No estudo da filosofia contemporânea
nos acostumamos a compreender a leis e as categorias dialéticas polarizadas ou
mais propriamente colocadas lado a lado. Isso nos ajuda a verificar que fique
evidente o que é e o seu oposto, ou o que é e suas consequências. Essa maneira
de pensar superou de uma vez por todas a visão idealista e metafísica de
Aristóteles, que via as categorias individualizadas, colocadas como os degraus
de uma escada, para se chegar ao final da análise com o completo entendimento
da substância estudada.
O domínio do entendimento dialético,
no entanto, não impede que, na atualidade, ao verificarmos como funciona o real
concreto, utilizemos o método metafísico, como faziam e fazem os idealistas que
vêem as coisas isoladas umas das outras. Daí é que precisamos atentar para o
descuido de imaginar que existe uma causa para um efeito apenas,
Visto dessa maneira, compreendemos
até com certa profundidade os fenômenos sociais e políticos, no entanto, o
resultado é a apropriação de um pedaço daquilo que funciona como um inteiro em
que tudo está relacionado. Sendo assim, uma causa pode produzir muitos efeitos
benéficos ou maléficos.
Tomemos como efeitos maléficos a
causa do golpe político e jurídico praticado mansamente pelos poderes,
legislativo e judiciário brasileiro aprovando o impedimento da presidente da
república. É verdade que a causa do golpe teve outras causas, dentre elas a
ingenuidade das forças populares de acharem que o Estado e o governo que o
representa, desconhece as impressões digitais da classe dominante e o capital.
Seria o mesmo que o motorista do veículo do burguês, por dirigir uniformizado,
imaginasse, por um instante, que aquele carro blindado lhe pertencesse. O que
interessa são os efeitos múltiplos que o golpe proporciona.
Então, cada reforma é um efeito da
causa tão justificada para o mal. Comecemos observando a reforma da educação
para o ensino fundamental, que iniciou com o disfarce de “escola sem partido”,
que pretendia calar os professores de exporem as criticas contra os alienadores
das consciências. Enquanto fustigávamos o debate, eles mesmos se deram conta
que uma “escola sem partido”, dificulta o próprio trabalho das bocas
conservadoras, mais eficiente era atacar as disciplinas que permitem falar
criticamente: Filosofia, Sociologia, História e Geografia, tornando-as disciplinas
opcionais nas escolas públicas.
Essa forma do aluno escolher as
disciplinas, menos “aquelas”, quer reduzir o ensino médio a um ensino técnico
de baixa qualidade, para que os filhos do velho proletariado e das massas
populares saibam um pouco de português, matemática e inglês para serem úteis ao
mercado, preparando-se para serem vendidos como mercadorias.
Essa
reforma é um primeiro efeito da causa golpista, logo virão os efeitos da
reforma trabalhista, da previdência, da política, tributária etc., que se
somarão com as velhas utopias neoliberais de privatizar tudo aquilo que
interessa ao capital, seja uma estrada, um aeroporto, um porto, um poço de
petróleo, um objeto qualquer que tenha cheiro de pertença nacional.
São, no entanto, efeitos cheios de
defeitos, que na ansiedade de enfrentá-los, as forças populares se movem com
causas que não atacam o principal. “Fora Temer” e “Diretas já”, até podem
atrasar algumas medidas, mas não são causas para deter essa ofensiva, que
iniciou na década de 1990, parou por algum tempo e volta agora com muito mais
vigor. É preciso lutar, e enfrentar o touro “sem temer”, mas enraizar os pés na
causa da transição, que supera todos os efeitos do mal, e edifica os efeitos
bons. Só a causa socialista pode superar a decadência capitalista. Não adianta
fugir, uma causa traz muitos efeitos, mas ela sempre é causa de outra causa.
Ademar Bogo, filósofo, escritor e agricultor.
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