O filósofo Nietzsche, em seu livro,
“Assim falava Zaratustra”, descreve o “Diálogo com os reis” que se encontraram
nas montanhas um vindo da direita e ou outro da esquerda, mas que tinham “um
asno só” para montar.
Ao
encontrarem-se, o rei da direita provocou: “Estas coisas também se pensa lá
entre nós, mas não se dizem”. O da esquerda, após comentar sobre uma suposta
voz ouvida, concluiu: “A absoluta ausência da sociedade também prejudica os
bons costumes”. Replicou então o da direita, depois de uma breve análise: “Os bons
costumes! Entre nós tudo é falso e corrupto! Já ninguém sabe reverenciar...”. E,
o rei da esquerda sentenciou: “Volta a te afligir teu antigo mal”.
O diálogo entre os reis de origens
contrárias, perdidos nas montanhas desertas, com um único animal à disposição
para montarem, revela os segredos de nossa situação. Há décadas que o “burro
estatizado” passou a ser o meio de locomoção da esquerda e da direita. Ambas as
partes, sem a presença das forças sociais, falam dos bons costumes, mas,
deparam-se com a falsidade e a corrupção e, o que volta sempre a afligir é o
antigo mal, que só pode ser a prática institucionalizada.
Para as forças de direita, o poder
deveria ser ditatorial. Para as forças de esquerda reformistas, o poder deveria
ser um grande entendimento, uma cosntrução de consenso. Daí, para ambos, a cada
instante, “volta afligir o antigo mal”. Para a Direita é retroceder até o
nazismo; para a esquerda é ir mais longe e resgatar o contratualismo, aquele do
tempo do Renascimento, quando, de um lado colocava-se o Estado e do outro a
sociedade. Sendo assim, nazistas e “mesmistas” precisam disputar o governo, o
burro a ser montado, para governar por um período.
As disputas eleitorais supõem grandes
diferenças entre o “destrutivismo” e o “mesmismo”, mas, por trás, por cima e
por baixo está o capital ditando os passos e, nenhum do lados quererá
enquadrá-lo e controlá-lo. Agirão sempre como se não houvessem contradições,
crises e esgotamentos.
Ambos miram na geração de empregos,
suplemento vitaminado para robustecer a popularidade, “desconhecendo” que há o
retraimento das relações de produção provocado pelo avanço das forças
produtivas. Evitam concordar que as crises, cada vez mais intensas, não começam
na política, mas na economia. Elas reduzem cada vez mais o uso da força de
trabalho, por isso desempregam e rebaixam o poder de compra dos desempregados
gerando ainda mais desemprego com o subconsumo.
Por outro lado, o mercado aparece
como a força salvadora. Pensar em comprar e em vender, os olhos brilham. Tudo
tende a se tornar mercadoria, no campo e na cidade; nas florestas e nas
oficinas; nas hortas e no petróleo do fundo mar.
O capital é o senhor que dinamiza as
relações e por isso concede, orienta e administra a colocação das forças da
política quando é para servir-se delas. Por esse engano, faz acreditar que não
há um tempo corrente para a formação e a superação das contradições, mas sim,
um tempo para a preservação e outro para a devastação; um tempo para a abertura
e outro para o fechamento; um tempo para a tolerância e outro para a
discriminação; um tempo pra o respeito e outro para a homofobia etc., quando na verdade os processos sofrem apenas ajustes.
Devastam, protegem-se e discriminam o tempo inteiro.
Por ter abandonado a ideia da
transição para o socialismo, as forças de esquerda pensam em “continuação” na
estrada do capitalismo. Por isso, os enfrentamentos saíram do campo da grande
política e se deslocaram para o campo da legalidade. Os tribunais são os
antigos “comitês centrais” onde a causa final é domesticada. O legalismo
corroeu a rebeldia, por isso ingressamos na era do “mesmismo”. Termina-se uma
eleição e logo se quer saber quem será o candidato para disputar a outra. Para
muitos, as eleições deveriam ser anual, para tornarem as candidaturas
verdadeiras profissões.
O “mesmismo” é a repetição das
ideias, dos propósitos, das táticas e das finalidades reformistas. O nazismo, a
guerra e o intervencionismo etc., são táticas de uso do capital para amenizar
os desacertos e as crises.
A transição para o socialismo é um
processo diferente. Tudo se faz sem concessões no principal. É como uma viagem
que tem itinerário certo. Qualquer tática legalista ou não, deve servir para
seguir em direção à superação do capitalismo. Neste caso, o “burro” disputado
pelos reis, após a vitória não servirá para montar, mas para ser descartado.
Findar-se-á então a ilusão. Desse ponto em diante seguiremos a pé com as
multidões.
Ademar
Bogo
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