando
a correção é imposta por uma intervenção contrária que leva a uma derrota, os
objetos guardados na consciência emocional resguardam-se nos sentimentos de
vingança, de ódio e perseguição. Essa forma de conduta não desaparece e sempre
encontrará motivos para expressar-se por meio dos preconceitos alimentados no
senso comum.
Vivemos no Brasil um paradoxo entre
a exacerbação da consciência emocional, centrada no tripé do mito, dos símbolos
e da agressão e, no seu oposto, uma consciência racional dominada pela apatia.
A superação de ambos virá também pelo movimento das contradições opostas. Do
lado da consciência emocional, o rompimento virá pelo confronto entre
alucinação e deslealdade. Ou seja, na medida em que, no próprio corpo da facção
surgem desentendimentos, enfraquece-se o mito, abandonam-se os símbolos e a
agressão interna leva a ruína o poder estabelecido sobre as bases mentirosas.
Do outro lado, as contradições externas expressas pelas diferentes crises,
passarão a revelar os limites da facção que jamais teve interesse em
representar o todo.
O que virá depois? Ainda é uma
grande incerteza. As crises nem sempre terminam com a união das partes
divergentes, principalmente porque as tragédias sociais não são prejudiciais
para todos. Assemelham-se, muitas vezes com as tragédias patrimoniais. Quando
um bem incendiado com vítimas fatais, mas o primeiro está assegurado por uma
apólice de seguro, as perdas irreparáveis são as vidas.
A consciência racional enquanto não
colocar como objeto de referência o poder dos trabalhadores contra o capital, a
exploração e a comercialização da força de trabalho, sempre correrá o risco de ser sobreposta pela consciência
emocional, que aceitará os mitos, os símbolos e a agressão como objetos de
ocupação das ideias que impulsionam as práticas ignorantes.
O tempo é propício para refletir
sobre os comportamentos alucinados e céticos, por estarem em pólos opostos na
de inovador produzem. É preciso que o ceticismo se converta em consciência critica
e supere as ações alucinadas com reações conscientes.
Ademar Bogo
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