O alemão Walter Benjamin em sua astúcia filosófica,
intuiu que, “O capitalismo deve ser visto como uma
religião, isto é, o capitalismo está essencialmente a serviço da resolução das
mesmas preocupações, aflições e inquietações a que outrora as assim chamadas
religiões quiseram oferecer resposta”.[1] As razões são diversas, mas, principalmente
porque o sistema está impregnado nas culturas, nas quais predominam o culto e a
louvação ao dinheiro, às práticas do sacrifício e a ideologia do falseamento
dos sonhos.
Visto pelo lado sensível e, portanto, estético, para o
capitalismo e para a religião, todo dia é dia de graça. Agradecer a Deus pela
vida e pelos ganhos. São os sentimentos do dever (obrigação e dívida) com o
outro que mantém as atenções pessoais
voltadas para as obrigações. Acima de Deus não há nenhum poder, abaixo dele
começa-se a fazer a classificação hierárquica e o dever da louvação ou da
bajulação, porque assim são educadas as gerações. Portanto, nos dizeres alienantes
não há como alcançar algo grandiosos no futuro sem apegar-se a Deus e ao dinheiro.
O primeiro, como é intocável e, por isso indivisível, pertence a todos, porém
quem o veste e o maquia são os mais poderosos; o segundo também está em todos
os lugares, mas, reproduz-se somente nas mãos dos mesmos poderosos.
Para inibir e aniquilar a consciência coletiva, em ambas
as estruturas, do capital e do Estado, embora tudo se origine e se sustente
socialmente, tanto no sagrado quanto no profano, vale o princípio do livre-arbítrio,
da livre escolha e da privacidade individual. Desde a salvação até os
investimentos econômicos, tudo tende para a concentração e a centralização do
poder individual. Os pecados e as culpas são expiados nas confissões, as dívidas
no pagamento dos juros.
Sendo assim, no capitalismo, com a ajuda da religião,
Deus assim como o dinheiro são postos acima de tudo, mas como disse o filósofo
Nietzsche, “Deus está morto” e, para nós o capital está vivo. Nessa condição,
não podendo agir sobre os seus matadores, Deus é uma ideologia falsificadora do
real a serviço da manutenção das crenças de que a riqueza concentrada é uma
benção e não trabalho humano concentrado.
Por outro lado, sabemos que o capitalismo precisa da
política, por isso organizou para si um Estado capaz de estruturar a sua
própria defesa. Na religião manipulada, o discurso político se confunde com o
discurso religioso e ambos convivem nos redutos sagrados tal qual o fazem nos
espaços profanos. O Estado que subsidia os investimentos capitalistas, é o
mesmo que subsidia as seitas religiosas, libera recursos para organizar falsos
sanatórios de recuperação de viciados etc.
Aqui chegamos ao ponto crítico. Embora não pareça, no
sistema capitalista apesar dos louvores à democracia, reina entre nós o
totalitarismo. Vivemos em sociedades ditatórias pelas imposições das leis
tendencias do capital; do poder da concentração da riqueza; do direito da
propriedade privada dos meios de produção; da ditadura do mercado e das pregações
religiosas oportunistas, vindas da mesma matriz ideológica proposta pelo imperialismo
imperante no mundo.
A sensação de que somos livres e que Deus nos ama, sustenta-se
na garantia da lei e da ordem com a ajuda da prática das normas morais, mas, a
garantia da sobrevivência advém do dinheiro. “Ir e vir”, é um movimento que pode ocorrer se
a pessoa tem recursos. Se for branco e rico, terá maior facilidade; se for
preto, indígena ou pobre, poderá fazer o mesmo percurso, mas passará por
revistas policiais em vários pontos do caminho. Para os privilegiados sem Deus
mas de posse do dinheiro, o direito de ir e vir é realizável; para os discriminados
e mesmo com um pouco dos dois, muitas pessoas somente vão, mas ficam no meio do
caminho da volta, caídos na rua.
Nas doutrinas aproximadas (religiosa e capitalista),
aprendemos que, para salvar a alma precisamos ir à Igreja nos dias sagrados,
encontrar-nos com Deus ou com os seus intercessores conhecidos somente pelo
nome e por algum milagre feito; para salvar a democracia devemos ir às urnas;
votar para escolher os representantes que se impõem pelas promessas. São elas
que unificam os participantes dos pleitos, independentemente a que lado
pertencem. Vivemos de tal modo que, como na “morte de Deus”, matamos o sujeito
da história, o cidadão e o lutador e a lutadora do povo, e nos convertemos em
crentes e eleitores. Somos amados e odiados pela simbologia da cor com que nos
vestimos.
Convertidos os fiéis ao sistema, tornam-se defensores de
ideias que desconhecem a origem e, se na religião, os aliados tendem a mandar
para o inferno os desafetos, na política, para demonizarem o comunismo, os
mandam para outros países que lutam para construírem a própria soberania. Nesses
atos a ideologia totalitária emanada pelo sistema, encarna na intimidade de
cada indivíduo tornando-o cada vez mais egoísta e alienado.
É evidente que o capitalismo constitui o sistema bem
montado, capaz de abrigar as diferentes culturas e, por isso também, os diferentes
cultos. Sendo assim, ele depende do Estado e das seitas religiosas, como também
das religiões oficiais quando o defendem integralmente e pregam contra a socialismo
e o comunismo. É preciso superar o capitalismo se quisermos construir uma
sociedade socialmente justa, igualitária e religiosamente solidária. Por isso,
a luta deve ir na direção da superação dessas três forças combinadas: o capital,
o Estado e as seitas religiosas.
De acordo com esse entendimento, não basta participar da
política, é preciso fazer política e, nesta incluir a formação da consciência crítica
das pessoas que saibam fazer comparações entre Fé revolucionária e ideologia burguesa;
o papel do dinheiro e a distribuição da riqueza; o poder do Estado capitalista
com a possibilidade de organização do poder popular e, a vigência das seitas
pela organização de associações religiosas voltadas para a fraternidade e o
bem comum entre as pessoas
O socialismo não será uma religião como é o capitalismo.
Nele a Fé terá fundamentos conscientes e o livre-arbítrio estará vinculado aos
direitos revolucionários. As ideologias falseadoras da verdade serão todas
substituídas pelo conhecimento consciente e, ninguém será condenado ao inferno,
porque, esse, como o capital e o Estado, deixará de existir.
Ademar
Bogo