Há
uma satisfação inquietante nas fileiras da esquerda, alimentada pela defesa da
Paz. É uma posição honrosa, pois, com a Paz se faz a economia crescer, gera-se
emprego, inclusive dá até para interferir com opiniões nas guerras dos outros
e, internamente, impor um entendimento equivocado de uma tese denominada de “revolução
passiva”, que seria a realização, como já foi chamada de “revolução sem
revolução”.
O filósofo Antônio Gramsci, na primeira metade do século
passado, levantou diversas possibilidades para interpretar e instituir o
conceito de “revolução passiva”, pelas experiências desenvolvidas desde o
Renascimento, passando pela “Revolução francesa”, e cristianizada pelo “gandhismo
e o tolstoísmo”, vistas essas, como concepções ingênuas.
Para Gramsci, antes de tudo era importante conceituar pela
ciência política, o que significava a “Revolução passiva” que, no seu
entendimento havia dois princípios a serem considerados: (1) nenhuma formação
social desaparece enquanto as forças produtivas que nela se desenvolveram ainda
encontram lugar para um novo movimento progressista (2) a sociedade não se coloca
problemas, sem que as condições necessárias para a sua solução tenham se
formado.
O entendimento simplificado de Gramsci, ateve-se à relação
da economia com a política, tendo a forte presença do Estado como força
propulsora na afirmação da modernização. Esse entendimento parcial dos intérpretes
reformadores do capitalismo que, satisfeitos encerram as leituras e se metem na
prática ordinária. Há diversos alertas, postos como sinais pelo filósofo nos
cadernos do cárcere (Vol. 1. 2004, p. 427), como este: “A concepção do Estado
segundo a função produtiva das classes sociais não pode ser aplicada mecanicamente...”.
Mais diante, dirá que, em uma situação de não desenvolvimento, há sinais de que
os representantes da economia não estão sendo capazes de responderem aos desafios
históricos, cabe essa tarefa de mudar a concepção de Estado, tomando-o como um
poder absoluto, à camada dos intelectuais. Em outro momento ligará Gramsci o conceito
de “Revolução passiva” com outro, aparentemente contraditório, denominado de “guerra
de posição”, em síntese, sendo a luta para assumir os postos de comando.
A teoria gramsciana é rica em exemplos, mas não cabem
aqui. O que foi destacado acima já nos é suficiente para fazermos a nossa
formação filosófica. O primeiro destaque nos leva a pensar sobre o elemento “passivo”,
se ele se apresenta também como “pacífico” ou não? Em segundo lugar, também devemos
aprofundar o entendimento da “incapacidade burguesa” e, o terceiro elemento em
destaque é a “Guerra de posição”.
De certo temos um mínimo de entendimento, que os
conceitos possuem conteúdos formados por ideias elaboradas. “Passivo” em
política não quer dizer tudo estar inativo, mas sim quando o Estado aparece
como força dinamizadora diante e acima de todas as forças. Esse entendimento dispõe
de um complemento que, não se trata do Estado em si como sujeito, mas o grupo
dos intelectuais e não a classe trabalhadora, que o assumem para imprimir o
ritmo do progresso. Isso somente é possível de ocorrer com certa autonomia,
onde a classe controladora da economia é incipiente e sem força política. Nisso
se alinha o segundo aspecto, de ser essa classe burguesa incapaz de sustentar o
poder. Diante de tais circunstâncias esse grupo intelectualizado, aliado das
forças progressistas, estabelece as diretrizes e passa a “guerrear” para conquistar
posições e mantê-las na linha progressiva.
No Brasil, há esse pano de fundo na política, que
sustenta as ilusões de poder alcançar a Paz desejada, bastando ganhar a eleição
presidencial. Chegando a este ponto, as forças intelectuais assumem o comando
do governo e passam a fazer arremedos de políticas públicas, sem garantir
posição sólida nenhuma. Como um castelo de areia, basta perder as eleições
futuras e tudo desanda.
É importante considerar que no Brasil as classes dominantes
sempre foram fortes. Há um agravante que, as forças extremistas até pouco tempo,
eram coadjuvantes, mas, passaram a disputar as posições centralizadas do poder
político. A economia, por sua vez, não é atrasada que os próprios capitalistas
não possam geri-la. O agronegócio, embora sobreviva de subsídios, não pertence
ao Estado; assim ocorre com outros setores da economia. Do ponto de vista político,
o grupo intelectualizado que governa, não se afirma com posições evoluídas,
pois, depende do Congresso Nacional, com o qual negocia interesses, sem
ultrapassar a linha da legalidade e do “pacifismo” colaboracionista. Não
controla o Banco Central e, se quer, consegue influenciar na formação da consciência
crítica das forças armadas.
Por outro lado, o Brasil é um país de imensa concentração
de massas populares pobres e, do ponto de vista político totalmente desorganizadas.
O governo se relaciona com ela através dos programas de assistência, executadas
pelos Bancos que individualizam o atendimento, esvaindo também qualquer
possibilidade de conscientização e mobilização social.
Podemos
ponderar, que não é função dos governantes organizar o povo, mas do partido político.
Este é um outro dilema contemporâneo das práticas políticas. Vejamos, quando é
período eleitoral, o partido faz convenção e aprova quem será o candidato.
Depois, o mesmo partido coordena a campanha e alcançam a vitória. Logo em
seguida entra em cena (para mantermos o conceito gramsciano), o “grupo
intelectual” e monta o governo, concedendo grande parte dos cargos aos aliados.
O partido não desaparece, porque o Estado o sustenta, por meio do “Fundo
partidário”, composto pelo dinheiro público e distribuído conforme o número de
votos alcançados.
Além
do mais, como ficou demonstrado nos últimos pleitos, a sociedade brasileira
está polarizada. Há dois movimentos surdos convivendo no mesmo organismo. O
poder político oficial tem oscilado entre o extremismo e o comodismo. Consideram-se
os avanços paliativos, sem fazer cócegas nas bases estruturais da exploração e
nem tampouco evolui-se para tornar-nos uma alternativa de poder
substancialmente diferenciado.
Diante
dos critérios gramscianos, não se enganem senhores que governam e dirigentes
partidários, vocês estão muito abaixo do que seria um processo da “revolução
passiva” e da revolução, verdadeiramente revolucionária, a quilômetros de
distância. Há que se pensar na organização partidária que não se deixe dominar
por um “grupo de intelectuais”, capazes de encontrarem saídas temporárias para
a economia, sem nunca se preocuparem em superar o capitalismo. Como
espontaneamente não se produzem respostas suficientes, a permanecer assim, cabe
preparar-se para suportar a volta das forças extremistas.
Ademar
Bogo
Nenhum comentário:
Postar um comentário