O filósofo Nietzsche disse uma vez
que, “o homem nu é um vergonhoso espetáculo” e, com suas alfinetadas criativas,
imaginou uma situação em que, se os mais alegres viventes, por meio de um toque
de mágica se vissem de repente desnudados, com certeza o bom humor sumiria de
uma só vez.
Para esse filósofo, sempre temos
boas razões para escondermos os nossos atos. Justificamos os mesmos com as ideias
do dever, do espírito critico da honorabilidade etc. Nesse sentido, sendo “o
homem um animal que venera”, a moral não surgiu para mascarar “a “perigosa
besta selvagem que está em nós”, pelo contrário, é justamente em nossa condição
de “animais domésticos” que oferecemos espetáculos vergonhosos e, por isso,
precisamos do disfarce moral. Portanto, não é o animal feroz que tem a
necessidade do disfarce moral, mas, o animal de rebanho, com a sua mediocridade
profunda, o medo e o aborrecimento que causa a si próprio.
Esse raciocínio filosófico é de
fácil conclusão. O animal selvagem anda nu porque nada tem a esconder; o homem,
por sua vez, anda vestido porque tem muito a esconder e, para justificar as
vergonhas prováveis que surgem pela prática de atos civilizados, a moral e
também as leis, aparecem como forças salvadoras dos mitos do poder doméstico,
escondendo as partes pudicas desnudadas em si, enquanto rasgam os restos das
roupas daqueles que não se envergonham dos atos praticados, mas que a moral
quer jogá-los na imoralidade e as leis no mundo da ilegalidade e da criminalidade.
Estava evidente no comportamento dos
“animais domésticos” que se colocaram como salvadores da moral nacional e dos
bons costumes nas escolas, na campanha eleitoral de 2018. Escondiam sob as
roupas, mais do que as partes pudicas. Bastaram umas poucas semanas de governo
para que o vento da vergonha levantasse as roupas e derrubasse das laranjeiras
uma quantidade razoável de laranjas completamente podres.
Está agora na evidência, para toda a população, que aquela euforia era o
ensaio de um grande espetáculo vergonhoso. Por isso, desde as crianças de berço
aos mais idosos, todos podemos sair às ruas para gritar que, “o rei está nu”. A
vergonha da corrupção, moralmente escondida, já estava entranhada na pele
daqueles que vinham para combatê-la, certamente pensavam que o fariam com as
armas do crime organizado. A vergonha do déficit de aprendizado, cobririam com
a perseguição aos educadores, aos reitores das universidades e com a transferência
da responsabilidade do Estado para as famílias que queiram fazer da própria
casa uma escola. A vergonha da violência e do crime organizado tentariam cobrir
com um pano carcomido oferecido pela senhora caridosa chamada “Taurus” e, a
vergonha da negação dos direitos humanos e o excesso de presos em cada cela nas
penitenciárias do Brasil, esconderiam transportando de avião, a cada 15 dias,
os chefes das quadrilhas de um Estado para outro.
Com tamanha nudez política, as
perspectivas não são boas. Para a militância séria e comprometida com os
direitos em seus diversos sentidos, a conjuntura atual é um bom material de
estudo sobre a teoria da organização e, fundamentalmente, serve para discutir o
porque da necessidade de se ter um partido político que concentre em si a
consciência da parte mais ativa e organizada da sociedade.
O que fizeram os arautos da moral
manipulada para esconder as vergonhas, foi desmantelar a ideia da organização
partidária e, em seu lugar colocaram “o mito”. Sabemos que um mito é uma criação
fantasiosa colocada como verdade no lugar que somente cabe uma resposta
mentirosa. Isso dura o tempo do surgimento do esclarecimento, quando este
chega, os mitos se dissolvem como bonecos de areia.
As forças de direita que na década
de 1980 acharam a solução para encerrar as ditaduras militares, cederam à saída
“democrática” com eleições controladas pelo poder judiciário. Sustentaram essa solução
até o momento em que perceberam que os seus próprios partidos políticos haviam
perdido o vigor das disputas e retomaram as ofensivas por meio de golpes
institucionais, com a garantia e a tutela das forças armadas que, nas sombras,
se não houvesse luz, governariam nas trevas.
As disputas e vitória eleitoral,
fundamentadas “na luz” das mentiras elevaram o grau de perseguição das forças
de esquerda que foram despidas em praça pública em nome da moral, não foi
conduzida por um partido político e, por isso, no momento de constituir o
governo, a grande maioria dos indivíduos que foram nomeados, não possuem
experiência, formação e disciplina partidária. O que se tentou fazer foi
colocar os quadros militares ocupando o lugar dos quadros políticos, tornando
as forças armadas o mais novo partido político, sem base social orgânica.
Este “fenômeno” político brasileiro,
na medida em que os ministros civis vão se desmoralizando, ou mais propriamente,
vão se desnudando por meio de um fato vergonhoso por semana, para os militares
sobrarão duas saídas para garantirem a governabilidade: ou se desfazem do
presidente que se tornou uma peça de risco na locomotiva do poder e se aliam à
população implementando um governo defensor de direitos sociais, ou se afastam
da população, abraçam e aprofundam a via do totalitarismo.
Do lado oposto, para as forças políticas
e sociais resta a saída de tornarem-se novos vendavais para despir os que estão
imoralmente vestidos e insistem em pregar os princípios que ofendem a ética e a
cultura brasileira chamando-nos de canibais e ladrões.
Ademar
Bogo
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