Durante a Idade Média, no tempo dos
reinados, os poderes executivo, legislativo e judiciário eram exercidos por um
só indivíduo. Assim continuou na Idade Moderna, com o absolutismo tendo algumas
exceções. Seguindo o Direito Natural, dizia-se que acima do rei, somente existia
Deus. Ninguém podia criticar ou desmentir o rei. Os equívocos cometidos eram
corrigidos com a revogação da lei.
Com a afirmação do Direito Positivo,
os poderes foram emancipados e os homens dispensaram o Direito Natural e a
presença de Deus. O preceito foi mudado e “acima dos homens, só há a lei”. Os
poderes repartiram-se em três partes: Legislativo, Executivo e Judiciário,
tendo eles uma relativa autonomia, porque, acima deles, por serem poderes
humanos também existe a lei.
As constituições capitalistas, após
a Revolução Francesa (feita sob os três princípios: liberdade, igualdade e
fraternidade), passaram a defender que, “Todos são iguais perante a lei...”.
Nenhuma delas diz, mas poderiam dizer: “menos os juízes”.
Os juízes fazem parte da espécie
humana, mas estão um pouco acima dos cidadãos comuns e acima também dos demais
poderes. O entendimento é que, se a lei está cima dos homens e são os juízes
que a interpretam, monarcas, príncipes e reis eles não são, deuses é que são,
porque são responsáveis pelo poder supremo.
Vejamos as razões para essa
classificação, comparando os três poderes, a iniciar pelo local de trabalho. O
presidente, o senador e o deputado atuam no Palácio ou no Congresso, lugar
próprio para humanos, o juiz não, o seu lugar é no Supremo Tribunal, lugar do
juízo final, função que só pertence a Deus. As vestes também são diferenciadas.
A cozinheira usa o avental, o professor o guarda-pó, o mecânico o macacão, por
serem vestes de humanos, todos podem usar; o juiz tem a toga como peça
reservada, é a túnica divina apropriada para quem toma decisões. Ele é o seu
patrão, por isso aumenta o próprio salário. Salário de deuses, mas, como vive
na terra precisa de auxilio moradia.
Mas ainda há uma deferência, que
está sob aquela competência: a hermenêutica. A palavra deriva do deus Hermes
que na Grécia Antiga tinha a responsabilidade de traduzir para os humanos as
decisões divinas. Havia essa necessidade porque a linguagem dos deuses era incompreensível
aos ouvidos mortais e Hermes fazia com que as mensagens fossem compreendidas e
depois cumpridas.
E assim, desde a formação do Estado
Moderno, fomos do céu ao inferno. O juiz ganhou a função de fazer a
interpretação da lei. Ou seja, ele decide de acordo com sua consciência,
interesses ou sentimento de justiça. Dessa maneira, mais que Hermes, o juiz age
como um árbitro aplicando os seus próprios critérios. A prova disso é que
frequentemente as decisões se dão por votações apertadas. Ora, se fosse para aplicar
o que a lei diz, não haveria disputa e as votações seriam cordiais e de
consenso, mas não são.
Mas, acima de tudo o juiz é um hermeneuta.
Descendente de Hermes que recebe as mensagens das constituições e as
simplifica, mas também as modifica segundo as suas considerações. Quando um juiz
erra o outro retifica e “por isso mesmo” fica.
Dizem
eles: “quem faz a lei é a política, mas depois de feita, os políticos a ela se
submetem”. No entanto, não importam as razões nem as interpretações dadas quando
as leis são elaboradas. Vale a interpretação no momento da aplicação. De fato,
os juízes dos Supremos Tribunais, são seres especiais, acima dos homens e das
leis. Quem poderá com eles?
Só o povo salva o povo. Ademar Bogo
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