Em se tratando de prioridades está
evidente que o capital e o governo, sob o lema: “ordem e progresso”, estão
empenhados em navegar pela crise subtraindo os direitos sociais no campo e na
cidade. Sendo assim, os esforços prioritários concentram-se, na honradez do
pagamento da dívida pública; no favorecimento ao agronegócio e setores da
produção e circulação de mercadorias, bem como, na oferta das reservas naturais
para o capital imperialista. Para os trabalhadores oferecem “reformas”,
talhadas sobre dois eixos: a hegemonia parlamentar e judiciária e o
enfraquecimento das lutas sociais e políticas.
É compreensível que em tempos de
crise, enquanto os trabalhadores e suas organizações buscam desesperadamente
sustentar os avanços em termos de direitos adquiridos, os capitalistas
aproveitam para impor as suas ideias atrasadas, assegurarem os seus ganhos e
legitimarem as perdas das forças que resistem. Mas é importante compreender,
que todas as mudanças, para o bem ou para o mal, fazem parte dos processos
transitórios de negações e afirmações para os dois lados em conflito.
Os processos, por sua vez, são
constituídos de diferentes elementos edificados sobre as condições e as circunstâncias
históricas, dentre eles, figura a presença do conhecimento. Encontramos já no
Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels, escrito em 1848, uma
admoestação importante sobre a necessidade dos trabalhadores realizarem duas rupturas:
com as relações de propriedade e com as ideias atrasadas.
As duas rupturas necessárias, em nosso tempo,
estão relacionadas com a concentração da riqueza e os avanços da dominação
tecnológica com a ajuda da ideologia. O preceito continua válido, que a classe
dominante somente se mantém enquanto dominante, porque consegue revolucionar
constantemente os meios de produção e impor a sua ideologia para toda a
sociedade. Isto quer dizer que ela usa a ciência como parte das forças
produtivas. Diz Marx, no livro, O capital: “a ciência nada custa ao
capitalista, o que não impede de explorá-la. A ciência alheia é incorporada ao
capital do mesmo modo que o trabalho alheio”. Esta é a verdadeira dimensão
partidária que adquire o conhecimento e as escolas que o reproduzem nas mãos dos
capitalistas. O conhecimento alheio, pago com os fundos públicos, é incorporado
ao capital como qualquer outro esforço empregado pelos trabalhadores
qualificados para ocuparem diferentes funções no processo de produção do valor
de troca.
Por essa e outras razões, é importante
desqualificar a ideologia da “Escola sem partido”, demonstrando que, para a
classe dominante a escola sempre foi e será partidária, assim como o são, as
empresas, o poder judiciário, os meios de comunicação, as forças armadas, as
organizações não governamentais, etc. Para além disso, a presença da doutrina
partidária de direita está presente nas instituições de ensino, desde a
obrigação histórica do uso do livro didático no ensino fundamental; na
ingerência das empresas privadas nos cursos de graduação e pós-graduação e, na
ideologia da formação profissionalizante desumanizada.
A classe dominante, portanto, somente
pode assegurar a continuidade da dominação, se as suas ideias continuarem
alimentando a partidarização da formação das consciências. É neste amplo
espectro de artifícios que as forças de direita nem sempre querem, como ocorreu
nas mobilizações a favor do impedimento da presidente da República, e nem
sempre precisam, nem depende de um partido político apenas, como ocorreu na
votação do impedimento. Suas articulações ultrapassam as siglas partidárias,
mas falam a mesma língua. Sabem, no entanto, que “um partido” de ideias e de
organização, para os trabalhadores, é uma posição social de aglutinação perigosa
dos interesses que podem se transformar em ações.
Por isso, a direita entendeu que a
escola da luta de classes ensina, e nós, que experimentamos transformar a
sociedade pelas lutas reinvindicatórias e pela via institucional e não
conseguimos, decerto aprendemos que a história continua e que a via
revolucionária foi a única saída que restou. A ideologia da “Escola sem
partido” é uma primeira tentativa de conter a ruptura com as ideias dominantes.
É preciso atacá-la, com ideias e ações, fazendo com que, desta vez, a parte e as
particularidades, avancem e se tornem uma só totalidade.
Ademar Bogo. Filósofo e escritor. Autor do livro "A linguagem das mercadorias em Marx".